REPUBLICAÇÃO EM HOMENAGEM AOS 20 ANOS DE FALECIMENTO
AOS 100 ANOS DO INCANSÁVEL PEREGRINO
MAHOMA HOSSEN SCHABIB (1º/10/1914 – 04/07/1996)
Se estivesse vivo, o Peregrino que a Vida generosamente nos presenteou
como Pai estaria completado 100 anos nesta quarta-feira, dia 1º de outubro de
2014.
Nascido no dia em que eclodira a Primeira Guerra Mundial na bucólica e
formosa Rasen-Hache (província de Batroun), no Líbano, o incansável Peregrino
chamado Mahoma Hossen Schabib ficara órfão de Mãe, dona Maquie Madi, aos 5 anos
de vida. O Pai, Hussein Schabib, não quisera que os sete filhos (quatro meninas
e três meninos) tivessem madrasta. Como caçula, coube às irmãs, bem mais
velhas, cuidar dele. Por influência do primo mais velho, matemático e poeta
Scandar Shalak, alfabetizara-se precocemente, e logo fora para o internato na
distante Damasco (capital da Síria), onde concluíra com destaque os níveis
fundamental e médio.
Ele contava, emocionado, que tivera o privilégio de ver a comoção
popular quando da chegada do corpo do imortal poeta libanês Gibran Khalil
Gibran (autor de “O Profeta”, entre outras obras) a Damasco para as homenagens
póstumas na Síria e Líbano, quando professores participaram como oradores das
celebrações ecumênicas. Igualmente, narrava com indisfarçável indignação sobre
a repressão, pelos gendarmes franceses, ao movimento juvenil sírio contrário à
opressão colonialista em meados da década de 1920, em que milhares de
intelectuais e universitários foram torturados e mortos sem piedade, logo por
aqueles que se diziam agentes da civilização e do progresso ao substituir o
igualmente obscurantista e opressor império turco-otomano, de triste memória.
Obstinado, não sossegara enquanto não transpusesse as fronteiras
políticas da Arábia, dividida à época pelos impérios britânico e francês (Líbano
e Síria, colônias francesas; Palestina e Egito, colônias britânicas). Para
tanto, passou-se por beduíno e atravessou todo o território da Palestina (ainda
livre da ocupação sionista), pela fronteira do sul do Líbano e chegar, por
Gaza, ao Cairo, no Egito, para cursar Filosofia na milenar Universidade
Al-Azhar – fechada em 1954, início do governo de Gamal Abdel Nasser, por causa
de seus arqui-inimigos da Irmandade Islâmica, contrária ao Estado laico
implantado pelo maior estadista árabe dos últimos cinco séculos. Mas ele (meu
Pai) não pôde concluir o curso universitário por causa da eclosão da Segunda
Guerra Mundial: o Egito era colônia da Grã-Bretanha e o ardil colonialista
obrigava os jovens mais instruídos ao alistamento militar – uma acintosa forma
de eliminar a juventude inquieta porque esclarecida, feito bucha de canhão.
Mesmo a contragosto, acabou interrompendo os estudos no final do curso
(1939), aceitando o conselho de seu irmão mais velho, Ale Hossen Schabib (que,
naturalizado boliviano, virou Alejandro Hossen, pois, como em todo país
hispânico, o primeiro sobrenome é o que conta). Esse irmão havia emigrado para
a América no fim da Primeira Guerra Mundial e, depois de incursionar pela
Amazônia brasileira, decidira estabelecer-se na Bolívia, de onde custeava os
estudos do irmão caçula, além de ajudar a família com o que fosse possível
naquele período de miséria e tragédias no Hemisfério Norte. A sua esperança – e
consolo – era que a guerra não levasse muito tempo e que ele não demorasse a
retornar ao Cairo para concluir seus estudos e seguir seu projeto de vida no
Oriente Médio.
