quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Como uma universidade pode mudar o curso da história de uma região - Helvio Rech


 
Como uma universidade pode mudar o curso da história de uma região

Começo com uma breve história para ilustrar como ações aparentemente localizadas podem gerar transformações profundas em diversas esferas da sociedade, incluindo cultura, economia e meio ambiente. Esse é exatamente o caso da UFPantanal. Um exemplo inspirador é a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), cuja presença impulsionou o desenvolvimento de Dourados e de toda a região ao seu redor. Da mesma forma, a criação da UFPantanal tem o potencial de impactar não apenas Corumbá e Ladário, mas toda a região de fronteira e o Pantanal como um todo.

Em 1995, um pequeno grupo de 14 lobos foi reintroduzido no Parque Nacional de Yellowstone, nos Estados Unidos, após mais de 70 anos de ausência devido à caça e ao extermínio sistemático que os erradicou da região na década de 1920. O que ninguém poderia prever é que essa reintrodução causaria uma verdadeira revolução no ecossistema. Os lobos não apenas transformaram profundamente o ambiente natural, mas também alteraram a geografia do parque, demonstrando o impacto extraordinário de uma única ação sobre todo um sistema.

Os lobos estiveram ausentes da região por 70 anos devido à caça e ao extermínio. Durante essas décadas, o número de cervos cresceu de forma descontrolada, resultando na devastação de grandes áreas vegetativas do parque. Árvores e arbustos desapareceram, e a biodiversidade da região foi significativamente reduzida. O impacto foi tão severo que não apenas o ecossistema sofreu, mas até o curso dos rios do parque foi alterado devido à erosão acentuada.

Com a reintrodução dos lobos, mesmo em pequena quantidade, os efeitos são percebidos quase imediatamente. Os cervos, ao evitar regiões onde poderiam ser presas simples, permitiram que áreas antes degradadas se regenerassem. As árvores cresceram novamente, a vegetação rasteira ficou mais densa, e o parque gradualmente retomou sua vitalidade. Essa regeneração atraiu castores, que construíram diques e novos habitats de sucesso. Em pouco tempo, lontras, ratos, patos, peixes, anfíbios e aves reapareceram, criando um ciclo virtuoso de biodiversidade. Além da redução no número de cervos, os lobos ajudaram a controlar a população de coiotes, permitindo o retorno de pequenos mamíferos, como coelhos e camundongos, que, por sua vez, atraíram predadores como corujas, águias e raposas. Ursos também retornaram à região, atraídos pelo aumento da oferta de alimentos, como peixes e bagos, disponíveis em ambientes revitalizados.

As mudanças foram além. Mais piscinas naturais se formaram, cascatas surgiram, e todas as mudanças foram ótimas para aquele habitat selvagem. As águas mudaram e se adaptaram em resposta aos lobos, e a razão foi que a regeneração da floresta estabilizou os rios, fixando-os em seus cursos. Assim, os lobos não apenas transformaram o ecossistema do Parque Nacional de Yellowstone, mas também influenciaram diretamente sua geografia.

Quero usar essa pequena história para ilustrar como ações aparentemente localizadas podem desencadear transformações profundas em diferentes esferas da sociedade, como cultura, economia, meio ambiente e outras. A criação de uma nova universidade é um exemplo claro de como uma decisão estratégica pode gerar repercussões amplas e estruturantes. Mais que uma medida para corrigir desigualdades regionais, esta iniciativa tem o potencial de redefinir a relação entre conhecimento, inovação e sustentabilidade, tornando-se um motor de crescimento econômico, um farol de inclusão social e uma resposta eficaz aos desafios do século XXI. Ao reunir ensino, pesquisa e extensão em um bioma de importância global como o Pantanal, esta universidade não apenas preencherá lacunas históricas no acesso à educação de qualidade, mas também promoverá iniciativas de preservação ambiental, fortalecerá a economia local e promoverá a integração latino-americana, ampliando seus impactos muito além de sua região de origem.

Como motor econômico, a universidade será uma grande empregadora e centro de formação de profissionais, estimulando a economia local e regional. Sua atuação influenciará investimentos em setores estratégicos, como turismo sustentável, biotecnologia e energias renováveis, com impacto direto no desenvolvimento regional. Projetos de infraestrutura, como a construção de campus universitário moderno, bibliotecas, laboratórios e espaços culturais, revitalizarão cidades e regiões adjacentes, promovendo práticas de sustentabilidade e remodelando o território com uma identidade renovada.

