CRISE NO MPF
"Dallagnol não se preocupa com crise, pois seu salário está
garantido", diz Eugênio Aragão
Por
Sérgio Rodas
Postado em 31 dez. 2016, 13h28
O ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão afirmou
ao chefe da força-tarefa da operação “lava jato”, Deltan Dallagnol, que ele e
os demais procuradores da República que atuam no caso ajudaram a jogar a
economia brasileira no buraco, mas que não se preocupam com isso porque “seus
empregos não correm risco”.
Para Eugênio Aragão, Deltan Dallagnol tem que
"baixar a bola" e atuar com discrição.
Reprodução
Em carta aberta a Dallagnol, Aragão — que
também é procurador da República — criticou a postura messiânica dele nas redes
sociais. Recentemente, o membro da força-tarefa da “lava jato” chamou a atenção
daqueles que “vestem a camisa do complexo de vira-lata” e disse era “possível
um Brasil diferente”.
Para o ex-ministro da Justiça, quem tem
complexo de vira-lata, na verdade, são os integrantes do Ministério Público
Federal que atuam no caso. A seu ver, eles idolatram os EUA sem conhecer a
história desse país, que foi, pelo menos, tão “banhado em sangue” quanto o
Brasil.
E essa idolatria aos norte-americanos e a
atitude moralista de Dallagnol e seus colegas jogou o Brasil em uma recessão
que já dura três anos e acabará por dar as chaves do mercado da construção
civil a empresas dos EUA, declara Aragão.
“E vocês, narcisos, se acham lindinhos por
causa disso, né? Vangloriam-se de terem trazido de volta míseros dois bilhões
em recursos supostamente desviados por práticas empresariais e políticas
corruptas. E qual o estrago que provocaram para lograr essa casquinha? Por
baixo, um prejuízo de 100 bilhões e mais de um milhão de empregos riscados do
mapa. Afundaram nosso esforço de propiciar conteúdo tecnológico nacional na
extração petrolífera, derreteram a recém-reconstruída indústria naval
brasileira.”
De acordo o último ministro da Justiça de Dilma
Rousseff, Dallagnol, “à frente de sua turma, vai entrar na história como quem
contribuiu decisivamente para o atraso econômico e político que fatalmente se
abaterão sobre nós”.
Porém, o chefe da força-tarefa da “lava jato”
não deve estar preocupado com a situação econômica do país, avalia Aragão.
Afinal, “não são os seus empregos que correm risco”, diz ele ao seu colega de
MPF. E eles não têm do que reclamar, ressalta o ex-ministro. Isso porque os
integrantes do órgão ganham “muito bem”, recebem auxílios alimentação e moradia
no valor de quase R$ 1 mil cada um e mais um “ilegal” auxílio-moradia “tolerado
pela morosidade do Judiciário que vocês tanto criticam”.
“Vivemos numa redoma de bem-estar. Por isso,
talvez, à falta de consciência histórica, a ideologia de classe devora sua
autocrítica. E você e sua turma não acham nada demais se milhões de famílias
não conseguirem mais pagar suas contas no fim do mês, porque suas mães e seus
pais ficaram desempregados e perderam a perspectiva de se reinserirem no
mercado num futuro próximo”, acusa Aragão.
E mais: Eugênio Aragão diz na carta que seus
colegas de MPF usaram a bandeira do “combate à corrupção” como cortina de
fumaça para derrubar Dilma Rousseff e aumentar o poder dos promotores e
procuradores. Na visão do ex-ministro, eles também erraram o alvo ao fixar a
corrupção como o pior problema do Brasil, quando esse “troféu” é, na realidade,
da desigualdade econômico-social.
Devido a isso tudo, Aragão pede que Deltan
Dallagnol “baixe a bola”, pare de perseguir o ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva e de “fazer teatro com PowerPoint”. “Faça seu trabalho em silêncio,
investigue quem tiver que investigar sem alarde, respeite a presunção de
inocência, cumpra seu papel de fiscal da lei e não mexa nesse vespeiro da
demagogia, pois você vai acabar ferroado. Aos poucos, como sempre, as máscaras
caem e, ao final, se saberá quem são os que gostam do Brasil e os que apenas
dele se servem para ficarem bonitos na fita! Esses, sim, costumam padecer do
complexo de vira-lata!”, finaliza.