OUTRA CULTURA, NOVOS DESAFIOS
Mas não foi bem assim. Para começar, foi uma verdadeira epopeia chegar
até a América do Sul, atravessando dois oceanos num barco de cruzeiro da
companhia italiana de navegação Costa, o “Ana C”. Aportou em Arica, no Chile,
após a travessia do Canal do Panamá com as suas comportas deslumbrantes. Em
seguida, voou literalmente sobre a Cordilheira dos Andes até chegar a La Paz, a
mais de três mil metros de altura, e seguir em outro voo até a capital do
departamento de Beni, Trinidad, na Amazônia boliviana, para finalmente conhecer
o irmão mais velho com quem só se relacionara até então por cartas – afinal,
ele partira quando meu Pai era de colo. Adaptar-se à vida de mascate num país
de cultura totalmente diferente da sua foi outra proeza. Com a ajuda do irmão
que era como Pai, procurou estabelecer-se num povoado menor, Magdalena, para
capitalizar-se e logo ganhar autonomia financeira. Mas as adversidades (entre
elas, o naufrágio de seu batelão carregado de mercadorias) o fizeram
descapitalizar-se e quase lhe custaram a própria vida, em 1940, que ele passara
a grafar como “0000” (quatro zeros), pois os prejuízos o fizeram voltar à
estaca zero.
Perseverante, em cinco anos – praticamente o período da sangrenta guerra
que acabou com a inocência da humanidade –, entre a disciplina nos estudos (não
abandonara o hábito de estudar, nem quando atingiu a terceira idade, lendo
sistematicamente no mínimo quatro horas diárias) e no trabalho, aprendeu a arte
do comércio e dois novos idiomas (espanhol e inglês), e logo era detentor de um
capital monetário respeitável. Por essa razão, o irmão que fazia as vezes de
Pai o aconselhara a ir se preparando para casar-se. Coincidência ou não, nessas
incursões como mascate havia conhecido um dentista muito popular, de
nacionalidade libanesa, o assim chamado doutor José (Yussef) Al Hany, Pai de
dez filhos (seis meninas e quatro meninos) com uma única companheira, a jovem
senhora Guadalupe Ascimani de Hany, afável, culta e hospitaleira.
O doutor Hany, druso (ou derzi, religião espiritualista oriental); a
dona Guadalupe, católica, de Pai maronita (variação libanesa de catolicismo
cujo sacerdote pode se casar). Meu Pai, muçulmano. Como os árabes, a exemplo
dos brasileiros, vivem e celebram a diversidade, não demorou muito para que a
mais velha das filhas, a bela Wadia Hany Ascimani, decorrido algum tempo,
viesse a contrair núpcias com o jovem imigrante. Não é demais dizer que naquela
época, entre os árabes, não era tão acirrada a intolerância religiosa de hoje,
alimentada pelas potências ocidentais dentro da ignóbil lógica do “dividir para
reinar”, iniciada com a imposição do Estado sionista no território da Palestina
em 1948, como perniciosa reparação dos danos causados pelos europeus nazistas
em território europeu, e que nada têm a ver com os árabes, estes também vítimas
dos abusos colonialistas até a presente data.
Casaram-se em abril de 1948 (ironicamente três semanas antes da formalização,
pelas potências mundiais, do Estado de Israel), uma relação conjugal que durou
48 anos e dois meses (meus Pais já planejavam comemorar suas bodas de ouro,
quando uma parada cardíaca interrompeu, em 1996, seus projetos comuns de
Vida). Mas essas quase cinco décadas, como em tudo na Vida, não foram um mar de
rosas, pois tiveram altos e baixos. Os primeiros cinco anos de vida conjugal,
sim, por conta da estabilidade econômica então reinante na Bolívia, foram
tranquilos: minha Mãe aprendeu logo as habilidades comerciais, tendo se tornado
referência nos negócios crescentes da família. Deixaram a Amazônia depois do
nascimento da segunda filha, indo residir na chamada cidade-jardim boliviana,
Cochabamba, localizada num formoso vale da Cordilheira dos Andes e com
excelente qualidade de vida, cultura e cosmopolitismo.
