domingo, 29 de setembro de 2024

NETANYAHU COMETE SUICÍDIO AO ASSASSINAR NASRALLAH

Netanyahu comete suicídio ao assassinar Nasrallah

O assassinato de Sayad Hassan Nasrallah, secretário-geral do Hezbollah, por ordem do Carniceiro de Gaza (e de Beirute), retira um líder e interlocutor leal e ético no intrincado cenário político do Mundo Árabe. Agora o ocidente entra num ‘buraco negro’ que inviabiliza sua própria presença na região.

No dia em que a eternização do maior estadista do Mundo Árabe, Gamal Abdel Nasser, fez 54 anos (em 28 de setembro de 1970), vem à tona o assassinato, pelos sionistas, de Sayad Hassan Nasrallah, líder do Eixo da Resistência ao extermínio palestino e à dominação do Oriente Médio e depois aos demais países árabes e aos países muçulmanos pelos sionistas e seus cúmplices na cobiça e rapinagem dos territórios e das riquezas da região.

Coincidência ou não -- afinal, quando Nasser saiu da cena política, o ente sionista era o motivo das reuniões coordenadas pelo líder árabe, pela repressão e morte de refugiados palestinos por tropas de Hussein da Jordânia, colaborador sionista e aliado incondicional do ocidente --, a eliminação de Nasrallah tem impacto similar no âmago da resistência e do apoio popular entre árabes, muçulmanos e demais povos oprimidos do Planeta.

Voltando na História, três anos após a morte de Nasser, na guerra chamada pelo ocidente de ‘Yom Kipur’, feriado judaico, em que o sucessor de Nasser, Anwar Sadat, planejou e quase venceu os sionistas em 7 outubro de 1973, mas, inexplicavelmente, deu ordem de cessar-fogo quando os exércitos do Egito, Síria e Iraque estavam nas imediações de Telavive e o contra-ataque dos generais de Golda Meir sequer havia sido esboçado. Mérito do sionista recém-sepultado Henry Kissinger, já secretário de Estado de Richard Nixon, que acordou com Sadat essa parada injustificada.

Não é novo esse modus operandi sionista, de eliminar inimigos que ameaçam seus nada éticos interesses. Em 1975, quando Sadat se revelou ‘quinta coluna’ para os árabes, o rei Faisal da Arábia Saudita, embora tivesse conflitos com seu antecessor, Nasser, tinha fama entre os árabes autênticos de ser patriota e rigorosamente islâmico, tanto que, dias depois do funeral do maior estadista árabe em meio milênio, prometeu ‘ir rezar na Mesquita Al-Aqsa’, em Jerusalém, dando a entender de que a Palestina seria retomada pelos árabes com a participação dele. Essa mudança de postura e, sobretudo, a declaração de retomar Jerusalém para os palestinos lhe custou a vida em um atentado em seu palácio envolvendo um sobrinho químico-dependente residente nos Estados Unidos.

Atribuem a Joe Biden, atual presidente estadunidense, que se não tivesse existido o Estado sionista ‘teriam que inventar um’ para atender seus nada honestos interesses. Desde que esse mostrengo foi criado como enclave do império maldito no coração do Mundo Árabe, muitas vidas foram sacrificadas, todas por meio de crimes hediondos: seja por massacres horríveis (Deir Yassin, Sabra e Chatila etc) ou por meio de ‘assassinatos preventivos’, como o que eliminou vários líderes palestinos (Abdel Kader Al-Husseini, líder palestino anterior à OLP, morto quando retornara às pressas de uma viagem a Damasco para obter armas à altura das usadas pelos sionistas, que haviam atacado a aldeia Al-Qastal, em abril de 1948, a quarenta dias da declaração de ‘independência’ do ente sionista, em maio do mesmo ano; Ghassan Khanafani, morto em Beirute em atentado terrorista do Mossad em julho de 1972; Khalil Al-Wazir, ou ‘Abu Jihad’, destacado dirigente militar palestino, morto em abril de 1988, em Túnis, Tunísia, em atentado do Mossad em sua própria casa etc).

Décadas depois, essa mesma tática é utilizada pelo sionista extremista que por onde passa exala enxofre, tanto que expressivo número de delegações presentes à Assembleia-Geral da ONU abandonou o plenário enquanto ele grunhia como suíno desesperado rumo ao abate. O Carniceiro de Gaza e de Beirute tem agido com desespero por razões pessoais desde antes do 7 de outubro de 2023: se ele para o genocídio vai preso por uma série de crimes cometidos, inclusive contra o Estado sionista. Criminoso como o inominável daqui e o agente laranja dos Estados Unidos, todos negacionistas e membros do nazissionismo.

Embora já tivesse sido advertido por assessores e aliados dos Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia, ele faz questão de correr o risco de cometer suicídio político e pessoal: enquanto era vaiado no plenário da sede da ONU, deu ordem de matar o secretário-geral Hassan Nasrallah, do Hezbollah, numa operação ilegal e desumana, em região densamente povoada de Beirute. Jornalistas independentes, um dia depois, revelaram que não foram 15, mas 80 bombas de alto poder destrutivo, das mais modernas (e caras) produzidas pelos Estados Unidos, cuja esquadrilha de supersônicos de um de seus porta-aviões baseado no Mar Mediterrâneo permaneceu por duas horas na costa mediterrânea de Beirute, como a dar cobertura e abortar possíveis operações de defesa do Eixo da Resistência.

Não satisfeitos, os sionistas invadiram o sistema de comunicação da torre de controle aéreo do Aeroporto Internacional Rafiq Hariri, em Beirute, para impedir a aterrissagem de um avião de passageiros iraniano, sob pena de explodir a aeronave ou bombardear o aeroporto. No dia seguinte ao assassinato do líder do Hezbollah e de seus principais assessores militares no bunker em que estavam, sob a sede do quartel-general da organização de resistência, os sionistas deram continuidade aos bombardeios em diversas regiões do Líbano, da Síria e do Iraque, numa demonstração de que controlam boa parte do território do Eixo da Resistência e já enviaram mensagem com ameaças explícitas ao governo do Irã, proibindo o abastecimento de armas e combustíveis à Resistência árabe.

As armas usadas pelos sionistas são, em sua maioria, fabricadas nos Estados Unidos e Reino Unido, que não deixam de abastecer o ente sionista a despeito das restrições estabelecidas pelo organismo multilateral por meio de resoluções aprovadas há pouco tempo. A proteção acintosa ao governo sionista, inclusive no Conselho de Segurança da ONU, também vem desses países, aliás, desde os tempos em que a ONU, sem consultar o povo palestino, os maiores interessados, criou o Estado sionista. Ante tamanha impunidade, esse monstrengo sionista pode ameaçar e violar convenções e resoluções internacionais, mas o Irã e demais aliados do Eixo da Resistência jamais poderão se manifestar. Só que não.

