sábado, 1 de abril de 2023

O REGIME DE 1º DE ABRIL DE 1964

O regime de 1º de abril de 1964

Ao contrário da versão oficial, o regime de 1964 foi fruto de um golpe militar-empresarial eclodido em 1º de abril, e, como o seu principal líder civil confessou em suas memórias, resultado de uma série de fakenews em que o então presidente João Goulart era demonizado. Este texto é parte de um artigo acadêmico que minha Irmã e eu publicamos na revista Perspectiva, da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Santa Catarina (UFSC).

Eram tempos cruentos, de medo, incertezas e desesperança. Mal havia sido deposto o presidente João Goulart, a falta de unidade política causou desgastes aos novos ocupantes do Palácio do Planalto. Os líderes do movimento de 1964 protagonizavam, já em 1967, sua primeira grande crise, em que saíra vitoriosa a chamada linha-dura, por meio da ascensão do marechal Arthur da Costa e Silva ao cargo do marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, que falecera, quatro meses depois de ter deixado a presidência, na colisão do monomotor em que viajava com um caça da esquadrilha da fumaça, nas circunvizinhanças de Fortaleza, sua terra natal.

A disputa renhida entre os poucos líderes civis, como os ex-governadores Carlos Lacerda, da Guanabara, e Magalhães Pinto, de Minas Gerais, pela candidatura à presidência da República pela UDN em 1966, arranhara o frágil arranjo político entre militares de diferentes correntes ideológicas e os desacreditados líderes civis do movimento. Nesse meio-tempo, Castelo Branco entregara a uma comissão de juristas a elaboração de um projeto de Constituição Federal de acordo com o pensamento que parecia ser reinante entre os ocupantes do Planalto, além de fazer aprovar uma nova Lei de Imprensa e uma nova Lei de Segurança Nacional, bem aos moldes da Doutrina da Segurança Nacional, emanada pelo Colégio Interamericano de Washington, que nortearia todos os governos do ciclo militar (de 1964 a 1985). Entretanto, cada dia o chefe do Executivo estava mais isolado em seu gabinete.

Não era para menos. A primeira experiência do regime com as urnas, em 1965, ainda com as velhas legendas, “depuradas” de líderes considerados inconvenientes pelo Planalto, não fora muito feliz. Sobretudo em Minas Gerais, com Israel Pinheiro, e na Guanabara, com Negrão de Lima, ambos apoiados por setores oposicionistas. Em Mato Grosso, não fora muito diferente, pois Lúdio Coelho, da UDN, sofrera derrota acachapante de Pedro Pedrossian, do PSD, o que lhe custou a pecha de ter recebido apoio dos “comunistas” em sua campanha.

“Comunistas”, aliás, eram vistos por todas as partes. Até mesmo dentro do próprio governo “revolucionário”, como se autointitulavam seus líderes (“Revolução de 31 de Março” era a autodenominação do golpe militar-empresarial de 1º de abril de 1964). À medida que se cindia o aparente monólito núcleo de poder de um país de dimensões continentais, qualquer desafeto era estigmatizado pelo adjetivo pejorativo assinalado no início deste parágrafo, de modo que a sua sorte estava selada (isto é, sua vida civil, ou carreira política, definitivamente execrada). Foi desse modo que Severo Gomes, empresário bem sucedido, dono da centenária fábrica de cobertores Parahyba, instalada por seus ancestrais em São José do Rio Preto (SP), ex-ministro da Agricultura de Castelo Branco e da Indústria e Comércio de Ernesto Geisel, cai em desgraça e é rotulado de “comunista” por suas posições nacionalistas e por divergir dos métodos pouco republicanos praticados por assessores invisíveis que queriam mandar mais que o chefe do Executivo, ainda que fosse marechal com relevantes serviços prestados ao Brasil.

