quinta-feira, 24 de junho de 2021

HORA DE VIRAR A PÁGINA

HORA DE VIRAR A PÁGINA

A naturalização de uma sucessão de absurdos, ou melhor, de cúmulos do absurdo, revela a complacência de uma sociedade que não enxerga com sensatez seu presente e muito menos seu porvir. Ou, como legado da tragédia que está sendo a pandemia, mudamos com seriedade esta postura e viramos literalmente a página da História, ou capitulamos todos, feito suicidas...

Soltar os anéis para garantir os dedos. Foi o que aconteceu com a decapitação de Salles, aquele ministro que não deixa saudade, mas um rastro de destruição em todos os biomas brasileiros. Óbvio, além da cínica estratégia de ‘vamos passando a boiada’ enquanto os brasileiros de debatem como puderem com a trágica pandemia...

Ricardo Salles, um obscuro advogado da metrópole paulistana que alçou um voo em que foi incapaz de dizer a que viera: gerir as políticas ambientais como seres minimamente ilustrados, que vivem no século XXI (não na Idade Média), foi algo difícil, impossível de ser feito. Ao contrário, a postura de reles despachante de interesses de suspeitos de crimes e contravenções, como madeireiros, grileiros, garimpeiros e congêneres, marcou a gestão voltada para tudo que fugisse dos paradigmas da Agenda 21, demonizados, aliás, pelo ajuntamento de forças ultraconservadoras que, em vez de governar, atentam contra o Estado Democrático de Direito.

No entanto, a queda do ministro antiambiental não significa que o núcleo de poder do Palácio do Planalto tenha reconhecido sua desconexão com a realidade. Tratou-se tão somente de estratégica saída de cena de um ministro em situação insustentável. Pior, no momento em que a CPI da Covid-19 flagra fatos comprometedores em que o detentor do principal cargo da República sai chamuscado. Em que pegou mal o empenho presidencial de participar da intermediação para aquisição de uma vacina desconhecida e cujo uso no Brasil ainda não tinha sido autorizado, nem em caráter emergencial, pela Anvisa.

Num cenário de guerra de terra arrasada, os meses de maio e junho são contexto de um período sombrio, de desesperança e de angústia, muita angústia. Indiferente a tudo isso, os principais integrantes do governo federal dão passos perigosos para privatizar todo o sistema energético brasileiro, da maneira mais predadora, em que o consumidor será o responsável por pagar literalmente a conta. Simultaneamente, o mesmo ocorre no tocante à flexibilização das normas de demarcação de terras indígenas e da gestão territorial das reservas indígenas, votada a toque de caixa pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e já com rumo certo para passar pelo rolo compressor do plenário e seguir para o Senado na maior brevidade possível.

Em dois anos e meio de um governo que acintosamente optou por desmontar as políticas de Estado, previstas na Constituição Federal de 1988, e atentar flagrantemente contra as instituições democráticas, fica inconcebível justificar atos insólitos, que fazem do Brasil um pária no concerto das nações. Aliás, é uma sucessão de perdas concretas em todas as direções as ocorridas, e, para agravar, com o nítido propósito de permanecer por um tempo desconhecido, ignorando o mandato constitucional, ainda que mediante golpe.

Desgoverno de abutres, de predadores. Não é preciso ser exímio analista político para ver a olho nu a característica comum a todos os integrantes do ajuntamento de políticos da republiqueta da Barra, que migrou de mala e cuia para o planalto central com o claro propósito de fincar estaca e ferir de morte o Estado Democrático de Direito. Entretanto, para sorte das forças democráticas sinceramente comprometidas com a ressurreição de todo o legado da Constituição Cidadã, a truculência e o desprezo do saber conspira contra esses vermes que não conseguirão atingir seus nefastos propósitos.

Essa é a hora de virar a página. Uma página funesta, como eles e seus malditos e insanos propósitos. Horda de meliantes que, numa sociedade eivada de suicidas e narcisos, sem qualquer mérito, tomou de assalto os destinos da nação, inclusive o impostor de juiz-herói que se refugiou na terra de seus amos e senhores, o pivô da sucessão de golpes que abriu a caixa de pandora, da qual saíram todos esses fétidos monstrengos, feios, néscios e desequilibrados. Porque até para fazer maldade é preciso ter inteligência. Eles não.

Ahmad Schabib Hany

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