RÉQUIEM
PARA A SOBERANIA CIENTÍFICA
Reportagem da revista Fórum revela que o servidor do CNPq queimou no
mesmo dia em que o sinistro da (não)Ciência, Tecnologia e Inovações dava
salamaleque a uma líder neonazista alemã. É o que negacionistas podem chamar de
coincidência ‘providencial’. Para eles, é claro, porque para o País é uma
tragédia.
Fazer ciência em meio a tantas adversidades
decorrentes do caos promovido pelos déspotas nada esclarecidos que tomaram de
assalto os destinos da nação já é uma proeza. Imagine-se agora, privados da
mais elementar ferramenta de trabalho sediada no Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que é o cadastro nacional de
iniciativas científicas.
Na última quinta-feira, dia 22, o servidor
(computador responsável pelo banco de dados das pesquisas desenvolvidas ou em
desenvolvimento e o cadastro geral de pesquisadores e professores universitários,
conhecido como Plataforma Lattes) do CNPq queimou e, por não dispor de back up,
corre-se o risco de informações estratégicas de anos de produção científica
terem sido perdidas.
Em síntese, o violento corte de verbas para o
desenvolvimento da ciência desde 2016, quando o governo Temer iniciou o
desmonte do Estado com a emenda constitucional do teto dos investimentos
públicos, é o principal fator pela precarização das políticas públicas de
consolidação da soberania tecnocientífica nacional. É claro que a gestão
controversa do ex-capitão, que não tem usado todos os recursos constantes das
rubricas do já minguado orçamento, é o responsável por essa tragédia: é inconcebível
que não haja back up para salvaguardar o banco de dados da produção científica.
Gostem os fundamentalistas ou não, a soberania
científica nacional foi consolidada nos anos 2003-2016, não por acaso nos
governos de Lula e Dilma. A despeito do discurso patrioteiro do atual governo, absolutamente
nada o sinistro Marcos Pontes fez em favor do necessário desenvolvimento da
ciência, da tecnologia e das inovações brasileiras. Ele, que se beneficiou do
avanço tecnocientífico dos anos Lula quando virou celebridade por ter sido o
primeiro astronauta brasileiro, acabou refém do complexo de subalternidade do
núcleo duro do governo do ex-capitão.
Aliás, enquanto o servidor da Plataforma Lattes,
do CNPq, sofria as avarias decorrentes dessa intercorrência, como revelou a
reportagem da revista Fórum, o
titular da pasta recebia a líder neonazista da Alemanha, deputada Beatrix Amelie.
Apesar do ranço nazista da parlamentar alemã, seu partido, AfD, tem um posicionamento
oposto à subalternidade doentia dos atuais inquilinos do Planalto, o que não
justifica o fanatismo excludente dos neonazistas alemães, cujos ancestrais
protagonizaram crimes de lesa-humanidade julgados pelo Tribunal de Nuremberg, e
hoje negados pelos seguidores.
A propósito de soberania científica, o patrono da Plataforma
Lattes, o renomado físico e matemático brasileiro César Lattes, foi um
cientista que dedicou seus melhores anos ao desenvolvimento da ciência em todo
o mundo. Falecido em 2005, o legado de Lattes está presente em todos os
quadrantes do Planeta, tendo sido injustiçado pela Academia de Ciências da
Noruega ao premiar com o Nobel de Física o chefe da equipe, Cecil Power (e não
o descobridor, ele) de uma subpartícula atômica que revolucionou os conceitos
básicos da Física, em 1946. Na década de 1960, construiu um observatório
astronômico em La Paz, Bolívia, que leva seu nome, com o generoso objetivo de
aprimorar as redes de observação do Universo.
Pena que os atuais gestores da Educação e da
Ciência, Tecnologia e Inovações na esfera federal não tenham noção da
importância da consolidação da soberania tecnocientífica em território
brasileiro. E a maior prova disso é a perda absurda do cadastro geral de
pesquisadores e sua valiosa produção científica. Mais um crime cometido contra
a soberania nacional, no âmbito da ciência e tecnologia, que não tem justificativa.
Ahmad Schabib Hany
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