quarta-feira, 3 de julho de 2024

PATRIOTAS OU ESPECULADORES?

Patriotas ou especuladores?

A alta do dólar dos últimos trinta dias é mais uma arapuca que os ‘patriotas’, em conluio com os ‘bonitões’ da Faria Lima de Sampa, estão a colocar ao Presidente Lula como sabotagem ao projeto de reconstrução do País. Mas, afinal, quem é mesmo quem ganha com a especulação financeira?

Nos últimos trinta dias o dólar teve uma alta de ‘apenas’ 7% -- sete por cento! --, e o tal ‘presidente autônomo’ do Banco Central do Brasil simplesmente não vendeu dólares para segurar essa alta. Isso, aliás, ele mesmo fizera ao longo do último semestre do mandato do inominável, que não só o indicou como criou a lei da ‘autonomia’ do Banco Central, a pedido da ‘mão invisível’ do mercado e o beneplácito do ‘posto Ipiranga’ -- ministro da Economia Paulo Guedes, aquele que foi ‘estagiário’ de Augusto Pinochet em sua juventude --, para felicidade dos ‘patriotas’ que não têm quaisquer escrúpulos para atingir seus nada patrióticos propósitos: sabotar o processo de reconstrução do País e alimentar a insaciável ganância dos ‘homens de bem, os ‘bonitões’ da Avenida Faria Lima, maior concentração por metro quadrado de especuladores e agiotas do Planeta.

Que o Presidente Lula está cercado por todos os lados, isso nunca foi novidade desde antes de sua posse. A intentona do inominável de 8 de janeiro de 2023 é apenas uma das facetas do inverossímil contexto político que revela a truculência e o acinte das elites ‘nacionais’ -- na verdade, enxerto de abutres do império do caos com herdeiros dos anhangueras coloniais, criminosos vindos para o Brasil por crimes infames, considerados irrecuperáveis, e se na colônia lusitana tivessem a sorte ou a esperteza de sobreviver teriam conquistado a sua segunda chance (pelo visto, os piores deles, tal a sua capacidade de conseguir impor a sua nefasta pretensão, de passar o outro para trás).

Não é demais lembrar o/a leitor/a quem foi o tal ‘Anhanguera’ (Diabo Velho, por ter ameaçado indígenas da região de Goiás usando álcool como se fosse água para atear fogo nos rios), isto é, Bartolomeu Bueno da Silva, e seus iguais, entre eles Antônio Raposo Tavares e Domingos Jorge Velho, mostrados na historiografia como heróis, mas nunca passaram de criminosos que cobiçaram terras, riquezas e até os corpos dos indígenas para escravizá-los. O caso de Domingos Jorge Velho, é bom que o leitor saiba, foi escabroso: depois de várias tentativas frustradas, ele foi responsável pela destruição do Quilombo dos Palmares, aprisionamento e morte com requintes de crueldade de Zumbi, o líder dos escravizados emancipados do jugo e que fundaram um território livre para viverem livres.

Essas são, na ascendência, as ‘famílias quatrocentonas’ de São Paulo, a nata das elites do País, até hoje desacostumados à legalidade -- ao império da lei, aos ditames do arcabouço jurídico do País, enfim, ao Estado de Direito --, mas aos seus caprichos de paus mandados do rei e de sua corte parasita. Praticamente cinco séculos de contravenção, vandalismo e cobiça desmedida, os tais ‘homens de bem’, seja da Avenida Faria Lima ou de qualquer ‘área nobre’ deste país-continente, não conhecem o que seja pensar no País, em seus conterrâneos e, sobretudo, nos destinos da nação. Para eles, só há ‘olhos’ -- olho grande, bem entendido -- para as terras, riquezas e a exploração sem limites de seus empregados, que em seu raso entendimento só tem obrigações, deveres, jamais direitos.

