quarta-feira, 26 de março de 2025

VIDAS PANTANEIRAS IMPORTAM

Vidas pantaneiras importam

No dia 31 de março se encerra o prazo de apresentação de projetos a serem financiados pelo PAC Saúde 2025, do Ministério da Saúde, e os usuários do SUS do Pantanal de Corumbá (indígenas, pescadores e moradores ribeirinhos) foram até a prefeitura reivindicar do gestor municipal a adesão para garantir assistência em saúde a toda a região pantaneira, considerada "vazio assistencial" desde a criação do SUS, em 1990.

Na manhã de 25 de março, data histórica em que se registra a promulgação da primeira constituição brasileira, em 1824, integrantes de duas comunidades indígenas Guató (da Aldeia Uberaba e da Barra de São Lourenço) foram até o Paço Municipal para levar a sua preocupação ao prefeito de Corumbá. Dois caciques, Negré Guató e Severo Ferreira, e a cacica honorária Dalva Ferreira lideraram a comitiva, de aproximadamente 20 pessoas, desde adolescentes até idosos, em sua maioria vindos do Pantanal.

Dona Dalva Ferreira, do alto de seus 82 anos, afirmou que o barco que realiza o projeto "Povo das Águas" há mais de 15 anos nunca chegou à Aldeia Uberaba para assistir sua comunidade, com mais de 60 famílias. O que foi corroborado pelo cacique Negré, da Barra de São Lourenço, que revelou que o projeto assiste sua comunidade de três em três meses, e não mensalmente -- isso quando o rio está navegável e não é ano eleitoral, pois é proibida pela Justiça Eleitoral a chegada desse tipo de ação social às comunidades no período pré-eleitoral.

Um morador Guató da Barra de São Lourenço que veio com esposa e filhos a Corumbá a fim de tratar da saúde dos seus revelou que o custo individual da viagem de lancha a Corumbá não fica por menos de 250 reais, inclusive crianças, a menos que o piloteiro queira fazer desconto para as crianças, valor próximo ao da passagem da empresa que monopoliza o transporte de passageiros entre Corumbá e a capital.

Como moram na área rural, eles ainda enfrentam a burocracia na rede assistencial do SUS: por não morar no perímetro urbano, muitas vezes são deixados para depois, seja nas UBS de suas famílias na cidade ou até no Centro de Especialidades Médicas (CEM), chegando a perder a consulta pretendida. Adianta ter o "Povo das Águas" quatro vezes ao ano, na melhor das hipóteses, quando o procedimento feito pelo médico que pega carona no barco não vale para o agendamento da rede SUS na cidade?

"INÍCIO DO DIÁLOGO"

Aglomerados no estacionamento do Paço Municipal no início da manhã, os participantes do ato 'Assina, Prefeito!' fizeram uma pequena manifestação até a chegada de emissário do prefeito, que, segundo sua assessoria, estava fora atendendo uma comitiva do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Não demorou muito e o Secretário de Governo e Projetos Estratégicos Marcos de Souza Martins, popular Marquinhos, recebeu cordialmente toda a comitiva. Ex-vereador de quatro mandatos, o ex-dirigente do PT tem uma trajetória de 40 anos de vida pública, só não conseguiu trazer um assessor da Secretaria Municipal de Saúde para ouvir, como ele ouviu, todas as demandas das comunidades Guató.

Em nome do Prefeito Gabriel Alves de Oliveira, o Secretário Marquinhos Martins disse com todas as letras que a atual gestão municipal, apesar do legado da administração anterior de inadimplência e falta de credibilidade junto às instituições financeiras e órgãos federais, fará de tudo para não perder essa oportunidade histórica, de prover as populações originárias e tradicionais de equipamentos e serviços do SUS. Afirmou que o prefeito, que é médico, irá ao encontro dos Guató, bem como da comissão de usuários do SUS que deu apoio à população legitimamente pantaneira para assegurar um direito líquido e certo.