Outros
ataques
Essa não é a primeira carta de Eugênio Aragão a
um integrante do MPF. Em setembro, o ex-ministro da Justiça enviou missiva ao
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apontando que sua atuação não
condiz com o que ele pregava antes de chegar ao cargo.
De acordo com Aragão, se antes ele era crítico
da postura adotada pelo MPF durante a Ação Penal 470, o processo do mensalão,
ele repete a fórmula de crucificar acusados na operação “lava jato”.
Posteriormente, Eugênio Aragão acusou o juiz
federal Sergio Moro, responsável pelos processos da operação “lava jato”, de
ser um criminoso. Em mensagem enviada ao professor alemão Markus Pohlmann, cuja
universidade (de Heidelberg) recebeu o juiz para uma palestra, Aragão afirma
que “Moro é um criminoso, também sob a perspectiva alemã. Ele se tornou punível
quando violou sigilo funcional, para não falar em prevaricação”.
O e-mail do ex-ministro foi enviado junto com
uma carta, assinada por 28 professores de Direito, História e Ciência Política,
que questiona o fato de a Universidade de Heidelberg convidar Moro para falar
sobre combate à corrupção. O evento ocorreu no dia 9 de dezembro, mas a carta
foi enviada no dia 6. O documento elenca acusações contra o juiz da 13ª Vara
Federal de Curitiba.
Além de citarem que Moro determinou a ilegal
condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para depor e
vazou, “criminosamente”, gravações de conversas entre Lula e a então presidente
Dilma Rousseff, os professores dizem que o juiz viola a Constituição, leis e a
soberania nacional, entregando informações à Justiça dos Estados Unidos, “com
quem dialoga frequentemente, sobre andamento de processos brasileiros,
permitindo que réus brasileiros firmem acordo de colaboração com a justiça dos
EUA, em detrimento do interesse das empresas nacionais brasileiras”.
Leia
abaixo a íntegra da carta:
Carta aberta ao jovem colega Deltan Dallagnol
"Dennnichtsistschwerer
und nichtserfordertmehrCharakter, alssich in offenemGegensatzzuseiner Zeit
zubefinden und lautzusagen: Nein."
(Porque nada é mais difícil e nada exige mais
caráter que se encontrar em aberta oposição a seu tempo e dizer em alto e bom
som: Não!)
Kurt
Tucholsky
Caro colega,
Acabo de ler por blogs de gente séria que você
estaria a chamar atenção, no seu perfil de Facebook, de quem "veste a
camisa do complexo de vira-lata", que seria "possível um Brasil
diferente" e que a hora seria agora. Achei oportuno escrever-lhe esta
carta pública, para que nossa sociedade saiba que, no Ministério Público, há
quem não bata palmas para suas exibições de falta de modéstia.
Vamos falar primeiro do complexo de vira-lata.
Acredito que você e sua turma sejam talvez os que menos autoridade têm para
falar disso, pois seus pronunciamentos são a prova mais cabal de SEU complexo
de vira-lata. Ainda me lembro daquela pitoresca comparação entre a colonização
americana e a lusitana em nossas terras, atribuindo à última todos os males da
baixa cultura de governação brasileira, enquanto o puritanismo lá no Norte
seria a razão de seu progresso. Talvez você devesse estudar um pouco mais de
história, para depreciar menos este país. E olha que quem cresceu nas
"Oropas" e lá foi educado desde menino fui eu, hein... talvez por
isso não falo essa barbaridade, porque tenho consciência de que aquele pedaço
de terra, assim como a de seu querido irmão do Norte, foram os mais banhados de
sangue humano ao longo da passagem de nossa espécie por este planeta. Não
somos, os brasileiros, tão maus assim: na pior das hipóteses somos iguais,
alguns somos descendentes dos algozes e a maioria somos descendentes das
vítimas.
