quinta-feira, 5 de janeiro de 2023

MÁRCIO NUNES PEREIRA PRESENTE!

Márcio Nunes Pereira presente!

Diretor do combativo Diário de Corumbá, Márcio se eternizou precocemente. Jornalista com raro faro de repórter, não parecia ser patrão, mas um humilde colega que aparentava deixar-se levar pelos critérios de seus jovens colaboradores.

Nascido no Dia dos Reis Magos, o saudoso Márcio Nunes Pereira era Filho do Jornalista Carlos Paulo Pereira -- que, depois de ter trabalhado por décadas a fio como redator-chefe do O Momento, matutino conservador ligado à UDN (União Democrática Nacional), decidiu fundar o Diário de Corumbá --, e Irmão caçula de pelo menos três Jornalistas, desses que nos sentimos obrigados a grafá-los com letra maiúscula: Ronei, Carlos Paulo Junior e Valdir.

Tive o privilégio de conhecê-lo ainda adolescente, pois meu saudoso Pai era Amigo do igualmente saudoso Pai dele e, lembro-me como se fosse hoje, desde 1970 costumava levar seus manuscritos em espanhol à Redação, então localizada à rua Antônio João, ao lado do Café São Paulo, da Família Darmanceff. A propósito da eternização de Gamal Abdel Nasser, em 28 de setembro de 1970, meu Pai fez um memorável artigo, quando o acompanhei até o jornal e vi o jovem Márcio trabalhando na gráfica do jornal.

Assim como Márcio, o Diário de Corumbá também ‘nasceu’ no Dia dos Reis Magos, mas 14 anos depois. O Caçula de Seu Carlos Paulo já era adolescente quando o matutino foi para as ruas pelas mãos de um numeroso grupo de jornaleiros experientes, que antes de sair do prédio recebiam uma ‘resenha’ da edição, com destaque para a manchete da edição, o tema da crônica de ‘Tia Fifina’ (heterônimo do fundador e primeiro diretor do jornal) e, obviamente, as notícias policiais, que ajudavam muito nas vendas.

No período em que o fundador dirigiu o Diário de Corumbá o jornal tinha característica bem cosmopolita: de ascendência portuguesa, o Seu Carlos Paulo se iniciou na imprensa cuiabana, onde trabalhou por muitos anos. Ainda jovem foi contatado por um dos donos de O Momento, razão pela qual se mudou para Corumbá, tendo assumido a chefia de redação do mais conservador dos jornais corumbaenses, até ter condições de fundar o seu próprio jornal e dar a linha editorial pluralista e inovadora, que os Filhos seguiram.

Por isso costumo dizer que o primeiro jornal corumbaense a publicar artigos em espanhol foi o Diário de Corumbá. Havia ao ano pelo menos duas edições bilingues (português-espanhol), uma no dia 27 de maio (Dia de la Madre, na Bolívia, em homenagem às Mães que protagonizaram a primeira gesta libertária contra os colonizadores espanhóis, por essa razão não há cidade importante boliviana que não tenha uma rua ou avenida “Las Heroínas” ou “Heroínas de la Coronilla”) e a outra no dia 6 de agosto (Día de la Patria, em homenagem à Proclamação da Independência, em 1825).

Somente depois da eternização de meu Irmão Mohamed, em 1974, meu Pai me deu a oportunidade de traduzir seus artigos, bem como às minhas Irmãs. Meu Pai era um homem à frente de seu tempo e se identificara muito com o Seu Carlos Paulo Pereira, que como patriarca de uma prole fazia com que seus Filhos se iniciassem no ofício, sempre com humildade, sem qualquer privilégio em relação aos trabalhadores do jornal.

Como bem me lembrou nestes dias o querido Amigo-Irmão Edson Moraes, em 1975, ano em que nossa Amizade se iniciou, o Diário de Corumbá era, além de uma Redação de jornal, um ponto de encontro de jovens desassossegados, no dizer do eterno Fernando Pessoa. Por isso também uma escola de Jornalismo, num tempo em que Mato Grosso não tinha nenhum curso de Comunicação Social para a formação profissional de inúmeros jovens ávidos por ingressar no ofício por meio da academia.

Em Mato Grosso do Sul isso foi acontecer em 1989, graças à luta do Sindjor/MS (Sindicato dos Jornalistas Profissionais) -- entre eles o incansável Edson Moraes, ao lado de nosso conterrâneo Luiz Taques, Luiz Gonzaga Bezerra, Ivan Pacca, Edson Silva, Flávio Teixeira, Mário Ramires, Márcio Licerre, Dante Filho e com a participação indispensável de grandes Jornalistas mulheres, como Margarida Marques, Lúcia da Silva Santos, Maria Cristina Ataíde, Margarida Galeano, Kátia Seleguim, Ecilda Stefanello, Sueli Bacha, Marília Leite, Rosa Bezerra, Neusa Santana e Cristina Pacca --, que desde sua fundação, em 1980, levantou essa bandeira e não arredou pé para que a UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) oferecesse com primazia, por ser na época a única pública.

Não tive oportunidade de ler a íntegra da História do Curso de Jornalismo da UFMS, mas é imprescindível dar os créditos ao então presidente do Sindjor/MS, Jornalista Edson Silva (um de seus primeiros docentes), com o efetivo protagonismo do saudoso Professor Jair Madureira, reitor da UFMS, e de seu chefe de gabinete, o também saudoso Professor Octaviano Gonçalves da Silveira Junior. Sua articulação se iniciou em Corumbá, durante a realização do VI SEPE (Seminário de Ensino, Pesquisa e Extensão), sob a coordenação colegiada dos Professores Gilberto Luiz Alves, Valmir Batista Corrêa, Arnaldo Yoso Sakamoto, Gisela Levatti Alexandre, Edy Assis de Barros e Lúcia Salsa Corrêa. O evento na época foi comparado por um diretor do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) a uma “mini-SBPC” pela abrangência de temas tratados, conforme então a imprensa (Diário de Corumbá, Jornal da Manhã e Correio do Estado) registrou.

Tal como seu diretor derradeiro, o Diário de Corumbá é referência insuspeita para quem quiser pesquisar em jornais o período de 1969 a 2005, sobretudo entre 1984 e 1997, pois Márcio Nunes Pereira praticamente refundou o jornal, resgatando a linha editorial que o fundador tinha adotado. Não se pode escrever sobre a Corumbá do século XX sem buscar em hemerotecas públicas e particulares exemplares das edições memoráveis sob a digna e corajosa direção do Filho caçula do Jornalista Carlos Paulo Pereira. Não por acaso o Professor Valmir Batista Corrêa, Historiador (com letra maiúscula) responsável pela sistematização da historiografia de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e, especialmente, Corumbá e Ladário, ao lado de sua Companheira de Vida, a Historiadora Lúcia Salsa Corrêa, tem muitas obras referenciadas no jornal que traz abaixo de seu título “Um jornal se mede pelas verdades que diz”.

Neste Dia dos Reis Magos celebremos, pois, a presença iluminada do grande Jornalista e verdadeiro Amigo-Irmão Márcio Nunes Pereira, cuja eternização deixou uma lacuna no Jornalismo Investigativo, sobretudo, por meio de seu modesto mas gigante Diário de Corumbá. Dona Margareth Mattas Pereira e Paulo Mattas Pereira, o querido Paulinho, o Filho do casal, recebam o fraternal abraço neste emblemático dia, que jamais passará despercebido.

Ahmad Schabib Hany

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