Comemorando o quê?
Aquele que admitiu a um seleto grupo de
investidores não levar ‘jeito’ para o cargo estava indisfarçavelmente
exultante, três dias depois de confirmada oficialmente a execução do Jornalista
Dom Philips e do Indigenista Bruno Pereira, numa ‘motociata’ na capital do
estado em que as vítimas foram alvo de tocaia, para perplexidade da opinião
pública internacional.
Que não leva ‘jeito’ para o mais importante cargo
da República, isso nunca foi novidade. Não é preciso ser um expert para
constatar os estragos de um político que diz não ser político, mas não só
passou quase toda a vida vivendo da política como enfiou quase toda a sua prole
na política. E agora, em pleno exercício do cargo, participa acintosa e
indisfarçavelmente exultante de uma ‘motociata’ com apoiadores em Manaus, três
dias depois de oficialmente ter sido confirmada execução com requintes de
crueldade, no extremo oeste do Amazonas, do Jornalista Dom Philips e do
Indigenista Bruno Pereira, dois defensores da Amazônia pelos quais o mundo
voltou sua preocupação sobre o Brasil.
Teria havido algum compromisso público inadiável,
como dignitário, na capital do estado em que foram vitimados os reconhecidos
defensores da Amazônia, do patrimônio natural por ela representado e dos povos
da floresta?
Quando, no início de 2021, a covid-19 fizera do
Amazonas o epicentro da pandemia e as pessoas infectadas pelo novo coronavírus
padeciam por falta de oxigênio e remédios para assegurar a sobrevivência dos
doentes, teria ele se deslocado com igual presteza a fim de demonstrar o apoio
e a solidariedade da principal autoridade às vítimas e às famílias enlutadas?
Como perguntar não ofende, será que seus assessores
mais próximos lhe explicaram alguma vez que, assim como a Vida é princípio de
direitos, o princípio da dignidade humana faz parte das cláusulas pétreas da
carta constitucional de todo Estado de Direito digno do nome?
A opinião pública internacional, sobretudo os
colegas dele, está com seu olhar voltado para o Brasil, até porque apenas
começaram as investigações sobre mais essa vergonhosa iniciativa das quadrilhas
que vivem das ilegalidades e agora se sentem representadas e incentivadas por
muitos integrantes do primeiro escalão do atual inquilino do Palácio do
Planalto, muitos deles célebres por fazerem apologia à impunidade, como ‘deixar
passar a boiada’.
A propósito, esse ex-ministro do Meio Ambiente que
ganhou a triste notoriedade pela ousada soberba ao pretender ensinar o ardil da
prevaricação, gravada em vídeo oficial de uma reunião ministerial judicialmente
tornado público, recebeu alguma sanção de alguma instituição republicana?
Qualquer cidadão medianamente informado sabe que
todo servidor público, inclusive o detentor do mais alto cargo da República,
deve cumprir com o que a lei determina e também observar os protocolos
condizentes com a função pública e, sobretudo, as mais comezinhas regras de
comportamento e normas de urbanidade e empatia comuns a todos os seres humanos
do planeta. Sabemos todos, também, que nem nos momentos mais críticos da
pandemia de covid-19 ele demonstrou qualquer gesto espontâneo de empatia e
solidariedade.
Deixemos de hipocrisia: não se trata de uma
coincidência inocente o regozijo em mais uma ‘motociata’, desta feita em
Manaus, capital do estado em que Dom Philips e Bruno Pereira foram
martirizados. Trata-se da expressão mais autêntica da abominável coalizão de
hordas saídas dos fétidos porões embolorados da história que conseguiram tirar
do âmago os sentimentos mais canhestros que todo humano pode trazer em seu
subconsciente.
Não é demais trazer para estes tempos sombrios o
emblemático Sermão da Montanha, em que Jesus ensina as bases da Doutrina
Cristã, sintetizada em Mateus 5:39: “Mas eu lhes digo: Não resistam ao
perverso. Se alguém o ferir na face direita, ofereça-lhe também a outra.”
Portanto, não é cristão o comportamento daqueles que recorrem à violência com
requintes de crueldade contra os que veem como inimigos por estarem em posições
antagônicas, mas nem por isso ilegítimas, na defesa da Amazônia, sua
biodiversidade e proteção dos povos da floresta, como Dom Philips e Bruno
Pereira.
E todo cuidado é pouco quando se trata de
reconhecidas figuras dessas hordas que vivem a tergiversar as Escrituras
ao sabor de interesses inconfessáveis, como os fariseus denunciados por Jesus
em diversas ocasiões, alguns deles envolvidos nas acusações que levaram Pôncio
Pilatos, em nome do Império Romano, a prender e condenar Jesus.
Ahmad Schabib Hany
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