Fome,
de comida e de poder
O relatório bienal da Organização
das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) constata o retrocesso do
Brasil sob o desgoverno dos ‘patrioteiros’: mais de 21 milhões de brasileiros
passavam fome entre 2022 e 2023, isto é, mais de 5 milhões que no período
anterior (2020 a 2021).
Uma vergonha para o país que é dos maiores
produtores e exportadores de alimentos do mundo.
De um lado, fome de comida: mais de 21 milhões de
brasileiros, como revelou o mais recente relatório da Organização das Nações
unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
Do outro, fome de poder: as elites saudosas do
tempo da casa grande e da senzala, do tempo em que resolviam tudo por suas
leis, sem a existência de direitos individuais, sociais, coletivos,
trabalhistas e difusos (as diferentes gerações, ou dimensões, dos direitos
humanos, consignados de modo didático na Constituição de 1988), e que para se
locupletar em 2016 recorreram a toda sorte de ‘aliados’, por sinal, muito
parecidos: milícias, grileiros, garimpeiros, madeireiros, sonegadores,
contrabandistas, traficantes, quadrilheiros, falsos religiosos (atrás do ‘oro,
oro, oro’) e políticos corruptos de toda estirpe.
Depois de ter saído do mapa da fome em 2008, o
Brasil voltou a registrar mais de dois por cento da população abaixo da linha
da pobreza a partir de 2016, quando os golpistas caem de paraquedas, sob a
batuta do ‘brimo’ Temer, Romero Jucá, Aéreo Never e Eduardo Cunha, e com a
maior cara deslavada desmontam todas as conquistas sociais e econômicas
implantadas a partir da implementação da Constituição Federal de 1988, mais
exatamente nos governos de Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Luiz
Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.
Ninguém precisa morrer de amores por Dilma, Lula,
Fernando Henrique e Itamar, mas é inegável que sua -- de todo(a)s ele(a)s --
formação democrática, forjada na luta contra o regime de 1964, foi determinante
para ir construindo o Estado Democrático de Direito com todas as políticas
sanitárias, socioassistenciais, educacionais, culturais, habitacionais e
econômicas paulatinamente implantadas desde 1993 e até abril de 2016.
Porque com o ‘brimo’ Temer e o inominável (agora
inelegível) tudo isso foi desmontado, num retrocesso nunca antes visto em
qualquer democracia. Antes de 2018 os sinistros de Temer já se empenhavam em
‘flexibilizar’ as políticas de Educação, Saúde, Assistência Social, Cultura,
Habitação, Saneamento e Soberania Nacional, Energética e Tecnológica.
Ao lado de Henrique Meirelles (que com Lula tinha
sido um grande presidente do Banco Central, mas que capitulou perante o
desavergonhado ‘batrício’, da terra-natal de meus saudosos Pai e Avô materno, o
Líbano), do presidente do Banco Central Ilan Goldfajn, do ministro-chefe do
Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República Sérgio
Etchegoyen e do comandante do Exército Eduardo Villas Bôas, além do general da
reserva Augusto Heleno, em nome de um patriotismo do tempo de Sylvio Frota, o
ministro do Exército demitido sumariamente pelo presidente Ernesto Geisel por
atentar contra o processo de redemocratização articulado pelo general Golbery
do Couto e Silva em seu governo.
Foi esse patriotismo exacerbado e nada racional
que levou o inominável açambarcar os destinos de uma população com mais de 200
milhões de habitantes deste país-continente, e deu no que deu: no lugar de
políticas sociais e sanitárias, promoveu a flexibilização da venda de armas e
munições, inclusive de uso restrito das forças de segurança; ao invés de
valorizar a equipe técnica do IBAMA, ICMBio e INPE, desmontou o sistema de
vigilância e controle ambiental que potencializou a ação de organizações
criminosas em todos os biomas existentes no país, sobretudo na Amazônia, no
Pantanal e no Cerrado; em vez de fortalecer o SUS (Saúde), o SUAS (Assistência
Social), o SUSP (Segurança Pública) e a rede de proteção infanto-juvenil,
feminina, das populações em situação de vulnerabilidade social, disseminou o
ódio contra indígenas, afrodescendentes, quilombolas, ribeirinhos, as mulheres,
casais homoafetivos, populações lgbtqia+ e nordestinos.
Sabe aquele adágio popular, de que “vergonha é
roubar e não conseguir carregar”?