Mas essa sua teorização vulgar não diz tudo
sobre SEU complexo. Você à frente de sua turma vai entrar na história como quem
contribuiu decisivamente para o atraso econômico e político que fatalmente se
abaterão sobre nós. E sabe por que? Porque você e sua turma são ignorantes e
não conseguem enxergar que o princípio fiatiustitia
et pereatmundus nunca foi aceito por sociedade sadia qualquer neste mundão
de Deus. Summum jus, summainiuria, já
diziam os romanos: querer impor sua concepção pessoal de justiça a ferro e fogo
leva fatalmente à destruição, à comoção e à própria injustiça.
E o que vocês conseguiram de útil neste País
para acharem que podem inaugurar um "outro Brasil", quiçá melhor do
que aquele em que vivíamos? Vocês conseguiram agradar ao irmão do Norte, que
faturará bilhões de nossa combalida economia, e conseguiram tirar as empresas
nacionais do mercado global altamente competitivo da construção civil de
grandes obras de infraestrutura. Tio Sam agradece. E vocês, narcisos, se acham
lindinhos por causa disso, né? Vangloriam-se de terem trazido de volta míseros
dois bilhões em recursos supostamente desviados por práticas empresariais e
políticas corruptas. E qual o estrago que provocaram para lograr essa
casquinha? Por baixo, um prejuízo de 100 bilhões e mais de um milhão de
empregos riscados do mapa. Afundaram nosso esforço de propiciar conteúdo
tecnológico nacional na extração petrolífera, derreteram a recém-reconstruída
indústria naval brasileira.
Claro, não são seus empregos que correm risco.
Ganhamos muito bem no Ministério Público, temos auxílio-alimentação de quase
mil reais, auxilio-creche com valor perto disso, um ilegal auxílio-moradia
tolerado pela morosidade do Judiciário que vocês tanto criticam. Temos um
fantástico plano de saúde e nossos filhos podem frequentar a liga das melhores
escolas do País. Não precisamos de SUS, não precisamos de Pronatec, não
precisamos de cota nas universidades, não precisamos de Bolsa-Família e não
precisamos de Minha Casa, Minha Vida. Vivemos numa redoma de bem-estar. Por
isso, talvez, à falta de consciência histórica, a ideologia de classe devora
sua autocrítica. E você e sua turma não acham nada demais se milhões de
famílias não conseguirem mais pagar suas contas no fim do mês, porque suas mães
e seus pais ficaram desempregados e perderam a perspectiva de se reinserirem no
mercado num futuro próximo.
Mas você achou fantástico o acordo com os
governos dos EEUU e da Suíça, que permitiu-lhes, na contramão da prática diplomática
brasileira, se beneficiar indiretamente de um asset sharing sobre produto de corrupção de funcionários
brasileiros e estrangeiros. Fecharam esse acordo sem qualquer participação da
União, que é quem, em última análise, paga a conta de seu pretenso heroísmo
global, e repassaram recursos nacionais sem autorização do Senado. Bonito,
hein? Mas, claro, na visão umbilical corporativista de vocês, o Ministério
Público pode tudo e não precisa se preocupar com esses detalhes burocráticos
que só atrasam nosso salamaleque para o irmão do Norte! E depois você fala de
complexo de vira-lata dos outros!
O problema da soberba, colega, é que ela cega e
torna o soberbo incapaz de empatia.Mas como neste mundo vale a lei do retorno,
o soberbo também não recebe empatia, pois seu semblante fica opaco, incapaz de
se conectar com o outro.
A operação de entrega de ativos nacionais ao
estrangeiro, além de beirar alta traição, esculhambou o Brasil como nação de
respeito entre seus pares. Ficamos a anos-luz de distância da admiração que
tínhamos mundo afora. Vocês atropelaram a Constituição: segundo ela, compete à
presidenta da República manter relações com Estados estrangeiros, não ao
musculoso Ministério Público. Daqui a pouco vocês vão querer até uma
representação diplomática nas capitais do circuito Elizabeth Arden, não é?
Ainda quanto a um Brasil diferente, devo-lhes
lembrar que "diferente" nem sempre é melhor e que esse servicinho de
vocês foi responsável por derrubar uma presidenta constitucional honesta e
colocar em seu lugar uma turba envolvida nas negociatas que vocês apregoam
mídia afora. Esse é o Brasil diferente? De fato é: um Brasil que passou a
desrespeitar as escolhas políticas de seus vizinhos e cultivar uma diplomacia
da nulidade, pois não goza de qualquer respeito no mundo. Vocês ajudaram a
sujar o nome do país. Vocês ajudaram a deteriorar a qualidade da governação, a
destruição das políticas inclusivas e o desenvolvimento sustentável pela
expansão de nossa infraestrutura com tecnologia própria.