O Movimento Efetiva SUS Pantanal, no ato  'Assina, Prefeito!', teve fundamental apoio do Sindicato Municipal dos Trabalhadores em Educação de Corumbá (SIMTED). Também participaram o Observatório da Cidadania Dom José Alves da Costa e o Pacto pela Cidadania, espaços públicos que tentam suprir o Fórum Permanente de Entidades Não Governamentais de Corumbá e Ladário Padre Ernesto Saksida (FORUMCORLAD), que em 2012 entrou em inatividade. Desde novembro entidades e espaços públicos não estatais vêm acompanhando as idas e vindas com que equipamentos e serviços do SUS têm sido tratados, como a Ambulancha do SAMU, a Unidade Básica de Saúde (UBS) Fluvial, o Hospital Universitário de Corumbá e o Centro de Farmacologia e Farmacognosia Fitoterápica do Pantanal.

Além do começo de um diálogo incipiente com o gestor municipal, aos "45 minutos do segundo tempo", foi mantido estreito contato com o Ministério Público Federal a fim de assegurar que essas benfeitorias não se percam. Muitas vidas já temos perdido neste Pantanalzão de meu Deus. Desde a instalação da capital de Mato Grosso do Sul, em 1979, o Pantanal só vem acumulando perdas inestimáveis. É hora de reverter essa falta de lógica: Pantanal não é "quase prioridade", nem "pedaço" -- chega de "pan", queremos plenitude! --, porque o Pantanal é inteiro e para todos (não para alguns, aos pedaços) e, como o SUS, é Patrimônio do Povo Brasileiro. Mais, é Patrimônio da Humanidade.

Até quando vamos continuar a perder vidas no Pantanal? Ou a Vida dos Guató e demais moradores ribeirinhos vale menos que a dos moradores da cidade? Isso está em qual lei? E o respeito à dignidade humana que a Constituição Federal de 1988 preconiza, como fica? Afinal, Vidas pantaneiras importam.

Ahmad Schabib Hany

quarta-feira, 19 de março de 2025

A VIDA TEM URGÊNCIA TAMBÉM NO PANTANAL


A vida tem urgência também no Pantanal

Por que a ambulancha do SAMU, a Unidade Básica de Saúde Fluvial, o Hospital Universitário Pantaneiro e o Centro Farmacológico de Fitoterapia da flora nativa são urgentes no Pantanal, onde a vida também tem urgência e importância.

O Papa Francisco, do alto de sua magnanimidade, nos chama à reflexão neste momento em que se recupera de delicado acometimento de saúde, quando Netanyahu volta a empreender impunemente projeto genocida de limpeza étnica -- vendido pela mídia corporativa como empreendimento futurístico -- em Gaza, os repaginados terroristas-mercenários do ISIS inundam de sangue a Síria, a cobiça dos mercadores ocidentais impõe no Congo mais um etnocídio criminoso e Zelensky & OTAN teimam protelar o cessar-fogo na Ucrânia para atender a interesses da indústria bélica sedenta de sangue, de guerras,  de dólares.

Nesse contexto de depreciação da Vida e sublimação da necropolítica, curiosamente temos sido inquiridos por Amigos que dizem não compreender por que a ambulancha do SAMU, a Unidade Básica de Saúde (UBS) Fluvial, o Hospital Universitário na Região do Pantanal Sul (que, além de Corumbá e Ladário, desde 2024 passou a incluir Miranda) e o Centro de Farmacologia e Farmacognosia Fitoterápico à base da flora nativa fazem a diferença entre a Vida e a morte, da sobrevivência das pessoas nesse Pantanalzão de meu Deus.

Em 247 anos de fundação de Corumbá, a população ribeirinha e indígena nunca foi contemplada pelo SUS, que chega aos 35 anos sem ter atendido, em sua rede de serviços, a um só morador ribeirinho ou indígena do maior município do Pantanal, superior em extensão territorial a muitos estados brasileiros e países pelo mundo. Será preciso desenhar? A vida dessas milhares de pessoas humildes, laboriosas e detentoras das culturas identitárias do Pantanal vale menos?

É comum vermos cidadãos no perímetro urbano de Corumbá a reclamar, com todo direito, pela demora, de minutos, do SAMU no atendimento de urgência/emergência. Porém, no Pantanal moradores têm que se sujeitar a uma espera sem tempo previsível, porque não há ambulancha do SAMU (apesar de que, entre 2011 e 2014, o Conselho Municipal de Saúde de Corumbá e o Conselho Estadual de Saúde de MS aprovaram tais iniciativas, mas no período do golpe, isto é, entre 2016 e 2022, com o desmonte do SUS esses projetos acabaram engavetados). Atendimentos realizados pelo "Povo das Águas", da prefeitura, e pelo "Projeto Navio", da Marinha, que fazem um importante serviço de utilidade pública, são suplementares, pois não realizados dentro dos moldes do SUS.

