segunda-feira, 12 de julho de 2021

CUBA, BIDEN E AS NOVAS 'PRIMAVERAS'

CUBA, BIDEN E AS NOVAS ‘PRIMAVERAS’

Em 2011, os Estados Unidos e seus aliados do ocidente promoveram aquilo que se chamou de ‘Primavera Árabe’, que não era ‘primavera’ e muito menos ‘árabe’. Dez anos depois, vemos os nefastos resultados, positivos só para os abutres do mercado do petróleo, pois a maior das ditaduras, a Arábia Saudita, não só se mantém como continua a maior aliada dos governos ocidentais e das grandes corporações.

Nem tudo que reluz é ouro, sobretudo quando se trata de Havana. É que colonizadores que se sucederam ao longo dos últimos cinco séculos chamaram o bronze de ‘ouro de havana’, seguramente em tom discricionário. Mesmo assim, os conglomerados midiáticos nestes dias vêm se jactando com os tumultos protagonizados por grupos que muito lembram os famigerados, a partir de 2013, do ‘ponha-se na rua’, ‘movimento Brasil desestabilizado’, ‘patrioteiros desvairados’ e ‘corrupção auriverde’.

Quem pensou que Joe Biden assumiria a Casa Branca para levar a justiça e a paz para o mundo se enganou redondamente. Ele só é menos predador que Donald Trump, porque a base dos apoiadores do ex-presidente estadunidense é perigosamente neofascista, medieval e negacionista. De resto, a lógica da defesa do império americano é a mesma, e sempre haverá serviçais prontos para vender a mãe pátria por trinta moedas.

Muito antes de terem-se tornado ‘superpotência’, os Estados Unidos, já no século XIX, tentavam pôr as manguinhas de fora. A doutrina Monroe, cuja ardilosa consigna era ‘A América para os Americanos’, queria estabelecer uma ‘reserva de mercado’ colonial em todo o continente. Eduardo Galeano, na década de 1970, resgatou o repto de Simón Bolívar, que advertiu o presidente James Monroe: “A América para os americanos, não. A América para a humanidade.” O Haiti, Cuba e outras ex-colônias latino-americanas, recém-libertas com muita luta já experimentavam o jugo e o saque ‘libertário’ dos ‘irmãos do norte’ e seus fantoches das repúblicas bananeiras.

Os estudiosos da geopolítica sabem que, a rigor, não há diferença substancial entre a política externa dos republicanos e dos democratas. E a maior prova disso é o Estado de Israel, cujo governo, seja qual for, não sofre qualquer sanção do mais ‘democrata’ dos inquilinos da Casa Branca. E inversamente em relação a Cuba, Venezuela, Nicarágua, Argentina, Bolívia, Palestina, Síria, Irã, China, Rússia e Coreia do Norte.

As diferenças são quanto à forma de agir, para o chamado público externo. Sobretudo, depois do fim da ‘guerra fria’, em 1990. Antes, por conta da lógica bipolar, os governos dos Estados Unidos precisavam calibrar bem as suas sabotagens, até para não provocar o outro lado. Aliás, a crise dos mísseis de Cuba, em outubro de 1962, é emblemática - o recuo de John Kennedy ante o apoio de Nikita Krushev aos jovens rebeldes da Ilha (Fidel, Ernesto e Camilo) foi um componente determinante para o atentado de Dallas, semanas depois, contra a vida do único presidente católico da história estadunidense, nunca elucidado.

Desde que o Povo Cubano (com maiúsculas) destituiu Fulgencio Batista, fantoche dos Estados Unidos que fazia da ilha um grande bordel para saciar a sevícia dos ricaços do continente, os sucessivos inquilinos da Casa Branca impuseram um bloqueio econômico que já dura mais de 60 anos. Com Jimmy Carter e Obama houve uma discreta redução das sanções, mas antes Trump e agora Biden têm que cumprir promessas de campanha e, indiferentes às questões humanitárias, tensionam os ânimos para atingir seus funestos objetivos, isto é, voltar a fazer da ilha o bordel dos abutres estadunidenses.

