Professor
Nivaldo, humildade a toda prova
O Professor Nivaldo Ferreira da
Silva se eterniza eclipsado por lideranças ensimesmadas, muitas delas
narcisistas, quando deveria ter sido referência de humildade e retidão para aqueles
que amam de verdade Ladário e seu povo, de angústias e esperanças mil.
A eternização do primeiro prefeito eleito pelo
voto direto de Ladário, Professor Nivaldo Ferreira da Silva, deixa um vazio
irreparável na cidadania, como mestre incansável, ser humano humilde e cidadão
exemplar. Leal filiado à Oposição, representado na época pelo MDB (Movimento
Democrático Brasileiro), durante todo o regime de 1964 fez da política um
bastião de resistência ao arbítrio e opressão que vigiam totalitariamente nos
anos de chumbo.
Tive a honra de conhecer o Professor Nivaldo
durante o processo de implantação do PMDB, em 1980, quando ele solitária e
corajosamente enfrentava em Ladário o campeão de votos da Oposição, Deputado
Cecílio de Jesus Gaeta, ao lado de, em Corumbá, Dona Eva Granha de Carvalho, Rubens
Galharte, Joilce Araújo, Rômulo do Amaral, José de Oliveira, Jonas Ribeiro e
Beatriz Viegas de Araújo, que mais tarde optaram fundar o Partido dos
Trabalhadores (PT) ou o Partido Democrático Trabalhista (PDT), de acordo com as
suas convicções políticas.
Nas décadas de 1970 e 1980, o então jovem vereador
Nivaldo Ferreira expressou a vontade do eleitorado de Ladário, majoritariamente
contrário ao casuísmo praticado pelo governo federal, em plena vigência do
regime de 1964. Porta-voz de um coletivo altivo e atuante, a despeito da
censura e da falta de liberdades democráticas, soube, inteligente, leal e
prudentemente, enfrentar os cães ferozes da ditadura à espreita da legítima
inquietude da civilidade cidadã.
Diferentemente do que circulou nos dias que se
seguiram à sua repentina eternização (e corretamente registrado pelo Correio de Corumbá), em meio a uma
injusta e perversa invisibilidade por décadas, o Professor Nivaldo foi eleito
pelo PMDB (sucedâneo do MDB histórico) no primeiro ano da Nova República
prefeito de sua amada Ladário, em novembro de 1985, quando em Corumbá era
eleito, também pelo PMDB, o Doutor Hugo Silva da Costa -- dois dirigentes municipais
que fizeram história, cada qual com suas convicções, não só por terem sido os
primeiros a serem eleitos pelo voto direto, depois de vinte anos de cerceamento,
em nome de um instituto chamado ‘Segurança Nacional’, mas pela retidão e
compromisso com as liberdades democráticas.
A última eleição municipal anterior ao pleito pelo
sufrágio popular ocorrera em 1966, mas sob severas restrições, pois, com a cassação
política dos adversários e a edição do Ato Institucional nº 2, os partidos até
então existentes no Brasil (PTB, PSD, UDN, PSP, PDC etc) haviam sido extintos e
criados por ato do então chefe do Executivo, sob a égide de um regime de exceção,
a ARENA (Aliança Renovadora Nacional) e o MDB, que na região tinha como líderes
Cecílio Gaeta e Rômulo do Amaral, cuja virtual eleição a prefeito de Corumbá
fora garfada por meio de um flagrante ato lesivo à vontade popular, quando uma
seção eleitoral da área rural foi fraudada depois de uma inusitada, senão
curiosa (por desarranjo intestinal), retirada de combate dos fiscais
emedebistas da urna, em que ‘sumiram’ os votos ao candidato do MDB, e perdeu a
eleição por ínfima diferença de votos, conforme ação judicial peticionada por
Amaral junto ao TRE/MT, ganha dias antes do fim do período administrativo de
seu oponente e, sob censura, a imprensa sequer repercutiu o fato.
Esse importante registro histórico foi feito, com
base em farta documentação da Justiça Eleitoral e do acervo de A Luta Mato-Grossense, pelo Professor
Valmir Batista Corrêa em artigo intitulado “Um caso de corrupção eleitoral em
Corumbá”, no Jornal da Cidade (6 set.
2015). Embora cosmopolita e celeiro de iluminados expoentes das artes, da
cultura e da política, a nossa região desde tempos pretéritos está exposta à
voragem de falsos ‘messias’, muitos dos quais alardeando seu amor suspeito, ‘desde
criancinha’, pelo povo do Pantanal ou por um dos torrões pantaneiros. E, a bem
da verdade, essa sina se acentuou depois da divisão de Mato Grosso uno.
O próprio Professor Nivaldo Ferreira da Silva
também foi vítima dessa injustiça. Durante décadas, mesmo depois de ter
realizado uma administração benfazeja e pródiga, amargou um deliberado
ostracismo por conta da deslealdade de muitos que se beneficiaram de sua
trajetória política, mas preferiram se deixar levar pelo canto das sereias. No
entanto, ele não se deixou levar pela mágoa ou qualquer sentimento menor,
tendo-se dedicado de corpo e alma ao sagrado ofício de Professor, que
desempenhou com honradez e talento até o último dia de trabalho. O querido
Professor João de Souza Alvarez, com quem, por alguns anos, conviveu na Escola
Leme do Prado, confidenciara-me meses atrás sobre a cordura e companheirismo
desse grande ser humano.
Durante a pandemia de covid-19, num breve encontro
com o querido Psicólogo Juvenal Ávila de Oliveira, lembrávamos do período em
que o Professor Nivaldo era prefeito de Ladário e de seu empenho pelo
assentamento, em condições dignas, das famílias que ocupavam a área daquilo que
consumira vultuosos recursos públicos para a construção do famigerado Pôlder de
Ladário para o cultivo de arroz irrigado e que ficou então conhecida por
Codrasa (sigla da empresa que deveria ter executado o milionário projeto
inacabado, Companhia de Dragagem S/A). Graças à luta da incansável e saudosa
querida Julinha do PT, a imortal Júlia González, e à gestão do Professor José
Antônio Assad e Faria no governo da Presidenta Dilma Rousseff, a Codrasa hoje
tem um nome e um destino à altura, Área de Proteção Ambiental, ou APA, Baía
Negra.
Em meu derradeiro e providencial encontro com o
Professor Nivaldo, há pouco mais de três meses, no entorno do Sexto Distrito
Naval de Ladário, ao acompanhar meu Amigo-Irmão Luiz Taques à Pérola do Pantanal,
pude constatar a firmeza de caráter e consciência tranquila do Professor
Nivaldo Ferreira da Silva, sempre focado no presente e de bem com a Vida.
Contara-me da alegria de sua Companheira de implantar uma conveniência nas
imediações do campus do Instituto Federal de Mato Grosso do Sul (IFMS), onde
ficamos de nos voltar a ver, mas a Vida, imponderável como a História, se
encarregou de postergar indefinidamente esse reencontro.
Que a Cidadania ladarense, oportuna e
meritoriamente, denomine algum logradouro público central com o nome do honrado
Professor Nivaldo Ferreira da Silva, de modo a perenizar o inestimável legado
material e imaterial desse grande ladarense, incansável combatente e exemplar
democrata que seus contemporâneos, lamentável e injustamente, preteriram, a
despeito de seus incontáveis e eloquentes atos de lealdade e honradez. Sou
grato, muito grato à Vida, por ter tido a honra e o privilégio de conhecê-lo
pessoalmente.
Ahmad
Schabib Hany
Nenhum comentário:
Postar um comentário