Ao contrário do que se tem falado inadvertidamente, o governo federal, por meio do PAC Saúde, está disponibilizando recursos a fundo perdido, sem qualquer contrapartida para o município, e a submissão de projetos como esse conjunto de serviços do SUS tem chances de admissão imediata. Assim como Corumbá conta hoje com 28 médicos pagos diretamente pelo Ministério da Saúde, dessa mesma forma, se a atual gestão municipal tiver sensibilidade política, entrará para a história como a administração municipal que teve o mérito de zerar o "vazio assistencial" do SUS no Pantanal. Trata-se de uma opção inteligente, se assim proceder. Tem até dia 31 de março para entregar o projeto.

Como assim? É o que o projeto "Povo das Águas", idealizado pela querida e saudosa Heloísa Urt e realizado pelo saudoso Ruiter Cunha de Oliveira em seu primeiro mandato, não é serviço do SUS (Sistema Único de Saúde), como também não é do SUAS (Sistema Único de Assistência Social) e muito menos do SGD (Sistema de Garantia de Direitos). Serviços desses sistemas são executados com recursos financeiros "fundo-a-fundo", seguindo o devido protocolo e sob controle social preconizado pela Constituição Federal de 1988. Da mesma forma que o "Projeto Navio" não segue o protocolo SUS, embora o Ministério da Saúde faça repasse de verbas para custeio, mas de modo suplementar.

Por isso um conjunto de espaços públicos não governamentais, movimento sindical e popular iniciou mobilização para solicitar dos três entes federativos a inclusão desses equipamentos / serviços do SUS no Pantanal de Corumbá, e que deverá beneficiar também Ladário e Miranda, pois suas populações também integram a Região Pantanal Sul, com mais de 180 mil habitantes, além dos bolivianos de Puerto Quijarro e Puerto Suárez, consideradas por lei federal Cidades-Gêmeas há mais de uma década.

Aliás, não sabemos por que nossa região não esteve representada na apresentação, no encontro com gestores municipais no Palácio do Planalto, de PAC para cidades gêmeas, isto é, fronteiriças, quando foram detalhados os critérios para transformar problemas em soluções. E deixar a velha cantilena "apesar de Corumbá/Ladário fazer fronteira com a Bolívia..." -- basta fazer com que as equipes técnicas das municipalidades se capacitem para a elaboração desses projetos e saibam fazer a execução e prestação de contas dos referidos projetos, pois a otimização do dinheiro público é uma obrigação, não um favor do agente público em todas as instâncias.

A campanha de coleta de assinaturas continua na plataforma Google Docs, bem segura, pelo link <https://forms.gle/vNeiaxWXMbbXte5r5>. Assine e peça para que familiares e amigos também o façam. Lembre-se que as populações ribeirinhas e indígenas também têm o direito de serem assistidos pelo SUS. A Vida, nosso bem maior, agradece.

Para concluir, o Papa Francisco fez sábia chamada de consciência a toda a humanidade enquanto se recupera da pneumonia que fragilizou sua saúde nas últimas semanas e sensibilizou em todo o mundo diversas comunidades religiosas e laicas em intensas correntes de preces, como sincera manifestação de apreço pelo Santo Padre. Vida longa e muita ao Papa Francisco. Ele, consciente e ciente da delicadeza deste momento em que, além da população católica, há entre religiosos, como muçulmanos, fazendo jejum pelo mundo no sagrado mês do Ramadan. As populações da Palestina, Síria e norte da África, de maioria islâmica -- também com expressiva população cristã (católica e evangélica) --, voltaram a ser martirizadas pelos genocidas, impunes e indiferentes à fé dos que celebram com seu recolhimento sua devoção. Francisco fez, mais uma vez, um importante contraponto à lógica neofundamentalista que rege a ideologia do sionismo de Netanyahu e do histrionismo de Trump, dois discípulos de Nero a jogar o mundo às chamas da cobiça, opressão e medo.