Uma tentativa malograda de realizar o Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) num convento de frades dominicanos em Minas Gerais, em 1966, foi capaz de mobilizar um massivo contingente de cinco mil militares do Exército e da Polícia Militar, como estamparam jornais mineiros e a imprensa nacional. Curiosamente, o número de estudantes era infinitamente inferior a esse, cujas características físicas mais lembravam jovens esquálidos muito motivados, mas sem qualquer poder ofensivo à segurança nacional. Porém, o fato de o evento ter sido sediado no interior de um espaço da Igreja Católica, cujos dirigentes conservadores dois anos antes, na véspera do golpe, tinham colaborado decisivamente com diversas edições da “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, ganhou repercussão inimaginável junto ao núcleo político do regime, em franco endurecimento.

Nesse congresso estudantil, o campo-grandense Altino Rodrigues Dantas Júnior, ex-presidente da UNE, foi exibido como “troféu de guerra”, e bravamente defendido pelo então juiz-auditor da Justiça Militar da 9ª Região Plínio Barbosa Martins, irmão do deputado cassado da UDN (e depois do MDB) Wilson Barbosa Martins. Esse episódio ganhou relevância política porque fez estremecer, no seio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e de outras entidades da sociedade civil brasileira, o até então aparente monolitismo favorável ao novo regime. No entanto, setores recalcitrantes do regime, insatisfeitos com a postura de Plínio Martins nesse caso e no do Padre François Jacques Jentel, enviaram denúncia por meio do Centro de Informações do Departamento de Polícia Federal, com base em informe da Superintendência de Campo Grande (MT), ao ministro da Justiça para a sua cassação.

Nos Estados Unidos a Guerra do Vietnã levava a juventude à rebeldia e na Europa ocidental os heróis conservadores da Segunda Guerra Mundial como Charles De Gaulle e Hans-Christoph Seebohm convulsionavam as novas gerações desencantadas com a insólita intervenção soviética à Primavera de Praga, na Tchecoslováquia, rumo à sociedade alternativa (ou contracultura). No Brasil, a derrota da guerrilha na vizinha Bolívia e execução de seu líder carismático Ernesto Che Guevara, argentino que integrou o primeiro governo cubano pós-1959 ao lado de Fidel Castro e Camilo Cienfuegos, com a evidente intervenção de tropas estadunidenses em outubro de 1967, instigou parte da juventude engajada a integrar a resistência armada ao regime e aos grupos paramilitares como o Esquadrão da Morte (EM) e Operação Bandeirantes (Oban). Contudo, não foi uma decisão unânime: expressivos setores de esquerda se mantiveram contrários ao que chamavam de ações suicidas e de que faziam o jogo da ditadura. Mas foi a gota d’água para a já previsível fascistização do comando político e o distanciamento do país da normalidade democrática.

Além de infindáveis listas com a cassação de políticos da dimensão dos ex-presidentes da República Juscelino Kubitschek e Jânio Quadros (este confinado em Corumbá por três meses) e de líderes mato-grossenses de reputação ilibada como Wilson Barbosa Martins e Wilson Fadul, a mesma imprensa que saudara e promovera o regime passara a experimentar, em 1968, a volta da censura. Pela ânsia de passar ao cidadão comum a sensação de que tudo estava “sob controle”. Nem o ex-governador Carlos Lacerda, líder civil do golpe, escapara da autofagia dos novos detentores do poder: fora cassado por ousar formar a Frente Ampla, de modo a romper com o “bipartidarismo” instituído pelo Ato Institucional nº 2 (AI-2), em que surgiram partidos sem história, como Arena (Aliança Renovadora Nacional, de apoio incondicional aos mandarins de plantão) e MDB (Movimento Democrático Brasileiro, a “oposição confiável”).

Agravamento da tensão política e aprofundamento da divisão entre civis de diferentes correntes e de militares institucionalistas e os da “linha-dura”, que estavam aparentemente representados por Costa e Silva, tornam o ambiente político insustentável. Por outro lado, os oposicionistas mais críticos do regime passam a apostar na mobilização popular para barrar as cassações e o endurecimento do regime. Nesse fogo cruzado, o segundo chefe do Executivo começa seu isolamento em seu gabinete no Planalto, quando é divulgada nota de que “fora acometido de uma forte gripe” -- e que internamente era tratada como uma trombose –, fato que o leva a um impedimento de seis meses antes do anúncio de sua morte.