Desde a sua criação, fruto da mentira deslavada e da falta de lealdade dos colonizadores, hoje impostores de democráticos, o Estado sionista manipula informações e controla a bel prazer o fluxo de informações, como se detivesse uma força superior. A bem da verdade, eles têm, sim, o poder financeiro -- tanto que foi o lorde Rothschild V, banqueiro judeu bilionário, que ‘comprou’ a Palestina de ‘sua majestade’ a Rainha Vitória, em 1917, como a ‘Declaração Balfour’ constata: o então chanceler britânico se comprometia a entregar a Palestina aos sionistas em troca de um empréstimo para que o Reino Unido continuasse os combates na Primeira Guerra Mundial, a despeito do compromisso da rainha Vitória aos líderes árabes, que em troca do compromisso de conferir a independência de toda a Arábia os ‘múftis’ árabes se comprometiam a lutar com os britânicos e contra os turco-otomanos.

São mais de 1.300 mortos (incluindo bebês, crianças, adolescentes, jovens, mulheres e idosos), um número desconhecido de desaparecidos nos escombros e 15 mil feridos em menos de duas semanas de ataques, inicialmente por meio de atentados terroristas (com os dispositivos eletrônicos ‘envenenados’) e depois por uma intensa operação militar aérea -- desproporcional e criminosa -- dentro do perímetro urbano da capital do Líbano, região, aliás, com a maior densidade demográfica depois de Gaza, destruída totalmente. E o que disseram os hipócritas e cínicos ‘líderes’ ocidentais? Simplesmente justificaram a obsessão assassina desse maldito ser cujos cúmplices haverão de ser igualmente condenados, pelo menos pela história, como Herodes, Pilatos, Anás e Caifás.

Perda de um interlocutor leal

A súbita saída de cena de Nasrallah, além de duro golpe para o Eixo da Resistência à dominação sionista-colonial e para os milhões de admiradores pelo mundo afora -- inclusive no ocidente e até no ente sionista, pela racionalidade, lealdade e ética na relação com aliados, adversários e inimigos --, representa a perda de um interlocutor que não fazia bravatas e que honrava eticamente compromissos celebrados até, mediante acordos internacionais, com seus inimigos.

Ele era o oposto da falta de caráter e tibieza ética de Netanyahu, seu assassino, com a cumplicidade dos governos dos Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia, além de títeres como os inomináveis daqui e da Argentina. Ao contrário dos ‘democratas’ de meia pataca deste ocidente nauseabundo, durante o genocídio em curso ele deteve seus aliados e outros parceiros do Mundo Árabe desejosos de uma contraofensiva direta ao ente sionista e seus aliados no ocidente. Ele era praticante da paciência estratégica.

Nesse sentido, a eliminação desse líder bastante racional, inteligente e, sobretudo, ético até as últimas consequências -- a poucos metros de onde estava quando foi ferido de morte ele tinha à disposição, segundo fontes do renomado analista internacional Alfredo Khalife, mísseis iranianos de última geração que poderiam ter atingido Telavive mas não quis matar inocentes --, é uma vitória de Pirro para o odiento Carniceiro de Gaza e de Beirute: mais que uma derrota política, pode representar a sua eliminação física a qualquer tempo, afinal, a escolha foi dele.

Abomináveis seres que, sem qualquer comiseração e senso de humanidade, proclamam-se paladinos da democracia e detentores das conquistas da civilização -- quando, a bem da verdade, foram os árabes, hoje tratados como ‘terroristas’ e ‘atrasados’, ofertaram todo o legado da Antiguidade Clássica em bandeja de ouro aos europeus para que saíssem do obscurantismo medieval e assim chegassem à Renascença, bastante tardia se comparada à da Península Ibérica, sobretudo Espanha e sul de Portugal --, é bom que saibam que enquanto houver um árabe e um socialista na face da Terra seus dias estarão contados.

Ahmad Schabib Hany

quinta-feira, 26 de setembro de 2024

UM ANO DE GENOCÍDIO

Um ano de genocídio

Dia 7 de outubro completa-se o primeiro ano de genocídio com cobertura em tempo real da população de Gaza, que se estendeu à Cisjordânia e a Jerusalém, capital milenar da Palestina. Certos da impunidade, os sionistas agora concentram seus odientos esforços contra a população libanesa e já ameaçam a Síria e o Irã como próximos alvos de seu desvario hegemônico-colonial.

Um ano atrás, em 7 de outubro de 2023, o mundo se deparou com mais um cenário de horrores, atribuído de imediato à resistência palestina, precisamente aos combatentes do Hamas e de seus aliados de outras organizações legítimas, chamadas pelo establishment ocidental (leia-se sionista) de ‘terroristas’. Árabes, dentro e fora dos territórios tomados pelos sionistas desde 1947, comemoravam a retaliação do Hamas, que havia burlado toda a parafernália tecnológica conhecida como ‘Domo de Ferro’, até então tida como invicta.

Mantida em absoluto sigilo, a operação ‘Tempestade Al-Aqsa’ consistiu em transpor as muralhas e todo o aparato tecnológico de última geração de um dos maiores e mais corruptos exércitos do planeta, numa afronta à propaganda sionista, de que seria intransponível e inviolável o território usurpado pelos sionistas, a maior parte à revelia da própria ONU que criou esse mostrengo em 1947 e lhe deu reconhecimento como Estado em 1948, mesmo sem ter sido criado o Estado remanescente da Palestina. As ‘armas’ usadas pelos combatentes foram parapente comum, que levou dezenas de guerrilheiros para o ‘outro lado’ das muralhas e, no interior do território contíguo ao de Gaza, fazer o maior número de reféns nas unidades militares instaladas na região, pois eles estavam em um feriado judaico, o ‘Yom Kipur’.

No entanto, as forças sionistas de dentro e fora do território palestino usurpado desde 1947 criaram um cenário de horrores para desviar o foco do vexame histórico sofrido para um grupo de combatentes corajosos mas precariamente armados. Assim, partiram para uma operação desesperada de assassinar com requintes de crueldade seus cidadãos para atribuir a autoria aos guerrilheiros, fato denunciado por autênticos Jornalistas em diversos meios independentes em todo o mundo. O desmentido fez os aliados dos sionistas balançar em seu apoio incondicional ao ente sionista, e tomar mais cuidado com o atual dirigente, um inominável ultradireitista que exala enxofre por onde vai.

Como em 2001, no terrível atentado às Torres Gêmeas, usaram todas as mídias de que dispõem para atribuir à Resistência Palestina o verdadeiro terror praticado contra seus próprios nacionais. E não é primeira vez que essa tática é utilizada pelas chamadas Forças de Defesa [quando na verdade são forças de terrorismo e agressão qualificada, com DNA nazifascista] do Estado sionista: em 2000/2005, durante a invasão ao Líbano, quando as forças da Resistência Libanesa Hezbollah repeliram exemplarmente as forças sionistas, imagens de horror com as mesmas características circularam pelo mundo afora a fim de impingir aos combatentes libaneses essa prática terrorista.