Uma emblemática crônica da saudosa Jornalista Irede Cardoso de maio de 1980, intitulada ‘A insólita dama do Pacaembu’, na Ilustrada, revela com sensibilidade o desprezo dos descendentes dos escravocratas aos direitos trabalhistas mais elementares, como registro em carteira de trabalho, sendo a rua o destino de velhos empregados que criaram os filhos das madames. Mas isso quando o jornalão da Alameda Barão de Limeira 425 ainda seguia o legado do saudoso Jornalista Claudio Abramo e de sua equipe constavam nomes dignos como Ricardo Kotscho, Clóvis Rossi, José Carlos Luppi, Getúlio Bittencourt, J.B. Natali, Perseu Abramo, Osvaldo Peralva, Newton Carlos, Sérgio Augusto, Nei Duclós, Osvaldo Mendes, Rui Lopes, Luiz Alberto Bahia, Fortuna, Plínio Marcos, Tarso de Castro, Nelson Merlin, Irede A. Cardoso, Marta Alencar, Jota, Angeli, Chico Caruso, Paulo Caruso e Ciça, entre muitos outros, igualmente dignos.

Parodiando as palavras do deputado paranaense Zeca Dirceu, dirigidas em 2019 ao então ministro da Economia Paulo Guedes, esses senhores são ‘tigrões’ perante o povo brasileiro e ‘tchutchucas’ ante seus amos e senhores, moradores dos ‘bairros nobres’ de Nova York, Londres, Berlim, Paris, Bruxelas, Roma, Madri, Lisboa, Tóquio, Toronto e Sidney. Se eles têm motivos para se preocupar com o futuro do Brasil? Não, sua preocupação se encontra na parte mais sensível de seu corpo, os bolsos -- isso declarado por eles, sem qualquer constrangimento.

Para eles, o Banco Central do Brasil tem que continuar servindo aos interesses do pessoal da Faria Lima e de seus ‘amigos’, de fora. Porque a ‘mão invisível’ do mercado é bastante exigente, e qualquer coisa que os desagradar, o Presidente Lula e seu governo pagarão muito caro, como a Presidenta Dilma Rousseff pagou. Simples assim. Nada de ‘atrapalhar’ os ‘negócios’ desses senhores, que têm o aval incondicional do FMI, BM, BIRD, BID etc. As políticas de reparação social e de geração de renda do governo de reconstrução nacional são mera maquiagem, um engodo para as camadas populares. O que conta é a sangria das riquezas do País, que têm um destino certo, as instituições financeiras transnacionais.

A rigor, as potências que se reuniram na OTAN têm hoje um nítido comportamento voraz, predador, rasgando a Carta das Nações Unidas e de todos os tratados pós-1945, em que os valores humanistas protegiam as camadas populares e a soberania de todos os Estados Nacionais. Mas depois do chamado Consenso de Washington, quando o neoliberalismo foi tornado hegemônico e as leis trabalhistas passaram a ser criminalizadas, o neocolonialismo é que entrou em voga e mais recentemente deu origem ao neofascismo, reforçando velhos parceiros sionistas, nazistas e congêneres pelo mundo afora. É o que estamos vendo sob nossos olhares perplexos.

O LÍTIO NA BOLÍVIA

Não muito diferente, a polêmica tentativa de golpe contra o governo constitucional do Estado Plurinacional da Bolívia, em que o general Juan José Zúñiga se aventurou com seus colegas de armas, à exceção da Polícia Boliviana, dia 26 de junho, reflete bem o nível dos serviçais do império em decadência, hoje rebatizado de império do caos. As reservas de lítio, gás natural e petróleo na terra que foi o segundo produtor mundial de estanho no século XX, além de ter sido o maior provedor de ouro e prata para a metrópole espanhola nos séculos de colonização e saques insaciáveis.

A despeito das versões controvertidas disseminadas pela mídia corporativa nos dias que se seguiram ao lamentável episódio, a ‘mão invisível’ do mercado teve participação ativa na preparação, e que desde o século XIX faz da Bolívia, como o Paraguai e nações do Caribe, uma fonte de sua insaciável de ganância e saque. Basta irmos aos buscadores da internet e digitarmos Guerra do Pacífico e Guerra do Chaco para sabermos mais sobre esses dois conflitos que tiraram da Bolívia territórios expressivos, isso sem aludirmos à Questão do Acre, época em que a seringa, o cacau e a castanha, abundantes em território boliviano, eram cobiçados pela Grã-Bretanha e as demais potências coloniais do início do século XX.

