UM
EXEMPLO DA BOLÍVIA NO ENFRENTAMENTO AO COVID 19
Não
basta lavar as mãos, é preciso reduzir a concentração de pessoas para conter o
contágio pelo coronavírus para não saturar o sistema de saúde e assegurar assistência
médica com dignidade a todos/as os/as infectados/as.
A
despeito de excessos de caráter ideológico e eleiçoeiro, próprios de um governo
golpista que procura legitimar-se a qualquer preço (como a proibição de passageiros
oriundos da China, Coreia do Sul, Itália e Espanha), a Bolívia está dando um
exemplo digno de ser imitado: a suspensão de atividades educativas, esportivas,
culturais, comerciais e, pasmem, religiosas, num sério esforço de conter o
contágio em escala multitudinária (caso da Itália e Espanha). É bom que se
registre que a iniciativa partiu de governos departamentais de Santa Cruz e
Oruro, que fazem oposição à autoproclamada presidenta e candidata à reeleição
Janine Áñez, ex-senadora pelo departamento amazônico do Beni (Norte do país).
É
louvável a iniciativa da mídia difundindo hábitos de higiene para a prevenção
da disseminação do coronavírus em nosso meio, como lavar as mãos e espirrar
cobrindo com o braço para reduzir o risco de contaminação. Mas, diante do
reconhecimento pelas autoridades sanitárias de que já se atingiu o estágio da
chamada contaminação sustentável ou comunitária da pandemia -- quando o
contágio deixa de ser identificado como oriundo de alguém que viajou ao
exterior ou teve contato com alguém que viajou ao exterior e a infecção deixou
de ser identificada em sua rede de contágio --, passou da hora da suspensão de
atividades que levem à concentração de pessoas de quaisquer idades, sejam elas educacionais,
culturais, esportivas, em locais de trabalho, de lazer, comércio, turismo etc.
Primeiro
porque nossos equipamentos de assistência médica mal conseguem atender à
demanda em tempos de epidemias já conhecidas, como dengue, influenza, H1N1 e
suas variações sazonais, além do crescente número de vítimas com traumatismos
decorrentes dos elevados acidentes de trânsito registrados nos últimos meses. Lamentavelmente
a não aprovação pelo Ministério da Educação, em 2017, da abertura do curso de
Medicina pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul em Corumbá contribuiu
para a precarização dessa infraestrutura. É que com a oferta de um curso de
Medicina, haveria a necessidade da construção de um Hospital Universitário e a instalação
de laboratórios e clínicas (ainda que privadas) equipadas com tecnologia de
ponta, resgatando o papel de Corumbá de referência em saúde para cidades vizinhas
como Miranda e adjacências.
Nestes
dias precisei, durante a madrugada, acompanhar minha pequena ao pronto-atendimento
de um conhecido plano de assistência médica e pude ver, a despeito das modernas
instalações e de uma hotelaria digna de grandes centros, as limitações no
tocante ao número de médicos em regime de plantão: apenas um profissional para
atender urgências e emergências, fossem crianças, idosos e adultos (não saberia
dizer se é o mesmo profissional que assiste os pacientes internados e se há
reforço quando a demanda aumenta, como tem acontecido nas semanas posteriores
ao carnaval, até por conta da dengue, influenza e da chamada síndrome viral que
praticamente acometeu todos nós nestes dias).
Minha
Companheira, que foi muito bem atendida no Pronto-Socorro Municipal no final de
semana passado, também viveu o congestionamento dessa instituição e o evidente
esgotamento físico dos profissionais de plantão. Isso, aliás, levou à chamada
em caráter de urgência de reforço de mais um médico, provavelmente o próprio
titular da Secretaria Municipal de Saúde. Leve-se em conta que isso vem
ocorrendo atualmente, quando não houve -- pelo menos por enquanto (e esperamos
que continue assim por muito tempo) -- qualquer registro de alguma pessoa com o
COVID 19.
Pela
experiência demonstrada em países com mais recursos tecnológicos e operacionais
na área de saúde, sabe-se que pelas características das pessoas acometidas pela
pandemia, cuja origem algum dia será revelada e haverá de causar surpresa a
todos, o número de leitos para o isolamento de pessoas atingidas pelo COVID 19
e, a depender da faixa etária e da existência de comorbidade, sobretudo, do
número de leitos de terapia intensiva (CTI) deverá ser aumentado, e isso
precisa ser feito com a maior brevidade possível, sob pena de cairmos no cruel
sorteio dos “mais urgentes” em detrimento dos preteridos por razões óbvias, a
falta de leitos ou equipamentos adequados.
Ante
essa realidade insofismável é prudente, de modo a evitar a verdadeira explosão
de casos de acometidos pela infecção como na Itália e Espanha (para citar
países europeus que a mídia noticia mais), que as autoridades setoriais de Educação
avaliem a possibilidade de suspender temporária e previdentemente as atividades
letivas, apresentando algumas ações de apoio a serem realizadas pelos pais ou
responsáveis enquanto as aulas não são retomadas em segurança sanitária para o
público escolar. Num contexto como este em que nos encontramos, é fundamental a
participação, sim, das autoridades sanitárias locais e inclusive dos
Ministérios Públicos Estadual e da União.
Como,
em sã consciência, autoridades locais, estaduais e federais, cientes da
precariedade do sistema de saúde, prejudicado ainda mais pelos cortes
promovidos a partir de 2017 (Lei do Teto dos Gastos Públicos e cortes
impensados pelo atual governo federal e seguido pelas instâncias municipal e
estadual), se aventuram a um improviso -- ou, na melhor das hipóteses, a uma
liberalidade -- em que vidas estão em jogo explicitamente?
Portanto,
não basta lavar as mãos (em todas as acepções), é preciso conter as possibilidades
reais de contaminação por meio de concentração de pessoas de todas as faixas
etárias e em todos os setores (educacional, esportivo, cultural, turístico,
comercial, de lazer, trabalho etc). Mais que estratégia, trata-se de assegurar
qualidade de assistência médica e vida à população, já aviltada em uma série de
direitos surrupiados em nome de uma modernidade que há décadas não deu certo, e
que atende pelo nefasto nome de globalização.
Ahmad
Schabib Hany
2 comentários:
Bravo!!
Séria, responsável e importante reflexão!!
Parabéns!!
Marcelo Gotardi
Boa tarde, Professor Marcelo Gotardi, e obrigado pelo comentário.
Trata-se, antes de tudo, de um ato de preservação dos dois extremos de nossa população: as crianças (sobretudo aquelas bem novas, que ainda não têm condições de se proteger desse tipo de contágio) e os/as idosos/as (na verdade, o segmento mais vulnerável segundo os cientistas que puderam acompanhar a evolução original da pandemia, ainda em território asiático).
Grande abraço, recomendações à Família e, na medida do possível, nos dê o ar da graça...
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