Pantanal:
mensagem alvissareira
Colaborador de jornalão
campo-grandense, economista com acuidade histórica é um dos mensageiros da
redenção do Pantanal.
Nada como um dia depois do outro e uma noite no
meio deles... Ninguém menos que um economista antenado que ainda não tive a
honra de conhecer cravou um artigo de opinião na página 2 do porta-voz oficioso
do establishment da precocemente senil
‘novacap’ na alvissareira terceira quarta-feira deste 2024.
Véspera do primeiro ano de eternização de um dos
maiores defensores do cosmopolitismo corumbaense e do desenvolvimento
sustentável e sustentado do Pantanal integrado -- o saudoso Seu Jorge José
Katurchi, querido Amigo sempre presente --, o alvissareiro artigo de opinião do
economista Benedito Rodrigues Costa (intitulado “Somente como estado o Pantanal
será preservado”) é uma homenagem póstuma ao Paladino da Cidadania que por décadas
lutou incansavelmente pelo soerguimento de Corumbá e região e que nos anos
derradeiros sonhava com a reunificação do Pantanal Mato-grossense.
O autor do emblemático artigo tem outra pérola,
publicada em setembro de 2018, sobre o coração do Pantanal e da América do Sul,
“Um new look para Corumbá”. Foi o que
pude constatar no portal do embolorado porta-voz da tristemente caquética
‘capetal’ de um estado que até hoje não disse a que veio (além de ter
proporcionado três senadores arenistas para a nefasta sobrevida de um regime autoritário,
consumiu milhões de dólares em projetos insanamente megalomaníacos, como um
famigerado ‘pôlder de Ladário’, uma ‘transpantaneira’ inacabada, a dinheirama
infindável despejada em intervenções caducas nas ‘bocas’ do Taquari e diversos ‘elefantes
brancos’ inconclusos no sul do velho Mato Grosso, tido então como curral de
Filinto Müller, Lúdio e Italívio Coelho, Cláudio e José Fragelli, Mendes
Canale, Rachid Derzi e Pedro Pedrossian).
Há quem seja condescendente com o faraó de
Miranda, Pedro Pedrossian. Nada pessoal, eu não. Foi ele o governador que em
1994, no apagar das luzes de seu derradeiro governo, atropelou a legislação e
sem qualquer consulta prévia à população submeteu à Assembleia Legislativa um
projeto de privatização decorrente de negociação com seu colega Jayme Campos,
de Mato Grosso, para pôr fim a uma questão judicial pela posse da concessão das
jazidas de ferro e manganês do Urucum, então pertencentes à Metamat S/A, criada
em 1971 pelo então governador José Fragelli para gerir a extração das minas de
Urucum, em Corumbá. Pelo acordo com o governo mato-grossense, a Metamat seria
privatizada, bem como a Urucum Mineração S/A (UMSA), subsidiária sua, a toque
de caixa.
Pedrossian venceu no Plenário do Legislativo, mas até
históricos correligionários pedristas foram contrários -- os deputados Armando Anache
e Marilene Coimbra, que pagaram caro pela ‘rebeldia’, não tendo sido reeleitos
em suas bases eleitorais naquele ano. A história é longa. Rendeu uma ação
popular encabeçada pelo falecido senador Fragelli, mas acabou abandonada por
Mato Grosso do Sul. Muitos se locupletaram, outros ficaram ‘queimados’ perante
a população, manipulados pelos poderosos dólares. O fato é que o Banco Vetor,
na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, em agosto de 1994, fez um leilão em que
o que tinha que ser privatizado acabou estatizado, pois a CVRD, estatal de economia
mista, foi quem adquiriu as ações, claramente subavaliadas.
Mais ainda: uma conta não fechou, eis que Mato
Grosso do Sul, onde a UMSA se encontrava, ficou com 40% do valor da venda das
ações, enquanto Mato Grosso, sede da Metamat, ficou com 60% do valor auferido
no leilão. A História ainda haverá de revelar muita coisa que é novidade num
estado em que os jornalões são 100% ‘valentes’ -- ou ‘valetes’? --, ‘pero no
mucho’. Quatro anos depois a CVRD foi leiloada pelo governo FHC por um terço do
lucro obtido no primeiro ano de privatizada, e a ex-UMSA, vendida a preço infame,
contribuiu muito para essas contas superavitárias.
Nos 46 anos de divisão territorial (44 anos de
instalação do governo de MS), efetivamente, o que foi feito de importante para
o Pantanal e sua população? À exceção das tímidas iniciativas protagonizadas
por Wilson Barbosa Martins entre 1983 e 1998 (entre elas as bases de toda a
legislação ambiental específica, a conclusão dos estudos do PCBAP e as balizas
do Programa BID-Pantanal) e por seu sucessor, José Orcírio Miranda dos Santos
(em especial a implantação de políticas de desenvolvimento integrado com o
protagonismo das populações tradicionais e originárias por meio do Prove Pantanal
e a reestruturação das metas constantes do Programa BID-Pantanal, interrompidas
no governo sucedâneo), Mato Grosso do Sul, ao longo desse período, auferiu
recursos por causa do Pantanal mas nada investiu de efetivo em nossa região.
