sexta-feira, 8 de julho de 2022

DOM CLÁUDIO HUMMES, DISCRETO E ARTICULADO

Dom Cláudio Hummes, discreto e articulado

Dom Cláudio Hummes surge, discreto e articulado, em meados da década de 1970, quando era Bispo Diocesano de Santo André. Com ele, surgia também o novo sindicalismo brasileiro, distante dos ‘pelegos’ (como ‘Joaquinzão’, apoiado pelo PCB como estratégia de enfrentamento à ditadura). A maior expressão desse processo de empoderamento da classe trabalhadora se chama Lula.

Padre Franciscano ordenado em 1958, Dom Cláudio Hummes foi empossado em meados da década de 1970 na Diocese de Santo André da Borda do Campo, que, com São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul, forma a região metropolitana de São Paulo, o Grande ABC (mais tarde acrescida de Diadema, ABCD). Região de trabalhadores vindos de todas as regiões do Brasil, a Diocese de Santo André, durante o período em que Dom Cláudio foi Bispo Diocesano, era uma usina de soluções sociais: Comissões Eclesiais de Base (CEBs), Comissões de Fábrica, Movimento Popular de Saúde (MOPS), Pastoral do Migrante, Pastoral da Juventude (PJ), Pastoral Operária, Pastoral do Menor (assim é que chamava, pois estávamos em plena ditadura, e o Estatuto da Criança e do Adolescente sequer ainda tinha sido discutido pela sociedade civil) etc.

Dom Cláudio, a despeito de seu jeito tímido, sempre se caracterizou pela determinação e galhardia. Não foram poucos os enfrentamentos com as tropas regulares e verdadeiras hordas de milicianos que mandavam e matavam noite e dia, sob as ordens do temido Delegado Fleury, apoiado por empresários paulistas integrantes da OBAN (Operação Bandeirante), que incluía grandes grupos, entre eles o então Grupo Folhas, que edita a Folha de S.Paulo. Emblemático foi o acolhimento aos trabalhadores em greve no interior da Matriz de São Bernardo, enquanto as tropas do lado de fora circulavam ameaçadoras, feito uma matilha à espreita de suas presas.

A repressão sanguinária perpetrada entre os anos 1968 e 1971 pelas mãos assassinas de Sérgio Paranhos Fleury dizimou a resistência popular nessas congestionadas terras. No entanto, discreta e articuladamente, a Igreja desenvolvia um inesgotável trabalho junto às famílias trabalhadoras. Foi, aliás, assim como Luiz Inácio, o Presidente Lula, se politizou. Primeiro lendo a Bíblia, depois pondo em prática os seus ensinamentos, e dessa forma surge o líder sindical Lula que se transforma no estadista renomado mundo afora. Não por acaso, recalcados como Moro e Dallagnol, que precisam pagar por seus crimes, fizeram o que fizeram, seguindo a cartilha fascista...

Totalmente diferente de pastores como Milton Ribeiro, que rasgou sua biografia como reitor da Universidade Mackenzie de São Paulo, o saudoso Pastor Jaime Wright, também da Igreja Presbiteriana, não só lutou pelos direitos humanos, como enfrentou ativamente as forças da repressão. Ao lado de Dom Paulo Evaristo Arns, Arcebispo Metropolitano de São Paulo, reuniu todos os casos de tortura cometidos até então pelo regime de 1964. Lá estava, discreto e articulado, Dom Cláudio, que em 1996 foi nomeado Arcebispo de Fortaleza, e em 1998 retorna para São Paulo como Arcebispo, e permanece até 2006. Fica no Vaticano como Prefeito da Congregação do Clero, por ato do Papa Bento XVI, até 2010, quando decide retornar para o Brasil, e é eleito pela CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) Presidente da Conferência Eclesial da Amazônia, sua última missão, tendo renunciado dois meses antes de sua eternização.

Na verdade, por pouco não foi Dom Claudio Hummes o brasileiro eleito Papa em 2005. A eleição do Cardeal Joseph Ratzinger causou surpresa, tanto que ele preferiu renunciar ao Pontificado anos depois. E o mais curioso, pelo que revelou o Papa Francisco: tão logo ele foi eleito em 2013, o bem articulado e cordial Cardeal Hummes lhe insistiu que “não esqueça dos pobres”, ainda na Capela Sistina. Sua fala o tocou tão fundo, que decidiu adotar seu Pontificado com o nome Francisco. Eis um brasileiro que precisa ser conhecido e reconhecido por seus patrícios: embora discreto, bem comprometido com a humanidade, tendo sido marcante em dois Conclaves, de 2005 e 2013, reconhecido como o principal articulador da eleição do Papa Francisco.

Com a mesma discrição que conduziu sua trajetória sacerdotal, Dom Cláudio Hummes se eterniza, porém, num momento em que seu papel de articulador é gritante. Talvez seja o desafio que exija da sociedade civil que ele tanto protegeu nos anos de chumbo, desta vez chamada a fazer a sua parte, indissociável da consolidação do Estado Democrático de Direito. Até sempre, Dom Cláudio Hummes!

Ahmad Schabib Hany

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