Orquestrados, os líderes políticos do ocidente, uníssona e levianamente, se apressaram a sancionar palestinos, libaneses, sírios, iranianos e iemenitas (os hutis, isto é, militantes do Ansar Allah, seguidores de Hussein Badreddin Al-Houthi, morto pelo exército do Iêmen em 2004). Desde outubro de 2023, ser árabe ou ser solidário à legítima luta do heroico Povo Palestino é objeto de retaliação e de campanhas difamatórias. Até profissionais de longa trajetória, como o Jornalista José Arbex e o Jornalista Breno Altman (de ascendência judaica), já se viram às voltas com acusações de ‘antissemitismo’ e similares, por pura retaliação, para intimidá-los.

Desqualificar profissionais sérios e comprometidos com a ética jornalística é a mais reles das táticas do nazifascismo desde os tempos de seus ídolos inomináveis nos conturbados anos que antecederam a eclosão da Segunda Guerra Mundial, no chamado período entre guerras, de 1918 a 1939. Eles aprimoraram o modus operandi, mas o propósito funesto é o mesmo, de modo a criminalizar, a anular, a dar morte civil a quem ousa atrapalhar seus nada honestos interesses. Durante as ditaduras militares fascistoides da segunda metade do século XX essas mesmas estratagemas foram reeditados sordidamente e não só a dignidade de pessoas de reputação ilibada como a sua própria vida foram ceifadas vil e cinicamente.

Em nome de uma cínica e sórdida ‘defesa’, com contornos inegáveis de guerra de terra arrasada, nos moldes da praticada pelos generais de Hitler e Mussolini antes e durante a Segunda Guerra Mundial, o carniceiro da Palestina (porque Gaza, Cisjordânia e Jerusalém são hoje e serão sempre a Palestina milenar) já matou mais de 137 mil de seres humanos indefesos e inofensivos -- bebês, crianças, adolescentes, mulheres, idosos e mutilados --, além de mais de dez mil desaparecidos, de ter mutilado e ferido sem qualquer lampejo de compaixão dezenas de milhares de palestino e destruído hospitais, escolas, centros de refugiados, mesquitas e igrejas, ambulâncias, depósitos de material de primeiros socorros e sem poupar a infraestrutura urbana (reservatórios de água potável, usinas termelétricas a diesel, redes de telecomunicação e internet, mais urgentes em momentos álgidos como o genocídio).

Em franca decadência, os países autoproclamados ‘democráticos’ -- neocoloniais, na verdade, eis que para estancar sua decadência explícita vivem a cobiçar as reservas de recursos minerais e genéticos de países do Hemisfério Sul --, sem qualquer discrição, comedimento ou comiseração, mostraram sua mais nefasta face e hipotecaram total apoio ao genocídio cometido mais uma vez contra o povo palestino, desta vez na Faixa de Gaza (41km de largura e 10km de comprimento), onde dois milhões e duzentos mil habitantes vivem em uma área equivalente a um quarto da cidade de São Paulo.

O apoio acintoso do governo dos Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia estimulou o governo sionista a expandir suas agressões ao território do Líbano nas últimas semanas. Iniciadas com explosões simultâneas de dispositivos eletrônicos ‘envenenados’ do tipo ‘pagers’ e ‘walkie-talkies’, nos dias 17 e 18 de setembro, incursões de aviões militares com mísseis aterrorizaram a população civil em bairros residenciais de Beirute e outras cidades do Líbano. A utilização de dispositivos eletrônicos, usados pela população em larga escala, como armas de guerra viola a Convenção de Genebra, uma das mais elementares para demarcar os limites das ações militares em conflagrações bélicas.

Além das 30 vítimas fatais e mais de quatro mil feridos na primeira semana, por causa das explosões de dispositivos eletrônicos e incursões aéreas em regiões densamente povoadas, informações do Ministério da Saúde do Líbano dão conta de que até metade da semana derradeira de setembro são quase seiscentos mortos (mais de 50 crianças e quase 100 mulheres), pelo menos dois brasileiros adolescentes, e mais de dois mil feridos, muitos em estado grave e com a intensificação dos ataques aéreos ficou impraticável o traslado de feridos com maior gravidade a centros médicos mais completos.

O gabinete ministerial do Carniceiro de Gaza -- ou melhor, Carniceiro da Palestina -- já deixou patente sua decisão de dar continuidade ao projeto de colonização total da Arábia a começar pela região próxima ao território usurpado da Palestina em 1987: Líbano, Síria [Iraque está colonizado pelo ocidente desde 2005], Iêmen e, quando for possível, o Irã [tido como a joia da coroa pelos sionistas, sobretudo depois do triunfo da Revolução Islâmica em 1978], que, aliás, nunca esconderam seus nada generosos propósitos ao se estabelecerem à força na Palestina milenar, desde fins da década de 1890.

No momento em que faço este texto, a incansável Jornalista (e jovem promessa) Nathalia Urban, do Portal de Notícias 247, se eterniza depois de tentar resistir ao politraumatismo que a acometera ao sofrer uma queda nas imediações de Edimburgo, capital da Escócia. Sua trágica partida ocorre no momento em que iniciava nova fase em sua Vida, com planos para a maternidade e com intensa felicidade. Perda irreparável não só para o Jornalismo autêntico, mas para a resistência ao fascismo, para a Causa Palestina, para a Unidade Latino-americana e, sobretudo, para a humanidade, tamanha a qualidade humana dessa profissional que se tornou membro de todas as famílias dos que se informavam por meio de seu marcante modo de analisar e interpretar a complexa realidade.

E na véspera do primeiro ano desta que é a maior tragédia da Nakba para a população da Palestina em diáspora desde 1948, dentro e fora dos territórios milenares, o transcurso de mais um aniversário de nascimento, o primeiro desde sua eternização em 22 de outubro de 2023, do querido e saudoso Amigo Jadallah Safa. Com ele, na década de 1980, fizemos importantes atos que entraram para a história de Corumbá como da Resistência Palestina: ciclo de debates em escolas públicas e privadas sobre o chamado Mundo Árabe e Palestina; I Mostra da Cultura Árabe-Palestina, Casa de Cultura Luiz de Albuquerque, importante parceria entre a Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul, por meio da Biblioteca Pública Estadual Dr. Gabriel Vandoni de Barros, gerida pela Professora Elenir Machado de Mello (querida Lena), que levou mais de dois meses para ser organizada e outros três de visitação, entre julho e setembro de 1987; e a criação do Comitê 29 de Novembro de Solidariedade ao Povo Palestino Jadallah Suleiman Safa [homenagem à sua memória], em 27 de novembro de 1987, no auditório do Centro Universitário de Corumbá, com a participação do saudoso Doutor Roberto Moaccar Orro, Secretário de Estado de Justiça; da saudosa Jornalista Margarida Gomes Marques, do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Mato Grosso do Sul; da Jornalista Maria Helena Brancher, do Grupo de Apoio aos Povos Indígenas (GAIN-MS); do Professor Valmir Batista Corrêa, representando a Diretora Gisela Levatti Alexandre; o Doutor Lécio Gomes de Souza, o Poeta Rubens de Castro e a Professora Elenir Machado de Mello, pela Casa de Cultura Luiz de Albuquerque, além dos Companheiros Maurício Lopo Vieira e Manoel do Carmo Vitório, da Unidade Regional do Trabalho. Camarada Jadallah, sempre presente!