Foi o que esses arremedos de ‘democretinos’
fizeram: forjaram factoides por meio da ‘Leva Jeito’ da dupla Marreco (de
Maringá) e Urinol e as famiglias (que se fingem de éticas agora que a máscara
da quadrilha caiu) da meia dúzia de oligopólios midiáticos que sugam as verbas
públicas e desinformam as pessoas de boa-fé. E aí, zap!, a corja de
‘patrioteiros’ fascistas não perdeu tempo e usurpou bem ao seu estilo,
mancomunada aos milicianos, grileiros, madeireiros, garimpeiros, sonegadores,
traficantes, contrabandistas, jagunços, falsos religiosos, falsos patriotas e
falsos democratas, que na calada da noite saem por aí delinquir, prevaricar,
procrastinar, conspurcar, fornicar e ‘otras cositas más’...
Mas por quê? Ele(a)s, afinal, não são ‘patriotas’?
Não são, como se declaram, ‘cristãos’?
É que há diversas formas de serem patriotas,
diversas formas de serem cristãos...
No caso dos fascistas, partem de princípio bem
narcisista, de que só o(a)s ‘capazes’, como ele(a)s, são merecedore(a)s do
bem-estar proporcionado por aquilo que ele(a)s entendem ser um ‘mérito’, uma
‘conquista’. Dessa forma, a fome, a miséria e as vulnerabilidades são
decorrência de sua ‘incapacidade’, ou da ‘fatalidade’, da ‘sorte’, de ‘seres
inferiores’.
Da mesma forma com os plutocratas (com ‘l’, por
favor!). Fazem questão de não conceber que o Estado de Direito seja democrático
e seja provedor dos mínimos sociais, coisa que a Europa e os Estados Unidos
(cuja sociedade é modelo para si) resolveram isso no início do século XX, logo
depois do crash de 1929 da Bolsa de
Valores de Nova York, quando o economista John Maynard Keynes desenvolveu a
política do Estado de bem-estar social para atender às populações desamparadas
decorrentes desse processo propriamente capitalista, a volatilidade do mercado.
Em poucas palavras, pois os fatos falam por si: o
descalabro em que nos encontramos não é fruto do acaso ou da própria
incompetência do ‘brimo’ Temer e do inominável (e agora inelegível). É
resultado da forma como compreendem a administração pública, a gestão do
Estado, na ótica do ‘Estado mínimo’, como Ronald Reagan, o ator canastrão que
depois de ser dedo-duro no macarthismo (foi ele que fez com que Charles Chaplin
fosse expulso para a Inglaterra, acusado de comunista durante a guerra fria)
virou presidente dos Estados Unidos, e a ‘dama de ferro’ Margareth Thatcher,
primeira-ministra da Inglaterra, em fins da década de 1980, decidiram como
seria a ‘globalização’, naquilo em que eles definiram como a doutrina do
Consenso de Washington.
Por trás, obviamente, Jeffrey Sachs (não confundir
com Ignacy Sachs, grande pensador, junto com o longevo e lúcido Noam Chomsky;
Jeffrey é um economista do ‘Chicago boi’s’ que ganhou fama ao formular a
transição do socialismo para o capitalismo na Polônia de Lech Walesa e que
terminou numa crise econômica popular sem precedentes na história), um dos
mestres do ‘posto Ipiranga’ do inominável, Paulo Guedes. Estiveram também no
Chile do ditador sanguinário Augusto Pinochet, na Bolívia claudicante de
Gonzalo Sánchez de Lozada (antes da Guerra da Água, que fez com que
renunciassem, paulatinamente, Gony e Carlos Mesa, levando Evo Morales e depois
Luis Arce e o MAS ao governo) e na Argentina paupérrima de outro ‘brimo’,
Carlos Saúl Menem, de tristes memórias.
Essa é a fome, de comida e de poder, a mesma que
inspirou grandes transformações ao longo da história. No momento em que o
Estadista brasileiro do século XXI promove a volta das políticas públicas ao
encontro de toda a população, a fome é objeto a ser erradicado, como já o foi
há precisos 20 anos. Aliás, em menos de seis meses, 18 milhões de brasileiros
já saíram da linha da pobreza tão logo as políticas públicas nessa área foram
implantadas. Diferentemente dos ‘patrioteiros’, obcecados pelo poder e pela
manutenção de suas benesses, o Brasil se reencontra com a História e a volta ao
Estado Democrático de Direito se consolida de forma efetiva, consistente e
plena.
Ahmad
Schabib Hany
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