O endurecimento do regime levou à radicalização da oposição, antes institucionalista e tímida, depois altiva e ousada. Única legenda permitida, tida até então como “confiável”, o MDB passa a consolidar-se como uma frente democrática, em que seus membros integram diferentes blocos, como “autênticos”, “moderados”, “adesistas” etc. Isso tem um custo alto: os líderes mais combativos passam a sofrer algum tipo de retaliação, como os deputados Rubens Paiva – levado de casa à noite para prestar depoimento, desaparece depois de ter estado nas temidas instalações do Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), órgãos ligados ao Exército, e seu corpo não mais é encontrado –, Hermano Alves e Márcio Moreira Alves – que, como líder do MDB, fez um pronunciamento incisivo contra a ocupação da Universidade de Brasília (UnB) por tropas do Exército, o que serviu de pretexto para que os assessores mais duros de Costa e Silva pedissem à Câmara dos Deputados que desse licença para processá-lo por ofensa às Forças Armadas, mas que, pela negativa da Câmara Federal, convenceram o chefe do Executivo a fechar o Congresso Nacional para cassar deputados da oposição, editar o Ato Institucional nº 5, decretar a aposentadoria de três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e acabar com a inviolabilidade domiciliar e o instituto do habeas corpus como garantia individual para qualquer detenção.

As motivações centrais de 1964 só se materializariam em 1969, quando uma Junta Militar se afirmou como expressão autêntica dos artífices da ruptura constitucional, tendo à frente o general Emilio Garrastazu Médici, o mais duro da linha-dura. Então, o ministro do Trabalho, mais tarde da Educação e Cultura, coronel Jarbas Passarinho, ao lado do também coronel Mário Andreazza, dos Transportes, fazia o papel de porta-voz para a sociedade civil. Nesse contexto, a recém-outorgada Constituição de 1967 sofreu profundas alterações com a Emenda Constitucional de 1969, na verdade, uma nova Constituição, feita à imagem e semelhança da linha-dura, que tomara para si o comando do poder.

Passarinho, bastante hábil e sem farda, usava todos os seus argumentos para vender a ideia de que o acordo secreto, realizado em 1966, entre o Ministério da Educação e Cultura (MEC) e a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), era necessário e benéfico para o Brasil. Por conta disso, foram realizadas duas reformas para revogar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Federal nº 4.024/1961), a toque de caixa e sem a participação dos segmentos sociais interessados: a Lei da Reforma Universitária (Lei Federal nº 5.540/1968) e a Lei de Diretrizes de Bases do Ensino de 1º e 2º Graus (Lei Federal nº 5.692/1971).

Entre as principais mudanças introduzidas pela Lei da Reforma Universitária estão o fim da autonomia universitária, conquista histórica da comunidade acadêmica, e a mutação das universidades públicas em fundações, mantidas como empresas com fins lucrativos com o pretexto de não serem deficitárias. O anúncio dessas medidas causou tanta indignação no meio universitário, unindo docentes, servidores, alunos e intelectuais contrários ao projeto do regime, que anunciara o aumento do bandejão nos refeitórios universitários, mantidos pelo MEC. Uma mobilização, inimaginável naqueles tempos de chumbo, eclode e rompe o medo. Milhares de manifestantes tomam as ruas do Rio de Janeiro, e a tentativa de repressão por tropas da Polícia do Exército causa a morte de um jovem estudante, Edson Luiz de Lima Souto, no Restaurante do Calabouço, administrado pela União Metropolitana dos Estudantes do Rio de Janeiro.