Ahmad Schabib Hany

NATHALIA URBAN (1987-2024): INTELIGENTE, JOVEM E LUTADORA DOS POVOS POBRES

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

UFPantanal: mais que sonho, necessidade premente

UFPantanal: mais que sonho, necessidade premente

Adesão da sociedade civil e científica vem crescendo a passos largos, enquanto hesitação, em vez de entusiasmo, divide docentes e discentes do CPAN/UFMS.

Eis que titubeio, hesitação, é o que tem demarcado os espaços imaginários entre alunos/as e docentes-pesquisadores/as do CPAN/UFMS, mas fico lisonjeado ao ver que há expressivo número de professoras e professores entusiastas, mais engajados. Por quê? Elas e eles, docentes, sabem -- porque conhecem -- a importância desta região, independentemente da área de estudo a que se dedicam, para a soberania tecnocientífica brasileira e para o desenvolvimento estratégico regional, nacional e continental. Mais: a instalação de um centro de pesquisas de referência é bom para a população regional e de interesse geopolítico em tempos de afirmação do protagonismo do Brasil, seja como potência regional ou como membro do concerto das nações como agente da paz, do desenvolvimento soberano e do combate à fome.

Porque é alvissareiro o novo paradigma de universidade, inclusiva e inovadora, liberta do burocratismo imposto pelo famigerado Acordo MEC-USAID, de 1968, que vem atravancando o desenvolvimento tecnocientífico há diversas décadas -- na verdade, desde o início da redemocratização do Brasil, em 1985, pois, à exceção dos governos dos presidentes Lula e Dilma, nenhum ministro da Educação pós-Nova República teve sucesso nas diferentes tentativas de resgatar o papel de vanguarda na pesquisa pelas universidades tradicionais --, uma das razões da letargia e do individualismo reinantes na academia brasileira. Até porque a adoção de ranking na produção e no desempenho acadêmicos leva a um perigoso ‘pragmatismo’ que se reflete em quase todas as universidades brasileiras.

Não há exagero ao afirmar que as pesquisas pioneiras em diversas áreas do conhecimento não só em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul começaram com pesquisadores instalados no então Centro Pedagógico de Corumbá (da Universidade Estadual de Mato Grosso) e depois no Centro Universitário de Corumbá (da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul). Há duas semanas, resgatamos o pioneirismo dos docentes pesquisadores Cláudio de Almeida Conceição, Wilson Uieda e Masao Uetanabaro. Todos eles das ciências biológicas. Agora iremos citar o pioneirismo na História, com os docentes pesquisadores Valmir Batista Corrêa e Lúcia Salsa Corrêa, desde início da década de 1970.

Casal que veio bem jovem a Corumbá, ambos dedicados à História, não só estruturaram o curso de licenciatura, mas sistematizaram a História Regional e, sobretudo, iniciaram um importante processo de pesquisa ousado e metódico em todo o sul de Mato Grosso. Tive a honra e o prazer de conhecer o Professor Valmir Corrêa em 1975, quando eu ainda estava no segundo ano do ensino médio, no antigo Centro Educacional Julia Gonçalves Passarinho, e o saudoso Professor Octaviano Gonçalves da Silveira Junior, titular de Língua Portuguesa e de Literatura, nos orientou para que fizéssemos uma enquete com os alunos da escola sobre a divisão de Mato Grosso, ainda em cogitação. Por recomendação dele, fomos até o CPC/UEMT para saber fazer a enquete e a pessoa indicada era o Professor Valmir Corrêa.

Em 1978, quando iniciei o curso de licenciatura em Letras, no período vespertino, tive um contato maior com ele: o Centro de Estudos Históricos Ricardo Franco, embora restrito ao alunado de História, me cativava muito, tendo participado de algumas de suas atividades. Mesmo deslumbrado com o nível do ensino no CPC, eu já estava com planos de, ao final daquele ano, antes da instalação do governo de Mato Grosso do Sul, ir trabalhar em algum jornal, mesmo porque o Amigo Edson Moraes, referência de nossa geração, trabalhava no Tribuna, do Jornalista e Deputado Sérgio Cruz. Antes de me mudar para Campo Grande, doei ao Professor Valmir uma hemeroteca modesta, com jornais de Corumbá, Ladário, Cuiabá, Campo Grande, São Paulo, Rio de Janeiro, La Paz, Cochabamba, Trinidad, Santa Cruz de la Sierra, Assunção, Buenos Aires, Madri, Cairo e Beirute, em português, espanhol, inglês e francês.

A revista acadêmica Dimensão, editada por uma equipe de docentes do CPC, traz síntese das primeiras pesquisas dos Professores Valmir e Lúcia, além de outros pesquisadores, obviamente, em que consta de catalogação de jornais corumbaenses do final do século XIX e início do século XX, bem como a descrição do movimento do entreposto comercial de importância continental. Com a participação do Professor Gilberto Luiz Alves, do curso de Pedagogia e igualmente pioneiro em História da Educação, Valmir e Lúcia realizaram a justificativa para o tombamento do Casario do Porto em 1986, uma luta iniciada em 1978 por causa da demolição de três prédios históricos do centro de Corumbá: Cine Santa Cruz (onde hoje está a agência local do Bradesco), Intendência Municipal (onde estava situada a sede do Café Néctar) e a Rádio Difusora Mato-grossense S/A (em frente à agência local do Banco do Brasil).

A artista plástica Marlene Terezinha Mourão, a querida Peninha, convidada pela Irmã Sofia para trabalhar como professora no saudoso Ginásio e Escola Normal Imaculada Conceição (GENIC), trocou Coxim e Campo Grande por Corumbá e deu uma guinada em sua Vida. Em tom bastante descontraído, Peninha conta que, anos depois, foi convidada pelo Doutor Salomão Baruki para dar aula no Instituto Superior de Pedagogia, no prédio do então Grupo Escolar Luiz de Albuquerque (mais tarde, transformado no ILA, no governo derradeiro de Mato Grosso uno, em que o corumbaense Cássio Leite de Barros era governador e Salomão Baruki deixara a vice-reitoria para ser secretário de estado de Educação e Cultura).

Professora de Introdução à Metodologia Científica até 1974, a criadora de Maria Dadô foi colega dos professores Gilberto, Valmir, Lúcia e Masao, com quem tinha uma relação bem descontraída (em 1977, todos eles estavam nas diferentes edições da Grifo, revista mato-grossense editada em Campo Grande pela Edimat. Mesmo sem saber, Peninha era uma seguidora do método de Paulo Freire com a sua pedagogia libertária e descomplicada, em um tempo de censura e muita tortura. Ela justificava não ler jornais, porque havia muita mentira, não mostravam a verdade, porque a censura prévia não deixava que saísse nada que não fosse do interesse dos governantes. Foi assim que vim saber que meu Irmão Mohamed, eternizado 50 anos atrás, fora seu aluno e, curiosamente, ela ainda se lembrava dele, de seu jeito irreverente -- provocador, até -- para a época.

