Oziel falava em pássaro
“Conversava em Guató, em Português, e em
Pássaro.”
(Manoel de Barros sobre Sombra-Boa)
Pássaro.”
(Manoel de Barros sobre Sombra-Boa)
- E foi assim, disse desolado Adamastor.
Era uma narrativa breve e melancólica.
As crianças escutavam tudo imóveis como as sombras ao meio dia.
Adamastor, com sua fala arrastada, descrevia como as terras dos sem fim se converteram em enormes propriedades rurais, produtivas e modernas.
Os confins se tornaram concentrações de coisas.
Desfez-se o reino da imensidão, da natureza, dos rios, das plantas e dos animais. Tudo se transformou em papel moeda.
As pessoas desaprenderam a falar em guató e em pássaro.
Só o português bastava.
Português é idioma bom para dar ordens.
Ninguém dá ordem em pássaro.
Em guató, as águas se erguem para ouvir. E isso é coisa imprestável na língua dos fazendais orgulhosos de sua estupidez endinheirada!
E o povo foi desaprendendo a falar. Disseram que pássaro e guató eram “línguas mortas” e condenadas ao exílio.
Retiraram os índios de suas terras e os despejaram às margens dos palavrórios de números e estatísticas.
Esta é a verdadeira “língua morta”: a língua surda do poder.
Adamastor era triste destas palavras.
Conhecera um terena que falava em pássaro.
Na Atlântida guató, pantaneira, uma gramática de águas e bichos conspirou contra as cercas do poder. Disseram isso pela canoa.
Oziel escutava tudo em silêncio. Aproximou-se de Adamastor e disse:
- Só fala em pássaro quem é livre!
Autor: Professor Fábio Nogueira (http://professorfabionogueira.wordpress.com/2013/06/02/oziel-falava-em-passaro)
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