Ahmad Schabib Hany

Fonte da Imagem e citação do Papa Francisco: Vatican TV em português

sábado, 15 de março de 2025

100 ANOS DO SAUDOSO SENHOR HAMAD HAYMOUR

sexta-feira, 14 de março de 2025

CPAN/UFMS realiza Simpósio de Gestão Urbana sobre futuro das cidades e as mudanças climáticas

CPAN/UFMS realiza Simpósio de Gestão Urbana sobre futuro das cidades e as mudanças climáticas

Evento científico sediado em Corumbá debate em abril futuro das cidades ante as mudanças climáticas, com atividades presenciais no Campus do Pantanal e também online. As inscrições e submissões de trabalhos já estão abertas para estudantes, gestores públicos e pesquisadores.

De 8 a 10 de abril, Corumbá sedia, no CPAN/UFMS, o I Simpósio Regional de Gestão Urbana, com tema “Debatendo o futuro das cidades em face das mudanças climáticas”. A participação poderá ser presencial (manhã e noite) ou online, com emissão de certificado, e por meio do link é possível obter mais informações sobre a programação <https://encurtador.com.br/BOkMr>.

Sob a organização do Professor Doutor Fabiano Quadros Rückert, o simpósio está dirigido para estudantes, gestores públicos e pesquisadores de diferentes áreas. Interessados em apresentar trabalhos ou participar das atividades constantes da programação podem contatá-lo pelo email <fabianoqr@yahoo.com.br> ou pelo telefone (67) 998472102 para informações adicionais. As inscrições já podem ser feitas mediante os contatos e, se for o caso, submeter seu trabalho, dentro da temática e dos critérios acadêmicos.

O evento visa fomentar a reflexão sobre a importância da inclusão das mudanças climáticas na agenda política e debater práticas de gestão urbana comprometidas com o desenvolvimento sustentável. O público -- estudantes, gestores públicos e pesquisadores das diferentes áreas -- terá oportunidade de debater sobre o papel das cidades no monitoramento e enfrentamento dos problemas ambientais.

As atividades presenciais acontecerão nas Unidades 1 e 2 da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campus do Pantanal. Serão realizados três tipos de atividades presenciais: oficinas e fóruns de debate no período diurno e mesas temáticas no turno da noite. Além das atividades presenciais, ocorrerão mesas em ambientes virtuais, abordando temas relacionados à Gestão Urbana e às mudanças climáticas.

Para o Professor Fabiano Rückert, “o evento é relevante porque os problemas socioambientais e as mudanças climáticas demandam uma abordagem interdisciplinar e exigem respostas do poder público e da sociedade”.

Conheça a programação completa e garanta já sua inscrição. Esteja preparado para se conectar com pessoas e expandir discussões que serão fundamentais para o futuro das nossas cidades.

O I Simpósio Regional de Gestão Urbana tem apoio da Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul (FUNDECT); da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), e da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). A realização do evento é uma oportunidade para todos os que se preocupam com o impacto das mudanças climáticas nas cidades e desejam contribuir para o desenvolvimento de práticas urbanas mais sustentáveis.

quinta-feira, 13 de março de 2025

Usuários do SUS se mobilizam para efetivar assistência em saúde no Pantanal



Usuários do SUS se mobilizam para efetivar assistência em saúde no Pantanal

Ambulancha do SAMU, Unidade Básica Fluvial, HU Pantaneiro e Centro Farmacológico Fitoterápico do Pantanal são os equipamentos solicitados em abaixo-assinado dirigido ao Ministro Alexandre Padilha e seus colegas de MS e Corumbá. 

Diversos segmentos sociais de Corumbá e Ladário, entre eles Observatório da Cidadania Dom José Alves da Costa, Pacto Pela Cidadania, entidades comunitárias e movimento sindical local, ante a demora de resposta dos gestores estadual e municipal, deram inicio a uma mobilização mediante  abaixo-assinado e visita a autoridades locais, estaduais e federais para a efetivação do projeto de instalação de equipamentos do SUS (Sistema Único de Saúde) no vasto território pantaneiro de Corumbá.

Por causa da brevidade de tempo para o envio de projeto pelos novos gestores locais de Saúde (cujo prazo é 31 de março para apresentação de projetos pelos gestores locais), os usuários do SUS contatara, autoridades federais para efetivar e até aprimorar antigo projeto de implantação de equipamentos do SUS para garantir assistência em saúde às populações ribeirinhas e indígenas em toda a área do Pantanal em Corumbá e Ladário, que desde 2024 passaram a contar com Miranda na Região Pantanal Sul de MS.