Amiga da Professora Lígia, Filha do Professor Salomão Baruki, Peninha retorna para o CPC, desta vez como técnica do ‘Seção de Multimeios’ (hoje, multimídia), depois de ter sido secretária do vice-reitor da UEMT, Doutor Salomão, que assinara a sua carteira de trabalho numa das substituições ao Professor João Pereira da Rosa, primeiro reitor da UEMT e, com a federalização, de sua sucedânea, UFMS. Para ela, não se trata apenas da assinatura do empregador, senão de autógrafo de um homem público muito querido, com quem conviveu apesar da diferença de pontos de vista, tanto que até hoje mantém uma Amizade fraternal com a Professora Lígia Baruki e Melo, sua correligionária e confidente.

Mar, Marlene Mourão ou simplesmente Peninha é prima do igualmente talentoso poeta e compositor coxinense Zacarias Mourão, o célebre autor de “Pé de Cedro” eternizado há algumas décadas com pouca idade. Humilde, não gosta dessas associações a celebridades, pois ama o anonimato. Mas a autora de “Pacu era um peixe feliz que nadava nas águas do Rio Paraguai” foi prefaciado pelo Poeta Manoel de Barros sem tê-lo pedido: ele ficara encantado com o conto-poema que ela enviara por correio em 1987, mas que só publicou em 2002, graças ao Fundo de Investimento Cultural criado no governo do correligionário José Orcírio Miranda dos Santos, o Zeca do PT.

Além de docente universitária e técnica de ‘multimeios’, a querida e talentosa Peninha é artista plástica, caricaturista, cartunista, poeta, escritora, ativista cultural e Mãe-Avó de Luiz Eduardo, Felipe, Leonardo e Helô, a Netinha. Ama o óleo, a aquarela e, sobretudo, o bico de pena. Não por acaso, suas ilustrações são presença obrigatória em livros do ex-colega Gilberto, em edições da década de 1980 e em sua coleção para a Associação dos Bibliófilos do Instituto Cultural Gilberto Luiz Alves (ICGLA), em 2023, inaugurada com “Pantanal da Nhecolândia: pecuária e modernização tecnológica”, Volume 1 da coleção. Há poucos dias, o ICGLA promoveu o lançamento do Volume 2, coautoria de Valmir Batista Corrêa e Lúcia Salsa Corrêa, “A produção de charque e de tanino no sul de Mato Grosso: cenários e dilemas”, coedição do ICGLA com a Editora Maria Petrona, de Londrina.

As universidades são feitas por humanos e para humanos. Uma sociedade que se pretende moderna e desenvolvida não pode abrir mão de criar uma universidade inovadora, ousada e inclusiva. O progresso não vem por acaso: é fruto do esforço realizado por seres humanos esclarecidos e libertos. Assim, em plena fronteira, o coração do Pantanal e da América do Sul, do Sol e do Sal -- como solenemente agasalhou o legítimo Festival da América do Sul a partir de 2004 -- manterá o cosmopolitismo / vanguardismo com que marcou na história, na memória e, sobretudo, na Vida. UFPantanal não é sonho, é necessidade urgente.

Ahmad Schabib Hany

quinta-feira, 12 de setembro de 2024

VIVENCIANDO - Igor Alexandre

VIVENCIANDO

Vivenciando aqui em mais ou menos 15 anos... contribuições para um choque de realidade.

O Agro virtual fetichizado e pelo capitalismo é a expressão da morte mais que real no Pantanal:

1) De bioma mais conservado do Brasil (85%) para projeção de ser o primeiro bioma brasileiro a ser extinto.

2) De maior planície alagável do mundo para bioma com estiagem histórica, solos secos e mudança para clima sub-úmido seco com sinais de desertificação.

3) De região rica em abundância de vida selvagem para carbonização e ecocídio de fauna e flora (estimativas de quase 100 milhões de vertebrados mortos, quase 5 bilhões de invertebrados mortos e destruição, substituição e invasão de florestas nativas).

4) De região cosmopolita e historicamente atendida por logística de transporte menos depredatória para dragagem e afundamento dos leitos dos rios para atender ao capital, esgotamento da privatização e sucateamento total da malha ferroviária após anos de monopólio privado antissoberano, sobrecarga de carretas, aumentando custos de produção, destruindo estrada pública, aumentando riscos e matando pessoas viajantes e animais na BR para concentrar renda para os magnatas donos e vulgos "investidores" (parasitas) da riqueza natural e pública nacional.

5) De falsa região de sistemas produtivos integrados com o meio ambiente para a verdade eviscerada de desmatamento, introdução de pastagens exóticas, uso de veneno (agrotóxicos), introdução de sistemas pecuários intensivos, bombeamento dos lençóis freáticos cada vez mais comuns para atender a produção, ameaça permanente e/ou avanços concretos das fronteiras agrícolas da soja, eucalipto e cana de açúcar.

6) De ícone da natureza brasileira para terra arrasada onde talvez a fuligem e a carbonização do ar, a estufa e a elevação da sensação térmica a parâmetros infernais talvez façam (ou já tenham feito) muito mais vítimas que a outra Pandemia viral respiratória que contornamos há pouco tempo.

7) De mais um Polo do capitalismo verde e de "ações mitigadoras", paliativas, terminais, inexpressivas ou alienantes diante do cataclisma ambiental para a necessidade emergencial por ações estruturais que intervenham aqui, no Cerrado e na Amazônia, biomas interligados e indispensáveis para a existência do Pantanal, intervindo fundamentalmente no agrocapital privado espoliante da natureza, sequestrante de água, escravizador, colonizador, fascista, etnocida e concentrador das riquezas produzidas pelos trabalhadores e trabalhadoras que são dioturnamente envenenados, assassinados, adoecidos, alienados subconsciente e materialmente de sua existencialidade terrena.

Por hora...

Barbárie crônica sobrepondo o alternativo socialismo.

Mas...

Venceremos!

Firme nas Lutas! 👊

Igor Alexandre 

La Vida No Vale Nada (En Vivo)


LA VIDA NO VALE NADA

(Pablo Milanés)

La vida no vale nada, si no es para perecer

Porque otros puedan tener lo que uno disfruta y ama

La vida no vale nada, si yo me quedo sentado

Después que he visto y soñado que en todas partes me llaman

La vida no vale nada, cuando otros se están matando

Y yo sigo aquí cantando cual si no pasara nada

La vida no vale nada, si escucho un grito mortal

Y no es capaz de tocar mi corazón que se apaga

La vida no vale nada, si ignoro que el asesino

Cogió por otro camino y prepara otra celada

La vida no vale nada, si se sorprende a otro hermano

Cuando supe de antemano lo que se le preparaba

La vida no vale nada, si cuatro caen por minuto

Y al final por el abuso se decide la jornada

La vida no vale nada, si tengo que posponer

Otro minuto de ser y morirme en una cama

La vida no vale nada, si en fin lo que me rodea

No puedo cambiar cual fuera lo que tengo y que me ampara

Y por eso para mí

La vida no vale nada, si ignoro que el asesino

Cogió por otro camino y prepara otra celada

La vida no vale nada, si se sorprende a otro hermano

Cuando supe de antemano lo que se le preparaba

La vida no vale nada, si cuatro caen por minuto

Y al final por el abuso se decide la jornada

La vida no vale nada, si tengo que posponer

Otro minuto de ser y morirme en una cama

La vida no vale nada, si en fin lo que me rodea

No puedo cambiar cual fuera lo que tengo y que me ampara

Y por eso para mí, la vida no vale nada

sábado, 7 de setembro de 2024

UFPantanal: mais que sonho, necessidade urgente

UFPantanal: mais que sonho, necessidade urgente

Adesão da sociedade civil e científica vem crescendo a passos largos, enquanto hesitação, em vez de entusiasmo, divide docentes e discentes do CPAN/UFMS.