Com todo o respeito pelas opiniões divergentes, mas chega a ser uma leviandade acusar o Presidente Luis Arce Catacora de ter tentado um autogolpe. A versão foi maldosamente referendada por seus ex-companheiros de partido, que deve ser repudiado, como fez o ex-vice-presidente García Linera, ao propor um processo de pacificação na esquerda da Bolívia, que gerou inclusão social e cidadã às maiorias excluídas. Primeiro, porque quem fez a acusação após o malogrado intento foi o próprio general Zúñiga, quando de sua prisão pela atrapalhada tentativa de golpe, num desesperado ato de atribuir ao titular do cargo cobiçado o seu desvario.

A propósito, o episódio de La Paz, repudiado unanimemente em todo o Planeta, mas alvo de saudações e comemorações maledicentes por seguidores do fascismo, inclusive no País, basta citarmos, entre outros, o ex-sinistro da destruição do Meio Ambiente Ricardo Sales, hoje protegido pela imunidade parlamentar, além da sua colega de bancada Bia Kycis. Há outros que o fizeram de modo mais discreto, mas os mesmos que disseram com leviandade que o Presidente Lula e seu partido, o PT, teriam forjado um autogolpe em 8 de janeiro de 2023 são os que saudaram tanto o golpe de 2016 contra Evo Morales e seu governo como no dia 26 de junho, que entra para a História como um sinal de alerta para os países da América Latina.

Não sejamos inocentes: a OTAN não está conseguindo derrotar a Rússia no conflito que ela mesmo estimulou contra a Ucrânia por meio de seu testa-de-ferro Wolodimir Zelensky, além da aventura genocida de seu 51º Estado, o sionista, em território da Palestina. Tanto em Gaza como no Mar Negro, o império está tão agachado, que seu traseiro sujo já ficou exposto. É questão de acompanhar a mídia independente, e há muitas opções. Nós, que condenamos sincera e peremptoriamente a opção militar em qualquer disputa, seja interna ou internacional, temos que reafirmar nossa nítida e categórica determinação de resistir por La Paz, cujo governo foi o primeiro a romper as relações com os sionistas que ocupam há 76 anos o território milenar palestino.

Rechaçamos com sinceridade e contundência qualquer opção pela via militar na dissuasão de conflitos dentro da América Latina, no chamado Oriente Médio e, enfim, África e os países-membro da ONU. A Carta das Nações Unidas é muito clara nessas questões e um conjunto de resoluções, tratados e acordos específicos ratificaram o respeito à soberania nacional e à autodeterminação dos povos. Não por acaso, enquanto membro do Comitê 29 de Novembro de Solidariedade ao Povo Palestino Jadallah Safa, ao lado da comitiva da Sociedade Árabe-Palestino-Brasileira em Corumbá, tivemos a honra e a satisfação de levar ao Consulado da Bolívia, na pessoa do Licenciado Simons William Blacut Durán, o apoio e a solidariedade incondicional em face do tristemente célebre golpe frustrado do general Zúñiga.

Em respeito à jovem democracia reinante em todos os países da América Latina, cujos povos padeceram da violência praticada por regimes militares obscurantistas inspirados no fascismo de triste memória durante as décadas de 1960, 1970 e 1980, não podemos nos associar à cantilena do autogolpe, pois basta lembrar que seis meses antes do sangrento golpe protagonizado pelo narcogeneral Luis García Meza, em 1980, o oficial aventureiro Natusch Busch fez um ensaio para conhecer o modus operandi das forças populares que fizeram a resistência e o derrotaram em seu intento, revigorado seis meses depois, em que foram assassinados líderes políticos, populares, sindicais e estudantis com o know-how fornecido pelo sanguinário Augusto Pinochet.

Ahmad Schabib Hany

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