Há dez anos tivemos a famigerada ‘Primavera Árabe’, avalanche de revoltas convocadas pelas redes sociais sem liderança, organização ou agenda - que nada tinha de primavera e muito menos de árabe, como depois foi constatado pelo vazamento das transcrições de mensagens entre agentes dos órgãos de segurança dos Estados Unidos protagonizado por Edward Snowden -, e cujos resultados foram a destruição e/ou desestabilização de potências econômicas autônomas árabes, entre elas a Líbia e a Síria, sob pretexto de ‘levar democracia’, com o único afã de controlar a produção de petróleo e a instalação de gasodutos pelas corporações estadunidenses e europeias.

Nessa época, Barack Obama tinha como vice-presidente ninguém menos que Joe Biden, o mesmo que andou chafurdando em diversas democracias latino-americanas, a começar por Honduras, Paraguai e Brasil, como Snowden revelou para o mundo. Na Líbia e Síria as mãos de Biden estão manchadas com o sangue inocente de centenas de milhares de civis mortos ou que tiveram suas vidas amputadas em todas as acepções, inclusive a literal. E, pior, a herança maldita é ainda maior, pois a tragédia humanitária que a África vive até hoje é decorrência da desestruturação estatal, econômica e política da Líbia, que por décadas absorveu a mão de obra continental com sua economia estável e mercado de trabalho bem remunerado e protegido por uma seguridade de país socialista, tal qual o Egito de Gamal Abdel Nasser e o Iraque de Saddam Hussein.

Com Biden, logo recomeçaram as escaramuças na Nicarágua mediante a campanha de desprestígio do novo mandato do sandinista Daniel Ortega, e na Síria de Bashar Al-Assad, que provou para o mundo que a tal ‘oposição’ tinha armas mais letais que as forças regulares sírias e que o tal ‘Estado Islâmico’ não passava de mercenários recrutados no ocidente, com o adestramento de agentes de Israel e dos Estados Unidos.

No funesto tabuleiro de xadrez - em que milhares (senão milhões) de vidas humanas são rifadas -, estratégias, tecnologias e projetos de armas bélicas são experimentadas, cujo patrocínio geralmente cabe às ‘obedientes’ ditaduras totalitárias da Arábia Saudita, Qatar, Omã e Emirados Árabes Unidos, as novas colônias do Tio Sam. Por quê? Mais que o petróleo, os Estados Unidos precisam se manter na hegemonia a qualquer custo, mesmo sabendo que em menos de dez anos a China já terá se consagrado a maior potência mundial, para desespero de Trump e sua matilha de serviçais, patrioteiros que mamam suas pátrias com belíssimos salários enquanto submetem as suas populações à miséria, à fome e à mortandade pandêmica. Isso também a mídia não mostra...

A turnê do diretor da CIA a diversos países da América do Sul, revelada pela mídia não empresarial (aliás, sequer comentada pelas grandes redes televisivas tupiniquins), dias atrás, é a evidência de que os sabujos de plantão conhecem a extensão do estrago mas, serviçais como são, nada farão para assegurar a soberania, a paz e a integração regional. Por quê? Porque seus amos e senhores do império assim o desejam. Mas a tecnologia é o maior inimigo dos ‘tigrões-tchutchucas’, toda vez que abafam o naco em suas pregas pestilentas, o saldo lhes é negativo.

Sobretudo no ibope... Que assim seja!

Ahmad Schabib Hany

2 comentários:

Trabalhos Acadêmicos disse...

Uma importante recapitulação da história política norteamericana recente que a grande midia procura apagar ou desvirtuar.

O caminho se faz ao caminhar disse...

Sem dúvida, Professora! Obrigado pelo generoso comentário, que leva para uma reflexão oportuna e inadiável.
Grande abraço!