Eis que titubeio, hesitação, é o que tem demarcado os espaços imaginários entre alunos/as e docentes-pesquisadores/as do CPAN/UFMS, e fico lisonjeado ao ver que professoras e professores são os mais entusiastas, mais engajados. Por quê? Elas e eles, docentes, sabem -- porque conhecem -- a importância desta região, independentemente da área de estudo a que se dedicam, para a soberania tecnocientífica brasileira e para o desenvolvimento estratégico regional, nacional e continental. Mais: a instalação de um centro de pesquisas de referência é bom para a população regional e de interesse geopolítico em tempos de afirmação do protagonismo do Brasil, seja como potência regional ou como membro do concerto das nações como agente da paz, do desenvolvimento soberano e do combate à fome.

Porque é alvissareiro o novo paradigma de universidade, inclusiva e inovadora, liberta do burocratismo imposto pelo famigerado Acordo MEC-USAID, de 1968, que vem atravancando o desenvolvimento tecnocientífico há diversas décadas -- na verdade, desde o início da redemocratização do Brasil, em 1985, pois, à exceção dos governos dos presidentes Lula e Dilma, nenhum ministro da Educação pós-Nova República teve sucesso nas diferentes tentativas de resgatar o papel de vanguarda na pesquisa pelas universidades tradicionais --, uma das razões da letargia e do individualismo reinantes na academia brasileira. Até porque a adoção de ranking na produção e no desempenho acadêmicos leva a um perigoso ‘pragmatismo’ que se reflete em quase todas as universidades brasileiras.

Não há exagero ao afirmar que as pesquisas pioneiras em diversas áreas do conhecimento não só em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul começaram com pesquisadores instalados no então Centro Pedagógico de Corumbá (da Universidade Estadual de Mato Grosso) e depois no Centro Universitário de Corumbá (da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul). Há duas semanas, resgatamos o pioneirismo dos docentes pesquisadores Cláudio de Almeida Conceição, Wilson Uieda e Masao Uetanabaro. Todos eles das ciências biológicas. Agora iremos citar o pioneirismo na História, com os docentes pesquisadores Valmir Batista Corrêa e Lúcia Salsa Corrêa, desde início da década de 1970.

Casal que veio bem jovem a Corumbá, ambos dedicados à História, não só estruturaram o curso de licenciatura, mas sistematizaram a História Regional e, sobretudo, iniciaram um importante processo de pesquisa ousado e metódico em todo o sul de Mato Grosso. Tive a honra e o prazer de conhecer o Professor Valmir Corrêa em 1975, quando eu ainda estava no segundo ano do ensino médio, no antigo Centro Educacional Julia Gonçalves Passarinho, e o saudoso Professor Octaviano Gonçalves da Silveira Junior, titular de Língua Portuguesa e de Literatura, nos orientou para que fizéssemos uma enquete com os alunos da escola sobre a divisão de Mato Grosso, ainda em cogitação. Por recomendação dele, fomos até o CPC/UEMT para saber fazer a enquete e a pessoa indicada era o Professor Valmir Corrêa.

Em 1978, quando iniciei o curso de licenciatura em Letras, no período vespertino, tive um contato maior com ele: o Centro de Estudos Históricos Ricardo Franco, embora restrito ao alunado de História, me cativava muito, tendo participado de algumas de suas atividades. Mesmo deslumbrado com o nível do ensino no CPC, eu já estava com planos de, ao final daquele ano, antes da instalação do governo de Mato Grosso do Sul, ir trabalhar em algum jornal, mesmo porque o Amigo Edson Moraes, referência de nossa geração, trabalhava no Tribuna, do Jornalista e Deputado Sérgio Cruz. Antes de me mudar para Campo Grande, doei ao Professor Valmir uma hemeroteca modesta, com jornais de Corumbá, Ladário, Cuiabá, Campo Grande, São Paulo, Rio de Janeiro, La Paz, Cochabamba, Trinidad, Santa Cruz de la Sierra, Assunção, Buenos Aires, Madri, Cairo e Beirute, em português, espanhol, inglês e francês.

A revista acadêmica Dimensão, editada por uma equipe de docentes do CPC, traz síntese das primeiras pesquisas dos Professores Valmir e Lúcia, além de outros pesquisadores, obviamente, em que consta de catalogação de jornais corumbaenses do final do século XIX e início do século XX, bem como a descrição do movimento do entreposto comercial de importância continental. Com a participação do Professor Gilberto Luiz Alves, do curso de Pedagogia e igualmente pioneiro em História da Educação, Valmir e Lúcia realizaram a justificativa para o tombamento do Casario do Porto em 1986, uma luta iniciada em 1978 por causa da demolição de três prédios históricos do centro de Corumbá: Cine Santa Cruz (onde hoje está a agência local do Bradesco), Intendência Municipal (onde estava situada a sede do Café Néctar) e a Rádio Difusora Mato-grossense S/A (em frente à agência local do Banco do Brasil).

A artista plástica Marlene Terezinha Mourão, a querida Peninha, convidada pela Irmã Sofia para trabalhar como professora no saudoso Ginásio e Escola Normal Imaculada Conceição (GENIC), trocou Coxim e Campo Grande por Corumbá e deu uma guinada em sua Vida. Em tom bastante descontraído, Peninha conta que, anos depois, foi convidada pelo Doutor Salomão Baruki para dar aula no Instituto Superior de Pedagogia, no prédio do então Grupo Escolar Luiz de Albuquerque (mais tarde, transformado no ILA, no governo derradeiro de Mato Grosso uno, em que o corumbaense Cássio Leite de Barros era governador e Salomão Baruki deixara a vice-reitoria para ser secretário de estado de Educação e Cultura).

Professora de Introdução à Metodologia Científica até 1974, a criadora de Maria Dadô foi colega dos professores Gilberto, Valmir, Lúcia e Masao, com quem tinha uma relação bem descontraída (em 1977, todos eles estavam nas diferentes edições da Grifo, revista mato-grossense editada em Campo Grande pela Edimat. Mesmo sem saber, Peninha era uma seguidora do método de Paulo Freire com a sua pedagogia libertária e descomplicada, em um tempo de censura e muita tortura. Ela justificava não ler jornais, porque havia muita mentira, não mostravam a verdade, porque a censura prévia não deixava que saísse nada que não fosse do interesse dos governantes. Foi assim que vim saber que meu Irmão Mohamed, eternizado 50 anos atrás, fora seu aluno e, curiosamente, ela ainda se lembrava dele, de seu jeito irreverente -- provocador, até -- para a época.