A tragédia serviu como estopim para a eclosão de uma série de manifestações juvenis em todo o país, inclusive com o engajamento de universitários e intelectuais nas hostes de resistência à ditadura. A tensão aumenta quando o governador carioca Negrão de Lima apoia a histórica Passeata dos Cem Mil, em resposta à repressão e à morte de Edson Luiz, e da qual participaram intelectuais moderados, que até então não se haviam posicionado publicamente contra o regime cada vez mais autoritário e intolerante. O governo de Costa e Silva entra para a história como truculento e draconiano, pois não permitia o diálogo nem a liberdade: a invasão ao Congresso Nacional dos Estudantes em Ibiúna (SP), com a prisão, cassação e desaparecimento de seus dirigentes (entre eles Honestino Guimarães, então presidente da UNE), o fechamento do Congresso Nacional para cassar deputados da oposição, a decretação da aposentadoria de três ministros do Supremo Tribunal Federal e a outorga do temido Ato Institucional nº 5 (AI-5) marcam o desfecho de um governo vitimado por si mesmo.

Melhor articulado, Médici consegue desenvolver uma agenda propositiva, valendo-se para isso de uma propaganda sórdida, de perfil fascista. Marchinhas do tipo “Este é um país que vai pra frente” (composta e interpretada pela banda “Os Incríveis”, da Jovem Guarda) e “Eu te amo, meu Brasil” (composta por Don, da dupla Don e Ravel, e interpretada por “Os Incríveis”) e os slogans “O Brasil é feito por nós”, “Brasil, ame-o ou deixe-o” tomam conta dos meios radiofônicos, televisivos e salas de cinema, enquanto jornais, revistas e livros são amordaçados pela censura e as empresas editoras compensadas por fartas verbas da propaganda governamental com igual propósito: é proibido questionar atos do governo. Ao iniciar sua gestão,vale-se da campanha do Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), que também contava com uma marchinha, “Você também é responsável, então me ensina a escrever...”, composta e interpretada pela dupla de cantores Don e Ravel.

Apoiado no “milagre econômico”, o até então obscuro economista Antônio Delfin Netto, poderoso homem da Fazenda e aliado do todo-poderoso estrategista do Planejamento, João Paulo dos Reis Veloso, empreendem uma ousada campanha ufanista, bem nos moldes do Mobral, tendo como foco o “sonho da casa própria” (por meio do Sistema Financeiro de Habitação, materializado no Banco Nacional de Habitação, BNH, extinto nos primeiros anos da Nova República) e do acesso creditício para a aquisição do fusca, “o primeiro carro do trabalhador brasileiro”. Essa equação havia sido obtida quase compulsoriamente com o setor financeiro e industrial, aliados de primeira hora que não podiam “abandonar o barco”.

Com a ajuda pública da à época Confederação Brasileira de Desportos (CBD), a Seleção Brasileira de Futebol com todos os seus craques, tricampeões mundiais, transforma a conquista da Taça Jules Rimet em “vitória da revolução”. O carro-chefe da propaganda era o “hino” feito pelo radialista Miguel Gustavo Werneck de Souza Martins para a Copa do Mundo de 1970, no México, “Noventa milhões em ação / pra frente, Brasil / do meu Coração... / Todos juntos vamos / pra frente, Brasil / Salve a Seleção...” Até Pelé, celebrado como rei do futebol, vira garoto-propaganda do partido do regime, a Arena, e percorre o país declarando seu amor pelo Brasil. Irônicos, os críticos do regime diziam “onde a Arena vai mal, um jogo do [Campeonato] Nacional; onde a Arena vai bem, um jogo também”.

Dentro de uma estratégia de marketing nunca antes vista no Brasil, um conjunto de megaprojetos de infraestrutura foi lançado. E “desbravar a Amazônia” passou a ser a palavra de ordem, por meio de um ousado projeto de colonização e a construção natimorta da Transamazônica, bem como obras igualmente megalomaníacas como a Ponte Rio-Niterói e algumas usinas hidrelétricas, como a de Urubupungá e o anúncio de Itaipu e Tucuruí, foram parte do “Brasil potência”, fruto da pujança dos patriotas no poder. Para dar ideia de distribuição de renda e modernidade, houve um alardeado projeto de casas populares que ficou no elefante branco do Banco Nacional de Habitação (BNH), que mais beneficiou bancos privados e construtoras, além da adoção do fusca como “o carro popular” do brasileiro (o mesmo Volkswagen que a propaganda nazista usou na Alemanha de Hitler).

