VILLAS-BÔAS CORRÊA, O JORNALISTA QUE DESMASCAROU O REGIME DE 1964
Luiz Antônio Villas-Bôas
Corrêa. Por esse nome quase alexandrino pouquíssimos talvez o relacionem às
mais de seis décadas de cobertura altiva, nada servil, da bizarra cena política
daquela que já foi, por duas vezes, a maior democracia do planeta – não por
acaso, durante a vigência, plena e sem mutilações, das Constituições de 1946 e
de 1988.
Sua estreia no Jornalismo se
deu por pura necessidade, quase por acaso. Bacharel em Direito, funcionário público
federal, casado e pai recente, Villas-Bôas Corrêa contou com a ajuda do sogro,
jornalista aposentado, que o apresentou ao diretor do diário carioca A Noticia. Logo no primeiro dia, mal
aprendera a datilografar (em seu tempo, estudante de Direito não usava máquina
de escrever na prática jurídica, ainda que tivesse sido, como ele, destacado
dirigente de seu centro acadêmico), foi para a rua, pois é onde a historia, a
vida, acontece, e lá flagrou um ato de extorsão pra cima de um camelô: depois
de tomar nota de detalhes do flagrante, levou a vítima a um alto funcionário,
que acolheu a denuncia, e logo o caso ganhou as manchetes da capital federal, e
ele o emprego de repórter político – tendo sido pioneiro na especialidade e o
mais longevo de todos.
O Jornalista Villas-Bôas
Corrêa, ao lado de Carlos Castello Branco e Carlos Chagas, desvelou com apurado
tirocínio e rara elegância os intramuros palacianos para o(a)s ávido(a)s
leitore(a)s das paginas políticas do Jornal
do Brasil e de O Estado de S. Paulo,
e a partir de 1976 da Istoé, enquanto
Mino Carta esteve à frente daquela revista. Não por alguma troca de favores
(até porque tanto Villas-Bôas quanto Mino nunca foram adeptos do toma-lá-dá-cá),
mas como Pai reconhecido de Marcos Sá Correa, grande revelação da Veja sob a direção de Mino (1968 – 1976),
esse que foi um dos maiores analistas políticos de todos os tempos sempre fez questão
de respeitar o maior criador de meios jornalísticos inovadores que o Brasil
conheceu.
Poucos, também, se recordam,
mas foi Villas-Bôas, nas paginas da Istoé
de Mino, que tornou pública a fraude acobertada por uma década pelo triunvirato
que golpeou o marechal Arthur da Costa e Silva, de que o Ato Institucional nº 5
(o nefasto AI-5) não era de autoria do marechal: outro Luiz Antônio, da Gama e
Silva, professor de Direito Constitucional e poderosíssimo ministro da Justiça
da linha dura, valeu-se do discurso inflamado do Deputado Marcio Moreira Alves
em setembro de 1968, e com a não autorização do plenário da Câmara Federal para
processá-lo, na noite de 13 de dezembro de 1968, quando era proclamada a fase
obscurantista e sanguinária do regime, o último marechal na presidência da República
não passava de reles figurante, um verdadeiro refém do grupo que o guindou ao mais
alto cargo, e que menos de um ano o destituiria, inconsciente, no mais acintoso
ardil.
Pai denodado, Villas-Bôas
decidiu encerrar abruptamente sua talentosa carreira depois que seu dileto
filho e colega Marcos Sá Corrêa não conseguiu se restabelecer de um acidente doméstico
que o fez interromper uma também brilhante carreira jornalística. Apesar da
dor, Villas-Bôas escreveu com a peculiar elegância a mensagem de agradecimento
(e despedida), publicada originalmente em 2011, que postamos / colamos como
homenagem póstuma.
Num tempo em que
mediocridades servis a interesses inconfessáveis se revezam nos grandes meios
de conspiração (e não de comunicação), com a cínica finalidade de desinformar e
justificar o injustificável, analistas e repórteres com o caráter e o talento
de Villas-Bôas Corrêa fazem muita falta. Que ele, ao lado do também saudoso Carlos
Castello Branco, inspire as novas gerações nessa incansável missão: de olho no
poder, mas com a distância necessária para não servir a ele, nem se servir dele.
Ahmad Schabib Hany
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