Amiga da Professora Lígia, Filha do Professor Salomão Baruki, Peninha retorna para o CPC, desta vez como técnica do ‘Seção de Multimeios’ (hoje, multimídia), depois de ter sido secretária do vice-reitor da UEMT, Doutor Salomão, que assinara a sua carteira de trabalho numa das substituições ao Professor João Pereira da Rosa, primeiro reitor da UEMT e, com a federalização, de sua sucedânea, UFMS. Para ela, não se trata apenas da assinatura do empregador, senão de autógrafo de um homem público muito querido, com quem conviveu apesar da diferença de pontos de vista, tanto que até hoje mantém uma Amizade fraternal com a Professora Lígia Baruki e Melo, sua correligionária e confidente.

Mar, Marlene Mourão ou simplesmente Peninha é prima do igualmente talentoso poeta e compositor coxinense Zacarias Mourão, o célebre autor de “Pé de Cedro” eternizado há algumas décadas com pouca idade. Humilde, não gosta dessas associações a celebridades, pois ama o anonimato. Mas a autora de “Pacu era um peixe feliz que nadava nas águas do Rio Paraguai” foi prefaciado pelo Poeta Manoel de Barros sem tê-lo pedido: ele ficara encantado com o conto-poema que ela enviara por correio em 1987, mas que só publicou em 2002, graças ao Fundo de Investimento Cultural criado no governo do correligionário Zeca do PT.

Além de docente universitária e técnica de ‘multimeios’, a querida e talentosa Peninha é artista plástica, caricaturista, cartunista, poeta, escritora, ativista cultural e Mãe-Avó de Luiz Eduardo, Felipe, Leonardo e Helô, a Netinha. Ama o óleo, a aquarela e, sobretudo, o bico de pena. Não por acaso, suas ilustrações são presença obrigatória em livros do ex-colega Gilberto, em edições da década de 1980 e em sua coleção para a Associação dos Bibliófilos do Instituto Cultural Gilberto Luiz Alves (ICGLA), em 2023, inaugurada com “Pantanal da Nhecolândia: pecuária e modernização tecnológica”, Volume 1 da coleção. Há poucos dias, o ICGLA promoveu o lançamento do Volume 2, coautoria de Valmir Batista Corrêa e Lúcia Salsa Corrêa, “A produção de charque e de tanino no sul de Mato Grosso: cenários e dilemas”, coedição do ICGLA com a Editora Maria Petrona, de Londrina.

As universidades são feitas por humanos e para humanos. Uma sociedade que se pretende moderna e desenvolvida não pode abrir mão de criar uma universidade inovadora, ousada e inclusiva. O progresso não vem por acaso: é fruto do esforço realizado por seres humanos esclarecidos e libertos. Assim, em plena fronteira, o coração do Pantanal e da América do Sul, do Sol e do Sal -- como solenemente agasalhou o legítimo Festival da América do Sul a partir de 2004 -- manterá o cosmopolitismo / vanguardismo com que marcou na história, na memória e, sobretudo, na Vida. UFPantanal não é sonho, é necessidade urgente.

Ahmad Schabib Hany

Mohamed, 50 anos de seu silêncio

Mohamed, 50 anos de seu silêncio

Neste 21 de setembro transcorrem 50 anos da eternização de Mohamed Schabib Hany, jovem que teve a sua Vida interrompida aos 25 anos. Eram tempos sombrios e as perspectivas para desassossegados como ele tinham gosto de chumbo, censura e repressão.

Se o mês de setembro de 1973 representara para a América Latina uma tragédia sem fim (por causa do cruento golpe protagonizado pelo sanguinário general Augusto Pinochet no Chile), o de 1974, sobretudo para nossa Família, tinha gosto de chumbo e sangue. No dia em que transcorriam os 196 anos de fundação de Corumbá (sem festa, pois na semana anterior um avião se acidentara levando a óbito o comandante da 9ª Região Militar, de Campo Grande), meu Irmão Mohamed, o mais velho e ‘guru’ de todos os Irmãos e Irmãs, se eternizava, ao cair da tarde, em circunstâncias nunca esclarecidas.

Tempo de censura e repressão, a imprensa não pôde apresentar outra versão que a da polícia, que sequer investigara ou, ao menos, realizara um exame de balística. Minutos depois do traslado do corpo ao necrotério local, o caso foi encerrado como ‘suicídio’ com base em uma declaração atribuída ao ‘menor’ de apenas 15 anos, levado na mesma viatura (uma Veraneio da Polícia Civil), desacompanhado e sem qualquer orientação, logo depois do desenlace. Detalhe: o ‘menor’ era precisamente eu, em estado de choque, pois até então não tinha visto um corpo inerte, logo de alguém querido como o Irmão mais velho.

O delegado regional era um ex-professor de Matemática meu e de Educação Moral e Cívica de três Irmãs. Uma década depois fui saber que ele, bacharel em Direito, fora nomeado, dois anos antes do fatídico dia em que meu Irmão se eternizou, com o aval do poderoso e temido senador Filinto Strubing Müller, que até sua trágica morte, nas imediações do Aeroporto de Paris, fora presidente nacional da Arena, partido de sustentação do regime, do Senado Federal e do Congresso Nacional, homem forte do general Emílio Médici.

Nem o apelo de minha saudosa Mãe sensibilizara o delegado para ao menos cumprir o protocolo de um mero inquérito policial. O que dizer do ofício do general da então Segunda Brigada Mista, pessoalmente levado por minha Mãe por orientação do advogado contratado para a elucidação do caso e devolução de pertences da vítima, levados com o corpo e que teoricamente teriam sido juntados aos autos? Nem devolução de pertences, que não era o que interessava aos nossos Pais, e, pior, nem o esclarecimento das circunstâncias em que ocorrera a tragédia.

Meses antes, precisamente no aniversário de 48 anos de nossa Mãe, esse mesmo delegado agira com ardil quando uma equipe da patrulha da polícia (à época Corumbá só contava com Polícia Civil) tentara invadir, durante a madrugada, o quintal da casa de nossos Pais, como que estivesse no encalço de algum criminoso, sem mandado judicial ou contato prévio com os responsáveis pela moradia, no caso nossos Pais. Armado de um revólver Smith & Wesson 1948 calibre 32, com registro e autorização de posse, Seu Mahoma não hesitou em dar cinco disparos no rumo das lanternas, para assustar o que, no entender dele, eram assaltantes ou algo parecido. Jamais imaginou que policiais pudessem agir em arrepio da lei, sobretudo naqueles tempos em que civis deviam obediência à Polícia do Exército, que mensalmente realizava blitze noturna em toda a região em que morávamos, a Feira Boliviana, um conjunto de seis quarteirões situados nos arredores da Estação Ferroviária da Red Oriental, da Bolívia.

