EDUCAÇÃO
PARA AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS, PRIORIDADE INADIÁVEL
Neste Dia da Consciência Negra,
em tempos sombrios de inspiração fascista (e por isso racista), é fundamental
resgatar a Educação para as Relações Étnico-raciais, prevista em lei mas descumprida
acintosamente desde o golpe de 2016.
O Dia da Consciência Negra é, antes de tudo,
oportunidade para celebrar, sim, o triunfo do movimento negro sobre as ruínas
da sociedade escravocrata que erigiu um país cheio de contradições, a despeito
de seu Povo (com letra maiúscula) generoso, determinado, alegre e
incansavelmente transformador. Desde meados da década de 1990, estados e
municípios brasileiros reverenciam o dia 20 de novembro, em vez de 13 de maio,
quando a história oficial consignou como o Dia da Lei Áurea, minimizando o
papel dos líderes abolicionistas e a luta do povo escravizado por sua liberdade
e autodeterminação.
Fruto da luta incessante de grandes paradigmas da
igualdade racial desde os tempos de Zumbi dos Palmares e de Esperança Garcia (a
primeira advogada negra), importantes conquistas foram consolidadas, sobretudo
ao longo das últimas décadas, entre elas a política de cotas raciais e a
obrigatoriedade da oferta das disciplinas História e Cultura da África e
Educação para as Relações Étnico-Raciais. Porém, todas as políticas de reparação
e igualdade racial foram abandonadas desde o golpe de 2016 (aquele em que
Michel Temer, com o sinal verde de Joe Biden, se mancomunou com o ex-deputado Eduardo
Cunha para depor Dilma Rousseff da Presidência e a corja da Leva Jeito tramou
para a prisão arbitrária de Luiz Inácio Lula da Silva a fim de tirá-lo das
eleições de 2018, e que deu no que deu: um inepto desequilibrado atentando
contra o Brasil).
Estabelecida por leis federais de 2003 e 2009, as
referidas disciplinas são, de longe, os melhores instrumentos de desconstrução
do chamado racismo estrutural e instrumento de formação das novas gerações,
libertas de toda sorte de preconceitos e condutas do tempo da casa-grande e da
senzala. Foram resultado de muito estudo de cidadãs que se dedicaram por
décadas, como a Professora Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva, uma das
pioneiras dessa iniciativa. Lamentavelmente, muitos doutores e mestres da
academia não se aperceberam da importância dessa estratégia para a formação das
novas gerações (não só de professores, mas, sobretudo, de cidadãos libertos do
atraso).
Nestes tempos sombrios em que hordas fascistas - e
racistas, obviamente -
atentam contra o Estado Democrático de Direito e todas as emblemáticas
conquistas das últimas décadas, mais que nunca é necessário resgatar as
disciplinas mencionadas e pô-las em prática, oferecê-las não só nas
licenciaturas, como estabelece a legislação, mas também no ensino médio. É para
fortalecer a formação não racista e em favor da diversidade étnica e cultural
que faz do Brasil uma potência em processo de afirmação.
Hipocrisia às favas, é passada da hora de o Brasil
se reencontrar com sua História e se propor a acabar com o racismo - base
das elites que se tornaram endinheiradas, mas não necessariamente ‘civilizadas’,
eis que não abandonaram sua ‘santa’ ignorância -,
que vitima cínica e acintosamente afrodescendentes e originários sem despertar
qualquer sentimento sincero de caridade ou comiseração de fundamentalistas
neopentecostais que saíram dos porões do atraso para ressuscitar uma nova
inquisição em pleno século XXI. É, aliás, o que se vê na postura cínica e
provocadora do sinistro da ‘Inducassão’ do ser que atrasa a nação: foi até a
Comissão de Educação da Câmara dos Deputados para ofender e ameaçar aqueles que
têm coragem de desmentir o tal cristão de araque, em vez de demonstrar
qualificação e dizer que irá apurar as denúncias.
Enquanto pseudopatriotas e pseudocristãos torram
os cofres públicos sem qualquer critério republicano (é como se o dinheiro
público a eles pertencesse e eles tivessem carta-branca, ou cheque em branco,
para malversar ao sabor da ocasião), milhões de brasileiros entram para a
indigência, para a fome e a miséria, quando o Brasil desde 2010 saíra do mapa
da pobreza e servia de exemplo para o mundo. Pior: quando se trata de racismo,
como nunca a violência sistemática contra afrodescendentes e originários se
torna corriqueira (basta ver as estatísticas vergonhosas de 2019 e 2020). E, se
falarmos em políticas ambientais e de ciência e tecnologia, pior ainda - foi
flagrada na sexta-feira, dia 19, a má-fé do gestor federal, que propositalmente
protelou a divulgação dos dados do desmatamento dos últimos 12 meses, retardados
para não coincidir com a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças
Climáticas de Glasgow, Escócia.
Com o resgate da política proativa e afirmativa
dos anos de ouro do início do milênio, o Brasil então estará reencontrando-se
com sua vocação natural, ser a potência de paz, da concórdia, da justiça
social. Obviamente, para isso será necessário apear os monstrengos que
infelicitam a nação, a começar pelo falso messias. Não é sem tempo virar a
página infestada de ódio, perversidade, má-fé e, sobretudo, fascismo, puro
fascismo. Lembro-me, como se fosse hoje, o saudoso Professor Euro Nunes
Varanis, em 1972, com seu lindo pensamento (cuja autoria nunca vi em livro, ou
hoje Google, algum, portanto, de sua lavra): “O ódio não destrói o ódio. Só o
amor destrói o ódio. Seja abençoado o sândalo que destrói o ódio.”
Ahmad
Schabib Hany
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