Saudades do tempo em que o “Cidadania” era o velho PCB...
Se
há um partido quase centenário cuja história orgulha seus membros é o velho
PCB. No entanto, curiosamente, uma geração de “comunistas” arrependidos decidiu
mudar seu nome, seu ideário, sua linha política e até sua história no
pós-guerra fria. Pior, depois de ter participado da vergonhosa deposição da
primeira chefe de Estado e de governo brasileira, passou a se chamar de
“Cidadania” e hoje, salvas honrosas exceções, seus parlamentares se confundem
com membros das velhas legendas de aluguel que vivem a barganhar seus votos no
parlamento e têm seus deploráveis “minutos de fama” em episódios como o do
deputado estadual paulista que apalpou os seios da aguerrida deputada Isa
Penna, do PSOL.
O gesto de um homem que,
sorrateira e ardilosamente, apalpa os seios de uma mulher já é indignante,
imagine no plenário do parlamento de São Paulo, durante a realização de
trabalhos legislativos, madrugada adentro, sob os holofotes e câmeras da
instituição, a uma colega parlamentar feminista e das hostes oposicionistas à horda
governante...
Mais triste foi ter constatado
que a “musa” do impeachment, digo, do golpe parlamentar e midiático, a obscura
e bizarra deputada Janaína Paschoal (PSL-SP), a despeito de ser mulher, não só
não foi solidária com sua colega de parlamento e de gênero, como fugiu a todo
custo do digno enfrentamento dessa laia de seres anacrônicos que infestam o
atual (des)governo. Além de advogada, Paschoal sempre se disse defensora do
abuso de poder, mas não foi isso que demonstrou na prática, perante as câmeras
de jornalistas.
Falso moralismo às favas,
próprio desses hipócritas que se dizem arautos da moralidade e da ética (dos
outros/as), a atitude humilhante do deputado Fernando Cury, do atual “Cidadania”
(ex-PPS e ex-PCB), escancara o comportamento de hienas ávidas que não resistem
aos impulsos de seus instintos misóginos e patriarcais extemporâneos.
Ao contrário do atual “Cidadania”
e do ex-PPS, saído à luz no pós-guerra fria, quando a direção de “comunistas”
arrependidos decidiu abandonar o nome, a linha política, a ideologia e a
história honrada do velho PCB, fundado em 25 de março de 1922, qualquer relato
sincero da história do Brasil no século XX haverá de citar, inevitavelmente, o
Partido (com letra maiúscula) e suas lutas, ainda que proscrito, pois a maior
parte de sua existência seus membros passaram na clandestinidade, sob intensa
perseguição.
Meu primeiro contato com um
“comunista” não foi por meio da propaganda ideológica deflagrada em plena
guerra fria ou dos cartazes obscurantistas espalhados pela repressão nos anos
de chumbo. Com muita honra, posso dizer que, mesmo que por puro acaso, pude
conhecer ainda criança um perseguido membro de um partido marxista-leninista de
passagem por esta fronteira em fins da década de 1960.
Como meu saudoso Pai não era
delator ou serviçal de qualquer regime, o hospedou e registrou devidamente em
sua modesta hospedaria um dirigente sindical de sobrenome Quechua (um dos povos
originários andinos), creio de Potosí ou La Paz, que permaneceu apenas alguns
dias, tendo retornado ao seu país sob a proteção de organizações sindicais
ligadas à histórica Central Operária Boliviana (COB).
Apesar da discrição dos
adultos, a curiosidade das crianças não deixara passar batido um episódio em
que, pelos motivos que fossem, um hóspede que precisasse de solidariedade para
não ser eliminado pelo regime ditatorial do outro lado da fronteira fosse alvo
de uma atenção especial dos donos da hospedaria.
Do mesmo jeito, houve
jornalistas, intelectuais, estudantes, professores, artistas plásticos etc, não
só da Bolívia, mas de vários países do mundo que passaram pela modesta pensão
de meu honrado Pai, que nos ensinou desde crianças que solidariedade não se
condiciona nem se negocia e que liberdade não é mercadoria.