Uma nova universidade também desempenhará um papel essencial na atração e retenção de talentos. Professores, pesquisadores e estudantes de diferentes partes do Brasil e do mundo trarão diversidade intelectual e cultural para a região, promovendo uma troca de conhecimentos e fortalecendo a posição da região como um centro de inovação e aprendizado. Além disso, ela se conectará a redes globais de conhecimento, estabelecendo parcerias internacionais, programas de mobilidade acadêmica e colaborações científicas que ampliarão a presença do Brasil no cenário internacional.

Como um centro de pesquisa e extensão, a universidade estará voltada para os desafios sociais e ambientais contemporâneos. Ela produzirá evidências robustas para desenvolver políticas públicas inovadoras e desenvolverá soluções sustentáveis ​​para problemas como mudanças climáticas, conservação da biodiversidade, inclusão social e desenvolvimento sustentável. Além disso, será um espaço de integração entre ciência e sociedade, contribuindo diretamente para o progresso da região e a qualidade de vida das comunidades locais.

A criação de uma terceira universidade federal em Mato Grosso do Sul não é apenas uma necessidade local, mas uma oportunidade de transformar a região do Pantanal em um modelo de desenvolvimento sustentável e integração global. Esse passo representará um marco histórico na promoção da igualdade educacional e no fortalecimento da posição do Brasil como líder em inovação, sustentabilidade e inclusão social. Unidos, podemos transformar essa visão em realidade e deixar um legado duradouro para as futuras gerações.

Assim, a UFPantanal terá um papel fundamental em pelo menos cinco dimensões estratégicas, consolidando-se como um exemplo de como a educação superior pode transformar não apenas uma região, mas também contribuir para o progresso de todo o país, posicionando Mato Grosso do Sul em um patamar de maior igualdade com outros estados que já colheram os frutos de investimentos robustos na educação pública.

1.      Um motor econômico para a região

As universidades são motores econômicos poderosos, e a UFPantanal não será diferente. Como grande empregadora e centro de formação profissional, a universidade estimulará a economia local e regional ao gerar empregos diretos e indiretos, desde funções acadêmicas até serviços e infraestrutura de apoio. Além disso, suas parcerias com o setor público e privado impulsionarão indústrias estratégicas, como turismo sustentável, biotecnologia e energias renováveis. Exemplo disso pode ser observado em experiências internacionais, como as universidades de Londres, que contribuíram com bilhões de libras e dezenas de milhares de empregos para a cidade. Resguardadas as proporções, a UFPantanal terá impacto semelhante no Pantanal, integrando inovação e crescimento econômico.

2.      Transformação urbana e regional

A UFPantanal será um agente de transformação urbana e regional. Projetos de infraestrutura como a construção do campus, laboratórios, bibliotecas e espaços culturais e esportivos revitalizarão Corumbá e cidades vizinhas. Além disso, a universidade incentivará práticas de sustentabilidade, remodelando o território com uma identidade cívica renovada e incentivando o uso de espaços abertos à comunidade. Essa transformação tornará o Pantanal um modelo de convivência harmoniosa entre o ambiente urbano e o natural.

3.      Atração e retenção de talentos

A UFPantanal terá a capacidade de atrair talentos nacionais e internacionais. Professores, pesquisadores e estudantes vindos de diversas partes do Brasil e do mundo contribuirão para a diversidade intelectual e cultural da região. Este movimento trará uma nova dinâmica à vida social e econômica local, incentivando a troca de conhecimentos e fortalecendo a reputação de Mato Grosso do Sul como um centro de inovação e aprendizado.

4.      Conexões e diplomacia internacional

A UFPantanal será mais que uma universidade local; será um ponto de integração latino-americana e de construção de relações internacionais. Parcerias com instituições estrangeiras, programas de mobilidade acadêmica e colaborações científicas globais ampliarão a presença do Brasil no cenário internacional, promovendo o Pantanal como patrimônio da humanidade. A universidade será espaço de “diplomacia suave”, formando lideranças globais e conectando o Pantanal às principais redes de conhecimento do mundo.

5.      Resposta aos desafios sociais e ambientais

A UFPantanal será centro de pesquisa e extensão voltado para enfrentar desafios sociais e ambientais. Questões como mudanças climáticas, conservação da biodiversidade, inclusão social e desenvolvimento sustentável estarão no cerne de suas atividades. A universidade, ao produzir evidências robustas, apoiará políticas públicas inovadoras e fortalecerá as comunidades locais, promovendo soluções sustentáveis e duradouras.

A criação da UFPantanal não é apenas um passo no avanço da educação superior no Brasil, mas um movimento estratégico para transformar a região do Pantanal em um modelo de desenvolvimento sustentável e integração global. Unidos, podemos fazer da UFPantanal um marco histórico e um legado de progresso para as próximas gerações.

Hélvio Rech

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