VOLTA ÀS ATIVIDADES INTELECTUAIS
Nesse importante centro cultural boliviano, até por conta da
estabilidade da economia familiar, meu Pai decidiu retomar os estudos na
Bolívia, e não demorou muito para que exercesse com maestria o jornalismo, além
de conduzir um programa radiofônico sobre a cultura árabe e as relações com a
América Latina. (Era um período de efervescência política em todo o mundo: além
da consolidação do socialismo como alternativa real para todos os povos vítimas
do saque e da exploração de suas riquezas naturais e de sua gente, na Bolívia
viviam-se as transformações decorrentes do triunfo da Revolução de 1952
boliviana, e na Arábia espalhavam-se os ideais de Nasser, um dos jovens líderes
da Revolução de 1952 egípcia, que acabou com o jugo pró-inglês do rei Faruk no
Egito e mudou os rumos do povo árabe disperso em 22 Estados divididos pelo
Ocidente e das nações do Terceiro Mundo no século XX, ao fundar, com Broz Tito,
Jawaharlal Nehru e Chu En-Lai, o Movimento dos Países Não Alinhados.) Talvez a
excessiva visibilidade tivesse exposto muito meu Pai diante de adversários
poderosos, até então desconhecidos, que se valeram da crise sociopolítica e
econômica na Bolívia para desencadear contra ele uma série de ações judiciais e
fragilizá-lo comercial e economicamente. Em meio a uma avalanche inflacionária
de mais de nove mil por cento ao ano, no início da década de 1960, meus Pais
decidiram vender todo o seu patrimônio, construído com muito esforço ao longo
de três décadas, a fim de reunir o máximo possível para adquirir as passagens
para dez pessoas (dois adultos e oito crianças) de trem e navio a fim de
retornar ao Líbano, onde nasceu a caçula dos filhos e permanecemos por quase quatro
anos. Nesse meio-tempo, meu Pai cobriu para a Rádio Cairo em espanhol, uma
revista árabe-chilena chamada “Mundo Árabe” e uma edição em espanhol da revista
brasileira “O Cruzeiro” a luta pela independência das nações árabes do norte da
África (Argélia, Líbia e sobretudo o Egito, que passara a se denominar
República Árabe Unida, um Estado confederado com a Síria e o Iraque, mas que
não durou muito por conta das investidas ocidentais e de seus fantoches dos
reinos, emirados e sultanatos árabes, temerosos de que a experiência socialista
de Nasser no Egito irradiasse para os demais países do Oriente Médio).
Como o jornalismo não lhe proporcionara o suficiente para o sustento de
uma família de onze pessoas (nove delas crianças e adolescentes), meu Pai
lançara mão de suas últimas economias para tentar se estabelecer com um
restaurante na segunda maior cidade libanesa, Trípoli (capital da província de
Batroun), em sociedade com um primo que já fora seu sócio na fronteira da
Bolívia com o Brasil (Guajará Mirim, Rondônia), Hussein Khalil Schabib. Entre
as atividades comerciais e a agricultura (nas terras herdadas do Pai), tentou
se recuperar financeiramente, mas decidiu por retornar para a América do Sul,
pois o clima político no Líbano não lhe inspirava bons augúrios. Ele
pressentira, pela insustentabilidade do cotidiano do cidadão comum libanês, a
revolta das camadas populares contra as oligarquias libanesas, fato que eclodiu
em 1974 com a trágica guerra civil que durou duas décadas, dizimou e empobreceu
a população e destruiu a infraestrutura do país após a invasão de tropas
israelenses e americanas, no início da década de 1980, provocando uma série de
massacres nunca antes vistos no Líbano ou qualquer outra nação árabe, à exceção
da Palestina e da Argélia em sua luta pela independência (depois, sim, vimos,
em maior escala, a invasão do Iraque e da Líbia – e agora na Síria – pelos
mesmos gendarmes e mercenários de Israel e Estados Unidos, em pleno século
XXI).
A ESCOLHA DE CORUMBÁ
Nos quase 25 anos que vivera na Bolívia, inúmeras vezes viajara de avião
ou trem pela região do Pantanal, tendo ficado em Corumbá por breves estadas,
sobretudo depois que fixara residência em Cochabamba. Rumo a São Paulo, de onde
comprava muitos itens para abastecer seu comércio atacadista, havia se
encantado com o desenvolvimento desta região, que, depois da inauguração da
ferrovia Corumbá – Santa Cruz de la Sierra, passou a compará-la à região de
Milão pelo tronco ferroviário e a importância desse transporte para a
integração do continente. Por isso, quando se decidiu por retornar para a
América do Sul, sua escolha recaiu sobre Corumbá, de modo que os três filhos
mais velhos (que estavam por chegar à universidade) ficassem na casa da Vovó
Guadalupe e os demais não tão distantes do país que o acolhera na juventude e,
a despeito das adversidades, lhe ensinara muito. Ele era muito grato ao povo
boliviano por tudo que lhe ocorreu na Vida. Obviamente, como todo imigrante,
amava todos os países que o acolheram. E sua relação com o Brasil foi como o
coroar de seus sonhos e lutas, até pelo fato de haver feito a escolha em plena
maturidade. Assim, quando se estabeleceu com um modesto comércio de armarinhos,
à rua Joaquim Murtinho, plena Feira Boliviana (a poucas quadras da estação
ferroviária da Red Oriental da Bolívia, à época separada por uma centena de
metros da ferroviária da Noroeste), semanas antes do golpe militar de 1964,
iniciava uma nova fase em sua renhida existência de Peregrino incansável.