Ambulancha do SAMU, Unidade Básica de Saúde Fluvial, Hospital Universitário para a região do Pantanal e Centro de Farmacologia, Farmacognosia e Fitoterapia com base na flora nativa pantaneira são os equipamentos do SUS, a serem financiados em 100% pelo Ministério da Saúde, inclusive o custeio (pessoal, material permanente e de consumo). Entre 2011 e 2014, os gestores municipal e estadual já haviam iniciado tratativas, tanto que os conselhos municipal de Saúde de Corumbá e estadual de Saúde de Mato Grosso do Sul já haviam aprovado um projeto que previa ambulancha para garantir assistência em saúde, no contexto do SUS, à população ribeirinha e indigena no Pantanal.

A mobilização está sendo feita por cidadãos que integram espaços públicos, entidades sindicais e comunitárias e movimentos sociais e estão previstos postos de coleta de assinatura nas feiras livres, escolas, universidades e praças centrais e de bairros. Como hoje é fácil o acesso a plataforma de petições coletivas, a mobilização disponibilizou o link <https://forms.gle/vNeiaxWXMbbXte5r5> para fazer a assinatura online, com total segurança (trata-se de plataforma de documentos do Google).

TEOR DO ABAIXO ASSINADO

Excelentíssimos Senhores: Ministro da Saúde, Doutor Alexandre Padilha; Secretário de Estado de Saúde de Mato Grosso do Sul, Doutor Maurício Simões; Secretário Municipal de Saúde, Doutor Antônio Juliano de Barros.

NÓS, USUÁRIOS DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS), considerando os seus princípios fundamentais da equidade, da universalidade e da integralidade, nos dirigimos às Vossas Excelências para solicitar-lhes a urgente implantação, no Pantanal do Município de Corumbá/MS, (1) de uma Unidade Básica de Saúde (UBS) Fluvial; (2) de uma Ambulancha do SAMU; (3) de um Centro de Farmacologia, Farmacognosia e Fitoterapia com base na flora nativa do Pantanal, e (4) de  um Hospital Universitário para a Região do Pantanal para atender à população de mais de 150 mil habitantes dos municípios de Corumbá, Ladário e Miranda, integrantes da Região Pantanal do SUS em Mato Grosso do Sul, em uma área de 70.257,68 Km2 (uma área 3,2 vezes maior que o estado de Sergipe) além de também atender à população boliviana dos municípios contíguos à fronteira (Puerto Quijarro e Puerto Suárez), aproximadamente 30 mil habitantes, que acodem aos serviços de saúde instalados em Corumbá/MS.

Desde antes de 2012 a população pantaneira está à espera desses importantes programas e serviços, mas, por razões desconhecidas, nunca foram efetivados, razão pela qual entendemos ser esta reivindicação popular e cidadã necessária, pois não há como aguardarmos há tanto tempo por um serviço/programa já discutido e aprovado pelo Conselho Municipal de Saúde de Corumbá, com interface no Conselho Estadual de Saúde de Mato Grosso do Sul.

Já foram realizadas duas licitações para construção da Unidade Básica de Saúde Fluvial, com publicações no Diário Oficial do Mato Grosso do Sul, tendo sido publicadas em 2 de outubro de 2012, com resultado de vencedor em 17 de outubro de 2012, e a segunda licitação em 22 de dezembro de 2016, e, portanto, depreende-se que há tanto compreensão técnica da necessidade como decisão política favorável dos Gestores Municipais para a construção da UBS Fluvial.

Fomos vitimados por incêndios que consumiram boa parte do Bioma Pantanal, sobrando doenças para a população decorrentes da nuvem de fumaça tóxica que persistiu por meses, sem que aos riscos e agravos correspondessem estruturas adequadas e em quantidade suficiente para atender à população, em uma área imensa grande vazio assistencial à saúde, tendo como desfecho do fogo incessante o diagnóstico do despreparo da rede, doenças agudas e crônicas, sofrimento e muitas mortes evitáveis.

