sexta-feira, 24 de maio de 2019

PARA UMA JOVEM CINEASTA (Luiz Taques)

Filme rodado em Campo Grande ganha crítica do escritor Luiz Taques

Do portal de cultura ENSAIO GERAL (Campo Grande, MS), disponível em: <http://ensaiogeral.com.br/noticias/criticas/filme_rodado_em_campo_grande_ganha_critica_do_escritor_luiz_taques>.


Edilson Silva e Maria Eny: atores que interpretam os irmãos Wagner e Luana.

PARA UMA JOVEM CINEASTA
Por Luiz Taques
O título do filme, “De tanto olhar o céu gastei meus olhos”, de Nathália Tereza, é poético.
E o roteiro não deixa de ser um soco artístico brasileiro, seco e direto, na fuça daquele espectador dissimulado, ao abordar com maestria um tema espinhoso: a separação dos pais.
Sim, sim, sim: casais se separam todos os dias.
Então, para escapar dessa aparente banalidade cotidiana, ela resolveu se aprofundar um pouco mais no assunto e falar do sumiço duradouro do pai.
Do seu abandono.
Ao entrar nessa delicada situação, que, na vida real, atinge milhões de crianças e adolescentes país e mundo afora, a jovem cineasta recorreu à ficção. Jogou-se nela de corpo e alma. Jogou-se, como se estivesse pulando para nadar, para nadar contra a correnteza, bem lá no talvegue do caudaloso rio Paraguai, em pleno Pantanal de Corumbá. Para realizar tal proeza, não era apenas necessário saber nadar. Era preciso não perder a noção de como estava nadando e qual rumo tomaria, para não correr o risco de se atrapalhar, perder a linha imaginária do rio, bater braços e pernas em vão, afogar-se e aí afundar.
Em “De tanto olhar o céu gastei meus olhos”, o pai afasta-se da esposa e dos filhos Luana e Wagner. Os motivos não são revelados. Subentende-se que o pai já estava em outra, constituíra nova família. O filme o mostra morando numa casa confortável – os filhos e a ex, em apartamento de residencial modesto.
A filha Luana já é mãe. É mãe solteira. O seu menino dormindo no colchão, no colchão estendido no chão do quarto. No mesmo quarto em que Luana e Wagner dormem. Os dois dormem em beliche – Wagner, na parte de cima. Wagner trabalha como mototaxista.
Certo dia, Luana recebe carta do pai, buscando reaproximação.
Wagner fica tentado a se encontrar com o pai; Luana, não pensa nessa possibilidade.
Os diálogos do filme giram mais em torno de Wagner e de Luana.
É Luana quem fala “é claro que não; você está doido a mãe ver uma coisa dessa”, quando diz ao irmão que não iria mostrar à mãe a carta que recebeu do pai.
Ao personagem Wagner, coube assegurar que o pai jamais pagou pensão alimentícia.
Não se vê, no filme, reclamação da mãe quanto a isso – tampouco, a versão do ex-marido. Luana é inflexível: não acredita nas boas intenções do pai.
Nathália Tereza abordou um lado da história.
Do seu script, porém, não saiu algo rasteiro, vingativo.
Pelo contrário: mostrou, em “De tanto olhar o céu gastei meus olhos”, o drama da separação, pela ótica da família que se sentira mais prejudicada. Família a qual, ao término do filme, a gente se junta e da qual se torna cúmplice, para acarinhar Luana e Wagner. Principalmente, compreender a carência afetiva paterna de Wagner que, a certa altura do filme, diz: – Não tenho lembrança nenhuma dele.
“De tanto olhar o céu gastei meus olhos” foi rodado em 2017.
No entanto, quase que por acaso, ontem é que tomei conhecimento do filme, ao acessar o site Porta Curtas.
Foi uma pena que, somente agora, eu tenha descoberto esse interessante filme. Mas, como arte de boa qualidade de modo algum perde a validade, a obra de Nathália Tereza continua mais atual do que nunca.
O abraço do pai ausente na cintura do filho que o diga.
Ainda que esse abraço tenha ocorrido na garupa de uma moto.
O olhar do filho nas mãos entrelaçadas do pai reconforta.
Isso é cinema.
Emociona.
Luiz Taques é escritor. Autor, entre outros livros, da novela “MULAS” (editora Kan/ 2019). Nasceu em Corumbá, mas mora em Londrina, PR.
SERVIÇO
Diretora: Nathália Tereza.
Elenco: Edilson Silva, Maria Eny.
Duração: 25 min.
Local de Produção: Campo Grande, MS.
Cor: Colorido.
Produção: Dora Amorim, Nathália Tereza, Thaís Vidal.
Fotografia: Eduardo Azevedo.
Roteiro: Nathália Tereza.
Edição: Nathália Tereza.
Som Direto: Lucas Maffini.
Direção de Arte: Maíra Espíndola.
Edição de som: Tiago Belo.
Direção de produção: Ana Paula Málaga.
Produção Executiva: Dora Amorim e Thaís Vida.
O filme pode ser assistido pelo endereço eletrônico: http://portacurtas.org.br/filme/?name=de_tanto_olhar_o_ceu_gastei_meus_olhos

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