O COMBATE DERRADEIRO DO JORNALISTA JOSÉ CARLOS CATALDI
Jornalista, Radialista e Advogado (desses com
letras maiúsculas), José Carlos Cataldi viveu a combater todo tipo de injustiça
desde que se iniciou no rádio, aos 14 anos, em pleno regime de 1964. Entretanto,
no momento em que cabia a ele usufruir seus direitos, o incansável defensor de
milhares, senão milhões, de cidadãos anônimos ao longo de cinco décadas de
ofício, não encontrou um leito de CTI que lhe garantisse o direito de viver.
O
Jornalista José Carlos Cataldi, também advogado e radialista, encerrou sua
jornada neste 27 de março, aos 67 anos, no interior de São Paulo, à espera de leito
de CTI covid-19 que lhe garantisse o direito de continuar a viver. Uma Vida na
face da Terra dedicada às causas de milhares - ou, talvez,
milhões -
de cidadãos anônimos que o ouviam e o acompanhavam diariamente atrás de
orientações de defesa de direitos, denúncias, apelos ou simplesmente reconhecimento
e dignidade.
Os
ouvintes de Corumbá e Ladário tiveram a sorte de tê-lo conhecido, ainda que por
um breve tempo, quando, a convite do colega e amigo Armando de Amorim Anache, à
época diretor de Jornalismo da Rádio Clube de Corumbá, dirigiu, produziu e
apresentou vários programas na emissora, então campeã de audiência. Seu apurado
domínio da radiofonia oportunizou ao então exigente público uma excelente
seleção musical, como a dos tempos do querido e qualificado Juvenal Ávila de
Oliveira, que entrou para a história como um dos melhores diretores musicais do
rádio brasileiro, ao lado de Walter Silva e Sérgio Cabral.
Além
do profissionalismo, Cataldi, com sua generosidade, contribuiu para a formação
de inúmeros jornalistas e radialistas na região, bem como emprestou seu
conhecimento jurídico a colegas da outra emissora da região. Mais que uma
referência ética, atuou como um Professor, abnegado e profundamente
comprometido com o ofício escolhido em tenra idade, pelo qual deu seus melhores
dias e a própria existência.
No
Rio de Janeiro, da Rádio Nacional, da qual fora afastado nos anos de chumbo,
Cataldi foi um incansável e combativo membro, tendo integrado a associação de
demitidos da emissora durante o regime de arbítrio, tendo ganhado o processo de
reintegração e indenização por danos morais e materiais. Foi também atuante
membro do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio de Janeiro, do
Sindicato dos Radialistas do Estado do Rio de Janeiro e da Comissão de Direitos
Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Rio de Janeiro. Foi, também,
filiado ao Partido Socialista Brasileiro (PSB), de Jamil Haddad e Miguel
Arraes, cuja atuação marcou história no Brasil.
Em
1990, quando a ganância dos falcões do Pentágono pelo petróleo, sob a batuta de
George Bush pai, atacaram o território do milenar Iraque na agressão denominada
“Tempestade no Deserto”, Cataldi realizou memorável debate na Rádio Clube. Numa
época em que não havia internet e a dobradinha CNN-Globo se encarregava de ‘fazer
a cabeça’ de telespectadores e ouvintes de toda a região, abriu os microfones
da Jovem Clube e, durante todo o tempo em que aconteceram as hostilidades contra
o povo iraquiano, foi possível ter a opção de uma cobertura isenta e ética
realizada pela Clube, ainda que na época ela fizesse parte do Sistema Globo de
Rádio.
Discreto
em suas manifestações, embora muito contundente na defesa da liberdade de
expressão, Cataldi protagonizou importantes conquistas para imigrantes de todas
as procedências: palestinos, sírios, libaneses, bolivianos e paraguaios. Jamais
esquecerei que, a par da defesa, por uma advogada boliviana, de um brasileiro arbitrariamente
detido em Porto Suárez, abriu os microfones da emissora da Delamare para
acompanhar, paripasso, os desdobramentos do processo judicial, que só teve um
desfecho justo pela mobilização decorrente da cobertura jornalística corajosa
desse bravo Jornalista que honrou o seu ofício em toda a sua existência.
A
equipe de Cataldi em Corumbá, não muito numerosa, era incansável como ele: os
saudosos Arnaldo Gomes da Costa, chefe de redação; João de Oliveira Neves, ‘Joãozinho
Gente Boa’, na ‘Vermelhinha’ (unidade móvel); Antônio Ávila, na reportagem com as
então jovens repórteres Landa Nantes e Silma Lima, desempenhavam o ofício de
informar com isenção, sob a pauta do respeitado comunicador, sempre respeitador
da ética jornalística, e o aval incondicional do Jornalista Armando de Amorim
Anache, mais que diretor atuava como colega e membro da equipe. Nas várias
oportunidades que substituiu o titular nos emblemáticos ‘Debates Populares’,
Cataldi conduziu com maestria e elegância a mesa-redonda diária em que o
Professor Valmir Batista Corrêa, o médico Benedito Gattass Orro e o saudoso
advogado Lício Benzi Paiva Garcia davam as suas contribuições para refletir
sobre a nossa realidade coletiva.
Além
da consternação pela irreparável perda para o Jornalismo, a radiofonia, o livre
exercício da advocacia e a cidadania, a eternização precoce em circunstâncias adversas
do agora saudoso Jornalista, Radialista e Advogado José Carlos Cataldi causa muita
dor, indignação e revolta diante da omissão deliberada de uma coordenação
nacional para o enfrentamento da pandemia inexistente, causada pelo fanatismo
doentio e medieval de ufano-fundamentalistas que, mais cedo, mais tarde,
haverão de responder por crimes de lesa pátria e lesa humanidade. Canalha que
escapou do Tribunal de Nuremberg não vai escapar do Tribunal da História. José
Carlos Cataldi presente!
Ahmad Schabib
Hany
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