Na certeza de merecermos a generosa acolhida de Vossas Excelências, nos subscrevemos esperançosa e respeitosamente. Corumbá/MS, 12 de março de 2025.


terça-feira, 11 de março de 2025

AOS 99 ANOS DE UMA EXISTÊNCIA INSPIRADORA

AOS 99 ANOS DE UMA EXISTÊNCIA INSPIRADORA

Mãe de nove filho(a)s, Dona Yoya, discreta e reservada, fez de sua jornada verdadeiro instrumento de cidadania, ao lado de seu Companheiro de Vida sem se ofuscar nem competir: praticou o protagonismo cidadão que forjou o caráter de toda a sua Família. Neste 11 de março estaria completando 99 anos, razão pela qual tomo a liberdade de compartilhar o texto em sua homenagem de sete anos atrás.

 

OS 92 ANOS DA PEREGRINA DE DOCE OLHAR

WADIA AL HANY DE SCHABIB (11/03/1926 - 15/06/2009)

Caso estivesse conosco, o presente que a Vida nos deu como Peregrina de doce olhar -- que nós chamávamos de Mãe -- estaria, neste domingo, 11 de março, fazendo 92 anos. Eternizada há menos de nove anos, sua presença não é apenas saudade, mas fonte de sensatez e candura a nortear nossos caminhos.

Nascida Wadia Al Hany Ascimani, a formosa donzela que encantaria duas décadas depois o meu saudoso Pai, Mahoma Hossen Schabib, era a segunda de onze filhos que a jovem senhora Guadalupe Ascimani de Hany procriou com seu companheiro, o dentista Youssef Al Hany, em San Joaquín de las Aguas Dulces, departamento do Beni, Bolívia. Nossa Avó Guadalupe, de Pai libanês maronita e Mãe boliviana, casara-se aos 16 anos, como toda donzela de seu tempo. Nosso Avô Youssef, aliás José, libanês druso que estudara na Alemanha até ser atraído pelos encantos e mistérios amazônicos, ainda no pós-guerra de 1917, trocou o Oriente Médio pelo Oriente boliviano, tendo-se dedicado ao povo como se tivesse nascido naquelas terras de promissão e carência.

Desde criança nossa Mãe recebera a incumbência de auxiliar nossa Avó a cuidar dos irmãozinhos, ainda que fossem reduzidos os riscos da Amazônia boliviana. Sendo a mais velha das meninas, cabia a ela o papel de “segunda mãe”, como era apresentada aos amigos da Família. Na década de 1920, período entre-guerras, o Beni, como toda a Amazônia, se transformara em centro provedor de castanha, seringa, carne e minerais preciosos para a Bolívia e o mundo. Por conta disso, levas de imigrantes europeus e asiáticos procuravam o mítico Eldorado (ou El Dorado, em espanhol), mas a maioria encontrava a morte causada pela malária, pelas feras da floresta ou pelos rios indômitos -- muitos aventuravam, mas poucos eram os vitoriosos e podiam contar a sua história para os descendentes.

Não demorou muito para que o imigrante libanês Youssef se transformasse no lendário “Doctor José Al Hany”, dentista que por falta de médicos acabara cuidando da saúde e salvando vidas nos vilarejos situados à beira dos temidos rios amazônicos. Quando ele faleceu, não faltou um prefeito que o homenageasse com o nome de uma rua em Trinidad, capital do Beni, mas que, durante a ditadura sanguinária de Hugo Banzer Suárez, algum interventor rancoroso retirou seu nome para pôr o de um ancestral seu. Se isso fizera falta aos seus descendentes? Absolutamente, até porque a quase totalidade dos Hany se espalhara pela Bolívia e toda a América Latina, fazendo jus à sua origem peregrina.

Mas para a Família Hany retirar homenagem póstuma beirava anedota diante das histórias canhestras contadas pelo Tío Simón Hany, Irmão mais velho e que chegara antes de nosso Avô José à Amazônia, pelo Brasil. No início do século XX, então recém-chegado à América, o Tío Simón foi trabalhar na extração de castanha e seringa e produção de carne na gleba de um grande fazendeiro português, descendente dos senhores de escravo da época da colonização. Cansado dos abusos e represálias do arrogante patrão, o então jovem imigrante decidira pedir as contas e mudar-se para o outro lado da fronteira, a Bolívia. Aconselhado por um amigo africano, havia mais tempo na fazenda, a não fazer isso para não perder a vida -- antes fugisse sem deixar vestígios, mesmo deixando seus haveres --, mas ele relutara por entender que eram seus direitos e que ninguém o enganaria. Resultado: depois de pegar todo o salário devido, o Tío Simón foi alvejado por jagunços do patrão e, enquanto parecia agonizar, era roubado todo o seu dinheiro. Ainda com vida, apesar de todo ferido pelas balas que o atingiram, foi resgatado pelo amigo africano e levado para um vilarejo pouco distante dali, para ser salvo por nativos. Por ironia da vida, dias depois de o Tío Simón ter sido alvejado, o patrão arrogante e ladrão foi morto por um raio que derrubou uma árvore frondosa sobre ele.