Seis meses mais tarde, início da primavera de 1964, meu Pai deu início a
seu projeto de trabalho (e de Vida) no coração do Pantanal e da América do Sul
(era assim como ele via Corumbá, centro do bioma e do subcontinente): abrir uma
sorveteria (com a solidária assessoria de um Amigo libanês, Fauze Rachid e sua
esposa boliviana Pura Ceballos de Rachid, proprietários da popular Sorveteria
Superbom, e que anos depois se mudaram para Puerto Suárez) e construir uma
hospedaria (pousada) com menos de uma dezena de quartos, que em pouco mais de
cinco anos se transformara em referência para comerciantes bolivianos e jovens
turistas de todo o mundo por causa da higiene, segurança e atenção de seu
proprietário poliglota e bem informado (como recomendavam os guias pioneiros
que descobriram a rota dos Incas e os safáris fotográficos do Pantanal, sem
qualquer incentivo das instâncias de governo federal, estadual e municipal de
todos os países sul-americanos, que viam os mochileiros barbudos como
suspeitos, quer fosse como “subversivos” ou como “maconheiros”), depois de ter
conseguido comprar, com o pouco que lhe restava da venda de seus bens do
Líbano, uma casa modesta de um simpático casal de idosos (o senhor Afonso,
português, e dona Paulina, corumbaense, irmã de uma vizinha que logo ganhou
status de vovó, a dona Ventura, muito cordial e sempre presente nos primeiros
anos da chegada de toda a Família).
Foi com essa modesta pousada que, por quase trinta anos, assegurou o
sustento digno de uma numerosa família de nove filhos, tendo como meta dar-lhes
formação universitária. Quando um amigo bem próximo lhe propôs um empréstimo
para ampliar as instalações da pousada, diante do movimento e do reconhecimento
de seus serviços, ele revelou que não pretendia ser dono de rede de pousadas ou
fazendas, mas pai realizado por ver todos os seus filhos a concluir os seus
estudos, independentemente da profissão escolhida. Obviamente que a perda do
filho mais velho (ocorrida em circunstâncias não elucidadas pela polícia em
1974, que me induziu a declarar, aos 15 anos, que fora por suicídio, fato
questionado por seus colegas universitários e sobretudo por um investigador de
uma seguradora que por coincidência se hospedara dois meses depois da
tragédia), Mohamed (ou carinhosamente “Tchítchi”), o abatera profundamente:
ainda que não abandonara as metas que traçara para sua Vida, com a maior
dignidade e responsabilidade, não era difícil pegá-lo lacrimejando ao ler ou
conversar com jovens que lembrassem o espírito arrojado do saudoso filho.
A propósito dessa tragédia, houve quem propusesse que denunciássemos o
governo do mais sanguinário, corrupto e mercenário dos ditadores bolivianos,
Hugo Banzer Suárez, pela morte de nosso irmão, cuja memória foi criminosamente
vilipendiada pela chefia da polícia local nos tempos nefastos da ditadura.
Lembro-me como hoje que, acompanhado de dois queridos Amigos (Juvenal Ávila de
Oliveira, então radialista, e João de Souza Álvarez, fotógrafo à época da
tragédia), visitamos quase todas as redações de jornais locais que haviam estampado
a manchete sensacionalista do tipo “estudante (sic) universitário se
fuzila sem deixar carta” (coisa típica de crônica policial chapa-branca,
espreme-sai-sangue) a fim de esclarecer os fatos e pedir que republicassem a
matéria dando-nos o direito de mostrar o outro lado dessa notícia. Alguns,
obviamente, nem se deram a esse trabalho. Mas o velho Diário de Corumbá,
então dirigido pelo jornalista Carlos Paulo Pereira Júnior, corrigiu a notícia
com o devido destaque. O Pai dele, fundador do jornal em 1969, jornalista
Carlos Paulo Pereira, tinha uma relação de amizade com o meu Pai, que desde as
primeiras edições colaborava com matérias de política internacional. Por conta
desse gesto, a partir de então meu Pai passou a assinar também matérias de fundo
espiritual, não doutrinário, em que homenageava de alguma forma meu saudoso
Irmão. Talvez o artigo dele que mais tenha repercutido na década de 1970 tenha
sido “De onde viemos, para onde vamos e por quê?”, o qual foi publicado em dois
idiomas em diversos jornais do Brasil e da Bolívia.