De março a setembro de 1974 meu Irmão confidenciara a nossos Pais que esporadicamente a viatura da ‘rádio patrulha’, como então eram chamados o Fusca e a Veraneio da Polícia Civil em Corumbá, o cercava quando, ao final da tarde, estava a caminho da faculdade ou ao retorno, à noite. Para evitar eventual arbitrariedade dos policiais, Mohamed passou a usar carona de Amigos para ir e para retornar das aulas. Bastante prudente, ele sabia dos abusos cometidos pelas autoridades durante as ditaduras na América Latina. Antes de estudar em Corumbá, ele fazia Sociologia na Universidad Mayor de San Andrés, em La Paz, interrompido com o recesso universitário decretado pelo coronel Hugo Banzer Suárez assim que consumou o sangrento golpe contra o seu superior, general Juan José Torres, em agosto de 1971.

A despeito de se dizer admirador de nossos Pais (a esposa, de ascendência síria, era de uma Família amiga), o delegado não só agira arbitrariamente no episódio dos agentes da Polícia Civil que invadiram sem autorização o quintal de nossa casa durante a madrugada, insinuando que nosso Irmão Mohamed era alvo de investigação nunca dada a público, como depois de sua eternização fez questão de liberar para a imprensa uma ocorrência cuja investigação não havia sido instaurada, que propiciou manchetes sensacionalistas do nível do jornal Notícias Populares, editado pelo grupo ‘Folhas’, de São Paulo.

Graças à solidariedade dos Amigos Juvenal Ávila de Oliveira, radialista na época, e João de Souza Alvarez, então repórter fotográfico, fui em sua companhia a todas as redações de jornais e rádios para deixar a versão de nossa Família, observando que o inquérito sequer tinha sido instaurado pela polícia. Por razões que desconheço (mas, obviamente, deduzo, afinal, estávamos nos anos de chumbo), somente o Diário de Corumbá, dirigido na ocasião por Carlos Paulo Pereira Junior, Filho do fundador, Amigo de meu Pai, assegurou o direito de resposta, em tom de retratação.

Um alivio em meio a esse sofrimento representou a solidariedade dos colegas de turma do curso de Psicologia do à época Centro Pedagógico de Corumbá da Universidade Estadual de Mato Grosso (CPC/UEMT), manifestada pelo saudoso Senhor Lincoln Gomes de Souza, também funcionário da agência local do Banco do Brasil. Seu Lincoln, tenor do coral da Igreja Matriz, conseguira autorização de Dom Ladislau Paz, Bispo Diocesano de Corumbá, para que fosse celebrada Missa de Sétimo Dia em memória de meu Irmão (na época suicida não podia ter celebração religiosa), bastante concorrida e na qual ele, com sua memorável voz de tenor, fizera questão de entoar cantos religiosos e temas líricos.

Outro gesto solidário foi de Dona Elza, esposa do popular Seu Brotinho, proprietário da quitanda próxima à pensão de nossa Família. Ela era seguidora da doutrina de Allan Kardec e, depois de consultar nossos Pais se aceitavam participar de sessão reservada na sede da União Espírita Corumbaense, foram informados de que, em mensagem recebida por um médium da entidade, meu Irmão dissera que não era suicida e que tivessem certeza de que, apesar da saudade que sentia por eles, a Família e os Amigos, ele estava bem em seu novo estágio de Vida. Além de inúmeras demonstrações de carinho e Amizade de pessoas dos mais diferentes segmentos sociais e denominações religiosas, esses gestos solidários proporcionaram um consolo para nossos Pais, que ficaram gratos com Seu Lincoln Gomes e demais colegas de curso; com Dona Elza, sua Família e seus Irmãos espíritas; com Juvenal Ávila e João Alvarez, e com a Família Nunes Pereira, proprietária do Diário de Corumbá, em que nosso Pai publicava seus artigos desde 1969, ano em que voltara a circular, depois de mais de 50 anos de interrupção.

Em La Paz e Cochabamba, onde Mohamed passou a maior parte de sua Vida, os Amigos e Companheiros do movimento estudantil e sindical também manifestaram a solidariedade altiva e ativa dos que não se curvaram ante o facínora Banzer e sua prepotência ilimitada. Em La Paz, onde ele cursara alguns anos de Engenharia Civil e depois Sociologia, o Frei Javier Luna Pizarro, ex-colega de movimento estudantil, se incumbiu de celebrar a missa em sua memória, destacando que em circunstância alguma seu Amigo e Companheiro de lutas inesgotáveis jamais seria um ‘suicida’, e desafiou as autoproclamadas ‘autoridades’ golpistas a provarem, até porque sabia que os policiais em Corumbá sequer tinham feito exame de balística. Por quê?

Cochabamba, que o acolheu ainda criança e o reencontrou jovem desassossegado nos anos 1960, foi a localidade em que em diversos setores da então cidade universitária da Bolívia homenagens e manifestações de pesar foram entoadas. O líder sindical Virgilio Céspedes, cruzenho de nascimento, foi uma das dezenas de vozes que não se constrangeram para chorar com intensidade. Fez questão de enviar um testemunho escrito ao nosso Pai em que assegurava que, em meio a inúmeras confidências, o caráter firme de Mohamed jamais permitiria um gesto suicida. Anos depois, pessoalmente, revelou a nossos Pais o rigor e a convicção com que conduzia a sua práxis transformadora.

No Líbano, igualmente, familiares, Amigos e ex-colegas do ensino médio fizeram uma noite de vigília em que poemas, crônicas e canções foram dedicadas à sua memória. Foram enviadas cinco fitas k-7 (‘cassete’) do áudio das manifestações de pesar, de solidariedade e, sobretudo, de retratação à memória daquele jovem exemplar que, nos quatro anos em que viveu no Líbano, foi líder emblemático por sua generosidade, abnegação e coragem. O professor de Filosofia, que se tornou seu Amigo, disse com todas as letras que em sã consciência Mohamed era mais um mártir do porvir libertador que não demoraria a chegar.

Havia 10 anos que nosso Pai emigrara pela segunda vez do Líbano, via Bolívia, para o Brasil, à procura de perspectivas promissoras para a nova geração de sua Família. Bastante atento às adversidades políticas no Oriente Médio, ele vislumbrara com uma década de antecedência a convulsão social que se gestava em seu país natal, em que em agosto de 1974 eclodira um conflito transformado em guerra civil que se arrastaria por mais de 25 anos, destruíra toda a infraestrutura da até então ‘Suíça do Oriente Médio’ e empobrecera a quase totalidade da população libanesa.

Nos quatro anos em que nossos Pais residiram no Líbano, de 1960 a 1963, em Ra’ssen-hache, cidade natal (departamento de Batroun, norte do Líbano) de Seu Mahoma, os oito filhos e filhas acabaram ganhando mais uma, a caçula, conterrânea do Pai. O bucólico povoado em que moramos foi cenário de uma tomada de consciência para toda a prole do casal de peregrinos em que, fosse da Amazônia ou dos Andes bolivianos, até o coração das montanhas libanesas, palpitara a consciência libertária cuja razão de ser é a Palestina milenar e seu incansável povo heroico.

“La vida no vale nada / sino es por perecer / por que otros puedan tener / lo que uno disfruta y ama.” (Pablo Milanés, ‘La Vida no Vale Nada’)

Ahmad Schabib Hany