Mas não faltaram escândalos para ofuscar o brilho do triunfalismo auriverde do regime tão logo encerrou o apoteótico e truculento mandato de Médici. Com extrema habilidade, o general Ernesto Geisel, secundado pelo estrategista e ideólogo de 1964 -- general Golbery do Couto e Silva, de volta para o primeiro escalão depois de ter sido defenestrado junto de Castelo Branco --, mostra para a sociedade brasileira que em seu governo os superministros Delfin Netto, Jarbas Passarinho e Mário Andreazza seriam, sim, responsabilizados por abusos cometidos no período anterior. Em abril de 1974, um mês depois de ter tomado posse, Geisel determina que seu ministro da Fazenda, Mário Henrique Simonsen, anunciasse o primeiro de uma série de escândalos financeiros que viriam à tona, que foi o emblemático Caso Halles, em que o Banco Halles de Investimento foi pivô, como explica o jornalista econômico Aloysio Biondi, no semanário Opinião, um dos mais censurados da época, em 29 de abril de 1974.

A fascistização do regime não foi clemente com os pensadores da Educação, aos quais cobrou elevado ônus, não só pela supressão das liberdades de pensamento e de organização, mas pelas mais comezinhas garantias fundamentais, como a de expressão e de ir e vir. Nesse período, baluartes da dimensão de Paulo Freire e Darcy Ribeiro precisaram partir para o exílio a fim de poder sobreviver a esse verdadeiro extermínio intelectual. Anísio Teixeira, um dos maiores pensadores e empreendedores brasileiros do século XX, teve destino diferente: quando, já aposentado, se preparava para concorrer a uma vaga na Academia Brasileira de Letras, em março de 1971, foi sequestrado, torturado e morto por grupos paramilitares, tendo sido seu corpo encontrado, dias depois, no fosso do elevador do edifício em que morava seu amigo Aurélio Buarque de Holanda, no Rio de Janeiro. Seus algozes não levaram em conta a sua saúde frágil e muito menos seu imenso legado para o Brasil e a humanidade ao sentenciá-lo impunemente à morte, sem o mínimo respeito pela dignidade humana, pela qual dedicara a própria vida.

Por outro lado, o golpe militar protagonizado na vizinha Bolívia em meados de agosto de 1971 por dois influentes coronéis do exército -- Hugo Banzer Suárez e Andrés Selich Shop, ambos de ascendência alemã --, com a posse do imediatamente promovido a general Banzer em 19 de agosto daquele ano, aproximou os dois generais-presidentes. Em janeiro de 1972, Médici e Banzer se encontram em Corumbá e Ladário, marco da retomada das negociações constantes do denunciado Acordo de Roboré pela bancada da UDN no Congresso Nacional. A partir de então, reiniciam-se as negociações por um acordo energético com base em petróleo e gás natural, somente concluídas no governo do presidente Itamar Franco, em 1994, com seu colega Jaime Paz Zamora, em plena vigência do Estado Democrático de Direito.

O alinhamento da Bolívia ao bloco de regimes militares sul-americanos sob influência estadunidense na Guerra Fria ofereceu outra face integracionista latino-americana, como a contrapor a tendência progressista pós-guerra de 1945. Assim, além da realização de acordos bilaterais sobre energia, desenvolvimento tecnológico, cooperação recíproca e ações políticas de eliminação de opositores “inconvenientes”, esta região fronteiriça ganha maior ênfase nos programas de convênio cultural entre universidades brasileiras e bolivianas. Por causa do recesso compulsório de três anos decretado por Banzer às universidades bolivianas, estudantes bolivianos constituíam na década de 1970 mais de 15% dos alunos das instituições públicas brasileiras (federais e estaduais), inclusive em Mato Grosso.

W. & A. Schabib Hany

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