Naquela época, as donzelas eram instruídas em casa. Quando jovem, Wadia (Yoya, em casa) e sua Irmã Magiba queriam seguir os estudos, mas no interior do Beni isso era impossível. Por isso, tão logo se emancipou com o casamento -- três anos depois ela, meu Pai e meus dois Irmãos mais velhos foram morar na cidade universitária da Bolívia, Cochabamba, pois para eles o estudo era instrumento de emancipação de todo e qualquer cidadão --, fez um curso de técnica de enfermagem, o que lhe foi de muita valia até para cuidar dos nove filhos e dos filhos de muitas parentes e amigas.

Enquanto meu Pai fazia uma incursão pelas atividades jornalísticas e intelectuais, numa fase em que a Família tinha alcançado estabilidade financeira, sendo Dona Yoya a administradora dos negócios, uma crise sem precedentes se abateu sobre a Bolívia entre os anos 1953 e 1962, o que os levou a decidir emigrar com todos os filhos para o Líbano. Até porque meu Pai, minha Mãe e os filhos, por tabela, tinham automaticamente cidadania libanesa. Esse período, de quatro anos do Líbano, mostrou uma Wadia ainda mais extraordinária e companheira, o que permitiu que meu Pai retornasse às atividades jornalísticas, vinculando-se à imprensa egípcia, escrevendo em árabe e espanhol, pois os mesmos meios que antes publicavam seus artigos na Bolívia, Chile e Brasil tinham interesse de conhecer como as transformações decorrentes do nasserismo estavam se processando por todo o chamado Mundo Árabe.

A iminência da guerra civil no Líbano fez os meus Pais retornarem para a América do Sul, mas desta vez para o Brasil -- precisamente Corumbá, na divisa dos dois países, o que permitia que os filhos mais velhos pudessem cursar os últimos anos do ensino médio e seguir para a Universidade na Bolívia sem perda de tempo --, o que implicou numa fase de adaptação, sobretudo por causa do calor e das características de cidade de interior, ainda que com um cosmopolitismo ímpar. Com a mesma dignidade com que conduzira os negócios da Família na Bolívia e no Líbano, Dona Yoya se armou de valor e arregaçou as mangas para estar à frente de, inicialmente, uma pequena sorveteria e, depois, uma modesta pousada (na época soía ser chamada de “hospedaria”), com a qual custeou os estudos de todos os filhos, além de ter contribuído, ainda que modesta e anonimamente, para o desenvolvimento do turismo ecológico desta porção rica e singular do planeta por exatos 30 anos ininterruptos, além de ter inserido na agenda local alguns temas por meio de artigos publicados no emblemático decano da imprensa corumbaense, o combativo Diário de Corumbá.

Depois do encerramento das atividades comerciais, Dona Yoya aproveitou de desfrutar melhor da companhia do Seu Schabib, e fizeram memoráveis viagens para rever familiares no Brasil, na Bolívia, no Líbano e no México. Eis que o destino quis que o Companheiro de toda a Vida se eternizasse antes de que eles pudessem ter comemorado suas bodas de ouro, período de recolhimento e viagens curtas, na tentativa de esquecer a sofrida solidão. Mas não se deu por vencida, e com a mesma garra com que enfrentou adversidades em diferentes fases da Vida, viveu por mais treze anos de rica convivência com filhas, filhos, netas e netos, irmãs e irmãos.

Silenciou-se numa chuvosa manhã de 15 de junho de 2009, num leito de clínica em Campo Grande, depois de ter resistido estoicamente a um câncer voraz, oportunidade que nos permitiu conhecer melhor a Peregrina de doce olhar que a Vida nos presenteou como Mãe.

Ahmad Schabib Hany