É fundamental o reconhecimento do esforço, entre
1995 e 1998, dos governadores Dante de Oliveira e Wilson Martins (e de seus
respectivos gestores das políticas ambientais), que permitiu uma certa sintonia
entre as duas unidades da federação, mas por pouco tempo, além do valoroso
empenho de pesquisadores das universidades instaladas nos dois estados. Na
verdade, os estudos consolidados pelo PCBAP foi fruto do esforço hercúleo de
inúmeros cientistas e, sobretudo, desses dois democratas combativos dos tempos
da luta contra a ditadura, cuja determinação sensibilizou a burocracia federal
e permitiu a possibilidade de um programa comum de desenvolvimento sustentável,
o Programa BID-Pantanal.
Diferentemente de outros governadores, os aqui
aludidos (com ressalva a certos assessores e secretários) têm um legado
irrefutável de que a ciência e a política, quando à luz da democracia e do interesse
comum, são capazes de levar progresso às populações tradicionais e originárias
sem destruir as bases de sua própria existência. Até porque a ciência tem
demonstrado nestas últimas décadas (a partir de 1972, quando da realização da Conferência
Mundial sobre Meio Ambiente, em Estocolmo), que só se pode chamar de
desenvolvimento quando as transformações beneficiam a todos, e não apenas
enriquecem alguns, geralmente ‘laranjas’ de corporações ou até quadrilhas
transnacionais.
Pena que esse efêmero protagonismo cidadão tenha
sido interrompido nos dois estados, em consonância com os inglórios temporais
do autoritarismo que se avizinhava na segunda década do século XXI, em que um vice
golpista e um inominável pateta causaram enorme prejuízo não só ao Estado
Democrático de Direito, como ao erário nacional e, em especial, à sociedade
civil brasileira. Porque nunca é demais reiterar que na democracia é o diverso,
a pluralidade, o que legitima o interesse coletivo, não a alucinada e
oportunista ‘luta do bem contra o mal’, própria das mentes totalitárias
medievais revigoradas pelo fascismo.
Conhecedor da História de Mato Grosso (e Mato
Grosso do Sul), o articulista adverte que não será fácil a reunificação do
Pantanal Mato-grossense, ainda que desperte simpatia junto à opinião pública.
Aliás, não foi fácil a luta dos velhos e aguerridos defensores do movimento
divisionista que atravessou um século até concretizar o sonho de emancipar o
sul do velho Mato Grosso uno, ainda que por vias nada ortodoxas: a conquista
foi obtida mediante um conchavo com o general Ernesto Geisel, chefe de governo
cujo regime ruía e precisava desesperadamente granjear maioria situacionista
cada vez mais difícil.
Rodrigues da Costa presta um relevante serviço à cidadania
pantaneira quando dá pistas de como ir construindo essa maioria no território
do histórico Pantanal Mato-grossense. O articulista recorda que é no município
onde o cidadão mora, e portanto é com base nesse apoio que o futuro movimento
pela reunificação a ser liderado por Corumbá, como maior município pantaneiro,
deve construir os alicerces de seu projeto. Ao que acrescento sem perder de
vista sua História, suas diversas e ricas culturas e, sobretudo, seu
protagonismo anterior e posterior à divisão de Mato Grosso.
É também importante registrar que só tive acesso a
esse emblemático artigo graças a um Amigo-Irmão dos tempos da Sociedade dos
Amigos da Cultura (1991), Segunda Semana Social Brasileira (1993), Comitê
Pró-Cultura de Corumbá (1994) e Pacto Pela Cidadania (1994), o incansável
Armando Carlos Arruda de Lacerda. Foi esse querido Amigo que trinta e um anos
atrás me apresentou à Irmã Antônia Brioschi, então Coordenadora Diocesana de Pastoral
Social, e agora se deu ao trabalho de enviar recorte do jornal com a sábia
recomendação: “Convém não esquecer que as turfeiras que estão no centro das
preocupações do mundo, em Davos 2024, encontram-se tão-somente em quatro
municípios pantaneiros: Corumbá, Cáceres, Poconé e Barão de Melgaço.”
Alvíssaras, Pantanal! Um dia, ainda que distante,
o cosmopolitismo e a ancestralidade hão de se tornar hegemônicos e sua população
altiva e resiliente voltará a tomar as rédeas da História e ser detentora de
seu generoso porvir. Obrigado, Benedito Rodrigues da Costa! Obrigado, Armando
Carlos Arruda de Lacerda! A racionalidade e a sensatez com que esta temática sensível
passa a ser focada são as bases da gesta libertária a emancipar o povo pantaneiro,
sistematicamente preterido pela intelligentsia
sul-mato-grossense.
E, obviamente, nosso modesto e sincero tributo aos
baluartes do Pacto Pela Cidadania e movimentos congêneres nas saudosas memórias
de Dom José Alves da Costa, Padre Pasquale Forin, Padre Ernesto Saksida, Seu
Jorge José Katurchi, Doutor Hélio Sascher de Souza, Seu Augusto César Proença,
Doutor Lécio Gomes de Souza, Doutor Salomão Baruki, Professor Dilermando Luiz
Ferra, Seu Lincoln Gomes de Souza, Professora Heloísa Helena da Costa Urt e
Jornalista Márcio Nunes Pereira, entre outro(a)s não menos importantes.
Ahmad
Schabib Hany
Um comentário:
Scha, percebo poucas mulheres nesse relato... era mesmo o sul do Mato Grosso lugar dos homens bravos que fizeram as histórias acontecerem? ainda vou pensar melhor sobre isso... Esse seu relato tem muita conversa a fazer... muitas e muitas
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