E isso tudo em nome de um "combate"
obsessivo à corrupção. Assunto do qual vocês parecem não entender bulhufas!
Criaram, isto sim, uma cortina de fumaça sobre o verdadeiro problema deste
pais, que é a profunda desigualdade social e econômica. Não é a corrupção. Esta
é mero corolário da desigualdade, que produz gente que nem vocês, cheios de
"self righteousness", fariseus com apretensão de serem justos e
infalíveis, donos da verdade e do bem estar. Gente que pode se dar ao luxo de
atropelar as leis sem consequência nenhuma. Pelo contrário, ainda são
aplaudidos como justiceiros.
Com essa agenda menor da corrupção vocês
ajudaram a dividir o país, entre os homens de bem e os safados, porque vocês
não se limitam a julgar condutas como lhes compete, mas ousam julgar pessoas,
quando estão longe de serem melhores do que elas. Vocês não têm capacidade de
ver o quanto seu corporativismo é parte dessa corrupção, porque funciona sob a
mesma gramática do patrimonialismo: vocês querem um naco do Estado só para
chamar de seu. Ninguém os controla de verdade e vocês acham que não devem
satisfação a ninguém. E tudo isso lhes propicia um ganho material incrível, a
capacidade de estarem no topo da cadeia alimentar do serviço público. Vamos
falar de nós, os procuradores da República, antes de querer olhar para a cauda
alheia.
Por fim, só quero pontuar que a corrupção não
se elimina. Ela é da natureza perversa de uma sociedade em que a competição se
faz pelo fator custo-benefício, no sentindo mais xucro. A corrupção se
controla. Controla-se para não tornar disfuncionais o Estado e a economia. Mas
esse controle não se faz com expiação de pecados. Não se faz com discursinho
falso-moralista. Não se faz com homilias em igrejas. Faz-se com reforma
administrativa e reforma política, para atacar a causa do fenômeno e não sua
periferia aparente. Vocês estão fazendo populismo, ao disseminarem a ideia de
que há o "nós, o povo" de honestos brasileiros, dispostos a enfrentar
o dragão da corrupção como um São Jorge redivivo. Você e eu sabemos que não
existe isso e que não existe, com sua artificial iniciativa popular das
"10 medidas", solução viável para o problema. Esta passa pela revisão
dos processos decisórios e de controle na cadeia de comando administrativa e
pela reestruturação de nosso sistema político calcado em partidos que não
merecem esse nome. Mas isso tudo talvez seja muito complicado para você e sua
turma compreenderem.
Só um conselho, colega: baixe a bola. Pare de
perseguir o Lula e fazer teatro com PowerPoint.
Faça seu trabalho em silêncio, investigue quem tiver que investigar sem alarde,
respeite a presunção de inocência, cumpra seu papel de fiscal da lei e não mexa
nesse vespeiro da demagogia, pois você vai acabar ferroado. Aos poucos, como
sempre, as máscaras caem e, ao final, se saberá quem são os que gostam do
Brasil e os que apenas dele se servem para ficarem bonitos na fita! Esses, sim,
costumam padecer do complexo de vira-lata!
Antes da próxima homilia diante de
correligionários incautos, reflita sobre a lição do Evangelho:
"Por que reparas no cisco que está no olho do teu irmão,
quando não percebes a trave que está no teu? Ou como poderás dizer ao teu
irmão: 'Deixa-me tirar o cisco do teu olho', quando tu mesmo tens uma trave no
teu? Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então verás bem para tirar
o cisco do olho do teu irmão." (Evangelho
segundo São Mateus 7, 3-5)
Um forte abraço de seu colega mais velho e com
cabeça dura, que não se deixa levar por essa onda de "combate" à
corrupção sem regras de engajamento e sem respeito aos costumes da guerra.
Eugênio
José Guilherme de Aragão”
Compartilhado do Amigo Joel de Carvalho Moreira
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