A MILÃO SUL-AMERICANA
Ainda na década de 1970, por ocasião do bicentenário da fundação de
Corumbá, publicou outro emblemático artigo, desta vez voltado para as
perspectivas de desenvolvimento da região do Pantanal, quando explicou por que
o turismo, ao lado do comércio, eram a vocação natural de Corumbá – tendo então
comparado a posição estratégica do coração do Pantanal a Milão, na Itália. Essa
matéria foi levada por um turista para publicá-la num jornal espanhol e em outro
italiano. Desde então, quando calhava de se hospedar algum jornalista em sua
pousada, meu Pai fazia questão de entregar alguns artigos de sua autoria,
autorizando-o a publicar como quisesse, ainda que sequer publicasse a autoria.
Ele foi um defensor declarado de que as ideias não têm “dono”, e é um dever
fazê-las circular, em benefício da humanidade.
Mas foi ao lado de outros dois imigrantes como ele – William “Bill”
Sefusatti, o ítalo-britânico dono dos barcos Califórnia, e Hermann Pettersen,
alemão casado com Dona Maria, cuiabana, dono do restaurante El Pacu, ambos
localizados no Casario do Porto – que anonimamente deu sua contribuição para a
consolidação do turismo contemplativo no Pantanal entre os fins da década de
1970 e início da década de 1990, quando alguns guias pioneiros brasileiros
também passaram a integrar a atividade, tais como Clóvis Brandão Carneiro,
Rodrigues, Guilherme Carstens, Armando Duprat, Roberto Kassar, Joaquim, Catu,
Gilberto, José Bobadilha, José Paraguaio, Johnny Índio, entre outros. De forma
bem profissional, ao lado da pioneira La Barca Tours, da família Nader, o
também pioneiro J. Carneiro e seu Expresso do Pantanal consolidaram de forma
sustentável o turismo voltado para as famílias que vinham conhecer o bioma
pantaneiro pelo majestoso Rio Paraguai.
No início da década de 1990, frustrado com a sucessão de equívocos
cometidos pelos gestores do turismo em nível estadual e municipal, que em troca
de favores eleitoreiros, permitiam que os chamados guias piratas prostituíssem
a atividade em Corumbá, iniciou uma série de artigos sobre a importância do
turismo e fazendo explícitas advertências às instâncias administrativas.
Recebia telefonemas de cumprimentos “pela coragem”, mas as sugestões reiteradas
para a organização da atividade na região jamais viu serem implementadas. Tanto
assim, em maio de 1994 encerrou as atividades de sua modesta pousada, depois de
trinta anos de trabalho ininterrupto, em protesto contra a pirataria que então
tomava conta do turismo.
Para não se deprimir, fez sucessivas viagens com a minha Mãe – ao
México, onde mora um de meus irmãos e suas filhas; ao Líbano, onde deixou
praticamente toda a Família, e à Bolívia, onde visitou a Família e amigos
contemporâneos seus, ainda saudáveis – e, quando se preparava para organizar
sua “segunda lua-de-mel”, para comemorar suas bodas de ouro, faleceu
subitamente, ao meio-dia de uma quinta-feira, 4 de julho de 1996, aos 82
anos incompletos.
Minha Mãe, dona Wadia, viveu mais treze anos, tendo resistido
estoicamente a um câncer virulento que a silenciou sem lhe tirar o gosto pela
Vida, em menos de seis meses. Internada num hospital de Campo Grande, ela deu
seu último suspiro no início da manhã de uma segunda-feira, dia 15 de junho de
2009, aos 83 anos de idade. Eles tiveram nove filhos (seis mulheres e três
homens) e um legado de trabalho e muita dignidade, um exemplo para todos nós
que nos orgulhamos de sermos filhos seus.
Um comentário:
Aqui estou, em 2020, lendo seu texto com muita emoção. Obrigada por retratar com tanta precisão e doçura. É inspirador e nos chama ao legado. te amo.
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