terça-feira, 20 de dezembro de 2016

VILLAS-BÔAS CORRÊA, O JORNALISTA QUE DESMASCAROU O REGIME DE 1964

VILLAS-BÔAS CORRÊA, O JORNALISTA QUE DESMASCAROU O REGIME DE 1964

Luiz Antônio Villas-Bôas Corrêa. Por esse nome quase alexandrino pouquíssimos talvez o relacionem às mais de seis décadas de cobertura altiva, nada servil, da bizarra cena política daquela que já foi, por duas vezes, a maior democracia do planeta – não por acaso, durante a vigência, plena e sem mutilações, das Constituições de 1946 e de 1988.

Sua estreia no Jornalismo se deu por pura necessidade, quase por acaso. Bacharel em Direito, funcionário público federal, casado e pai recente, Villas-Bôas Corrêa contou com a ajuda do sogro, jornalista aposentado, que o apresentou ao diretor do diário carioca A Noticia. Logo no primeiro dia, mal aprendera a datilografar (em seu tempo, estudante de Direito não usava máquina de escrever na prática jurídica, ainda que tivesse sido, como ele, destacado dirigente de seu centro acadêmico), foi para a rua, pois é onde a historia, a vida, acontece, e lá flagrou um ato de extorsão pra cima de um camelô: depois de tomar nota de detalhes do flagrante, levou a vítima a um alto funcionário, que acolheu a denuncia, e logo o caso ganhou as manchetes da capital federal, e ele o emprego de repórter político – tendo sido pioneiro na especialidade e o mais longevo de todos.

O Jornalista Villas-Bôas Corrêa, ao lado de Carlos Castello Branco e Carlos Chagas, desvelou com apurado tirocínio e rara elegância os intramuros palacianos para o(a)s ávido(a)s leitore(a)s das paginas políticas do Jornal do Brasil e de O Estado de S. Paulo, e a partir de 1976 da Istoé, enquanto Mino Carta esteve à frente daquela revista. Não por alguma troca de favores (até porque tanto Villas-Bôas quanto Mino nunca foram adeptos do toma-lá-dá-cá), mas como Pai reconhecido de Marcos Sá Correa, grande revelação da Veja sob a direção de Mino (1968 – 1976), esse que foi um dos maiores analistas políticos de todos os tempos sempre fez questão de respeitar o maior criador de meios jornalísticos inovadores que o Brasil conheceu.

Poucos, também, se recordam, mas foi Villas-Bôas, nas paginas da Istoé de Mino, que tornou pública a fraude acobertada por uma década pelo triunvirato que golpeou o marechal Arthur da Costa e Silva, de que o Ato Institucional nº 5 (o nefasto AI-5) não era de autoria do marechal: outro Luiz Antônio, da Gama e Silva, professor de Direito Constitucional e poderosíssimo ministro da Justiça da linha dura, valeu-se do discurso inflamado do Deputado Marcio Moreira Alves em setembro de 1968, e com a não autorização do plenário da Câmara Federal para processá-lo, na noite de 13 de dezembro de 1968, quando era proclamada a fase obscurantista e sanguinária do regime, o último marechal na presidência da República não passava de reles figurante, um verdadeiro refém do grupo que o guindou ao mais alto cargo, e que menos de um ano o destituiria, inconsciente, no mais acintoso ardil.

Pai denodado, Villas-Bôas decidiu encerrar abruptamente sua talentosa carreira depois que seu dileto filho e colega Marcos Sá Corrêa não conseguiu se restabelecer de um acidente doméstico que o fez interromper uma também brilhante carreira jornalística. Apesar da dor, Villas-Bôas escreveu com a peculiar elegância a mensagem de agradecimento (e despedida), publicada originalmente em 2011, que postamos / colamos como homenagem póstuma.

Num tempo em que mediocridades servis a interesses inconfessáveis se revezam nos grandes meios de conspiração (e não de comunicação), com a cínica finalidade de desinformar e justificar o injustificável, analistas e repórteres com o caráter e o talento de Villas-Bôas Corrêa fazem muita falta. Que ele, ao lado do também saudoso Carlos Castello Branco, inspire as novas gerações nessa incansável missão: de olho no poder, mas com a distância necessária para não servir a ele, nem se servir dele.


Ahmad Schabib Hany


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