Não demorou muito para que
experimentássemos em nossa Família o valor da solidariedade, quando, na Guerra
Civil do Líbano (financiada pela Arábia Saudita e apoiada pelos governos dos
Estados Unidos, Israel e boa parte da Europa Ocidental), nada menos que 36
parentes diretos, indefesos e inofensivos, haviam sido imolados por grupos
paramilitares da Falange Libanesa, patrocinados pela Arábia Saudita, Estados
Unidos, Israel e países da Europa Ocidental.
Do mesmo modo como meu Pai
acolheu e tratou com todo o respeito e solidariedade os perseguidos “comunistas”
estrangeiros, em diversos países asiáticos, africanos, europeus e da Oceania os
refugiados libaneses, em sua maioria jovens (inclusive filhos, sobrinhos e
netos dos familiares imolados na bucólica Rasn Hashe em 1976.
Escritores como Jorge Amado,
Graciliano Ramos, Apolônio Carvalho, Adolfo Emydio Cunha, Edgar Carone e
Fernando Morais escreveram, cada qual a seu tempo e sob olhares diversos, sobre
diferentes momentos vividos por diversos membros do velho PCB. Contudo, nem sob
tortura, algum deles revelou algo como laranjal, rachadinha, assédio sexual que
envergonhasse descendentes ou correligionários de outras épocas.
Como certa vez disse o brilhante
advogado Heráclito Fontoura Sobral Pinto, um convicto católico e conservador que
defendeu Luiz Carlos Prestes e Harry Berger em pleno Estado Novo, sob nítida
influência nazifascista, que para defender esses dois comunistas nos anos 1930
precisou recorrer a artigos da legislação de proteção dos animais a fim de
assegurar um mínimo de tratamento humano àqueles presos políticos.
Lamentavelmente, hoje é com o
parlamentar Fernando Cury que o atual “Cidadania” ganha seus inglórios momentos
de popularidade (sic). Esse que é
sucedâneo do glorioso PCB, em que militaram mulheres como a aguerrida Olga Benario,
Companheira de Prestes morta em campo de extermínio nazista depois de dar à luz
a Anita Leocádia Benario Prestes.
Saudades do tempo em que o “Cidadania”
era o velho PCB, cuja história se confunde com a do Brasil e cujo legado honra
a esquerda, que não capitulou ao neoliberalismo e à globalização, pseudônimo de
“imperialismo, a fase superior do capitalismo”. Ou, como diria o querido e
saudoso Amigo Manoel Sebastião da Costa Lima, proprietário da Livraria Guató na
década de 1980 em Campo Grande: “Não me envergonha ser comunista e defender o
PCB. Vergonha é estar ao lado de criminosos por lesa-pátria que entregaram
estatais estratégicas na área de telecomunicações, eletricidade, mineração e
siderurgia ao capital financeiro. E o pior, em nome de uma modernidade que
cheira colonização e escravidão.”
Ahmad Schabib Hany
2 comentários:
No artigo, parece que você esqueceu de mencionar Roberto Freire, aquele que participou do golpe contra a democracia brasileira. Estou falando dele mesmo:daquele que ofendeu Raduan Nassar e hoje vive de braços dados com um outro golpista, o Luciano Huck. Que nome de partido apropriado o Freire preside: CIDADANIA.
Ando deveras de estômago nauseado... e, parece que todos os dias engulo mais agrotóxicos na forma de fatos brasis... hoje lendo sua lavra (como vc diz) parece que estamos com necessidades de colocar os féis prá fora senão morreremos envenenados de brasilis abestados. Sonho, sigo em féis e sonhos, mas fico pensando se rolassem os congressos da CUT... o PCB compunha as mesas. Talvez na atualidade, eu não conseguisse fazer nem o chamado do partido... é um desvalor assustante chamar-se Cidadania.! Ai que saudade do PCB que tanto nos humilhava quando éramos do PT nos anos de 1980 por não sermos tão grandes pensadores e elaboradores de tese... nós ríamos por dentro e seguíamos convidando-os para as mesas de debates e falávamos do barro e eles das projeções do século XXI e a revolução!
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