GRITO
DO SILÊNCIO
OU,
A VIDA PEDE PASSAGEM...
Emblemáticos artistas populares,
Aldir Blanc e Flávio Migliaccio se eternizam no mesmo dia como que a Vida
quisesse pedir passagem, pedir socorro, em meio a este delírio injustificável. E
o pior é que aquela que um dia foi a (sic) “Namoradinha do Brasil” assume a
postura obscurantista de seu chefe, um delinquente recalcado que impune e
acintosamente tomou de assalto os destinos da nação.
Segunda-feira, 4 de maio. Em meio à
pandemia de covid-19, dois ícones da cultura popular brasileira saem de cena —
o compositor Aldir Blanc, autor de “O bêbado e a equilibrista” e “O Brazil não
conhece o Brasil”, e o ator Flávio Migliaccio, que emprestou a vida a
personagens como Xerife, Tio Manequinho e Seu Chalita —, como que a Vida
quisesse pedir passagem. No dia anterior, uma horda de um misto de delinquentes
e delirantes bradavam impropérios na ânsia de demonstrar poder, feito jagunços ou
mercenários contemporâneos a serviço de milicianos, sonegadores, rentistas e
fantoches de transnacionais que fincaram posse neocolonial neste gigante
adormecido.
A ex-namoradinha do Brasil — se é que
um dia existiu (em tempos de pós-verdade, até tal mito precisa ser revisto) —, hoje
um ser rastejante alçado à Secretaria de Cultura do (des) governo de BoçalNero
que renega sua própria história, ainda que medíocre, sequer teve a dignidade de
enviar condolências aos familiares desses dois baluartes das artes, um deles
colega de emissora por quase cinquenta anos. Teve a incapacidade de imitar seu “chefe”,
ao dizer que sua secretaria não pode virar (sic) “obituário” e que a humanidade
sempre esteve entre a vida e a morte, subestimando o valor de cada uma dessas
pessoas que se eternizaram nesta triste quadra de nossa história.
Aldir Blanc, médico que se
notabilizou nas letras, foi cronista, compositor e escritor de inegável
talento. Foi dos primeiros colaboradores da primeira e mais genial fase de O
Pasquim (no tempo da emblemática “Editora CODECRI”, irreverente sigla para “Comitê
de Defesa do Crioléu”, com sede em Ipanema, o bairro da intelectualidade
rebelde dos anos 1960/70). Ao lado dos/as não menos talentosos Tarso de Castro,
Jaguar, Fausto Wolf, Ivan Lessa, Millôr, Henfil, Fortuna, Ziraldo, Zélio, Martha
Alencar, Claudius Ceccon, Sérgio Cabral, Sérgio Augusto, Paulo Francis, Luiz
Carlos Maciel, Flávio Rangel e tantos outros/as. A despeito de ser uma
celebridade, precisou esperar dias para ser internado no CTI de um hospital
público do Rio. Foi a covid-19 que o tirou de cena. (Veja artigo do Jornalista
Vitor Paiva sobre a mostra alusiva aos 50 anos de “O Pasquim”, disponível pelo
link <https://www.hypeness.com.br/2019/12/o-pasquim-a-incrivel-historia-do-jornal-de-humor-que-desafiou-a-ditadura-e-ganha-exposicao-em-sp-ao-completar-50-anos/>.)
Flávio Migliaccio, discípulo de
Augusto Boal e companheiro de Plínio Marcos e Lima Duarte, se eternizou por
opção. Indignado com a avalanche de imbecilidade que assola o Brasil, tomou uma
atitude drástica: sair de cena. Mas deixou uma contundente mensagem para os que
ficam: “Me desculpem, mas não deu mais. A velhice neste país é o caos, como tudo
aqui. A humanidade não deu certo. Eu tive a impressão que foram 85 anos jogados
fora num país como este. E com esse tipo de gente que acabei encontrando.
Cuidem das crianças de hoje! Flávio.” (Veja depoimento no programa Persona
(TV Cultura), disponível no link <https://www.youtube.com/watch?v=MD5SdL4fGAM&feature=emb_title>.)
Diante da indiferença de Regina
Duarte, Isabel Blanc (filha de Aldir) declarou-se aliviada por ficar sabendo
que a “gestora” da Cultura no desgoverno do capetão “não conhecia” o autor de
célebres hinos, como “O bêbado e a equilibrista”. Já o ator Lima Duarte, que contracenou
como “Sinhozinho Malta” com a “namoradinha do Brasil” quando fazia o papel da “Viúva
Porcina”, fez um emocionante desabafo, confessando que compreendia a atitude de
Migliaccio: “Agora, quando sentimos o hálito putrefato de 1964, o bafo terrível
de 1968, agora, 56 anos depois, quando eles promovem a devastação dos velhos,
não podemos mais. Eu não tive a coragem que você teve.”
Eis o grito do silêncio. Ou melhor, a
tentativa de a Vida pedir passagem. Será que esses/as “cristãos/ãs”, “empresários/as”,
“patriotas” se sensibilizarão? A realidade diz que não. Cínicos/as,
perversos/as, fanáticos/as, devassos/as, tarados/as, delirantes, imbecis,
psicopatas... Na semana em que o número de vítimas fatais pela covid-19 chega a
dez mil e o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF) decretam luto
oficial de três dias, o mentecapto capetão anuncia um churrasco para centenas
de pessoas no Palácio da Alvorada. Comentar o quê? Quem votou em desequilibrado
já esperava um desgoverno. Mas quem não caiu em sua conversa não tem por que
ser vítima de um ser nefasto como esse. Interdição já!
Ahmad
Schabib Hany
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