Cara leitora / caro leitor,
Macondo -- esclareço às novas gerações, pois as veteranas devem ter ouvido, senão lido, sobre ela -- é a cidade imaginária de Gabriel García Márquez em sua obra-prima, Cien años de soledad, com a qual se tornou celebrado Prêmio Nobel de Literatura em 1968.
Sucupira -- também para as novas gerações -- é a cidade ficcional com a qual Dias Gomes contextualizou uma das maiores obras de sua genialidade como dramaturgo combativo e irreverente, O bem-amado, na televisão e no cinema.
Desculpe-me, leitor/a, mas depois que o "professor Goógre" [assim mesmo, sem qualquer afã de "falar ingrês"!] entrou em nossas vidas não é mais preciso descrever, analisar ou resumir estas obras: cada qual pode, autônoma e livremente, procurar a melhor explicação que lhe aprouver.
Só quero deixar registrada minha admiração, profunda gratidão, pelos geniais autores do gênero literário -- realismo mágico ou surrealismo, como preferir -- que povoou o acanhado imaginário de minha geração e nos permitiu "ousar tentar, ousar vencer", pois nos ensinou a dar "invertidas" diante das adversidades, e aqui estamos. Sem medo de sermos felizes, sem viralatice, sem recalques.
García Márquez revelara certa vez que, quando terminou de escrever a obra genial que o tornou célebre em todo o mundo, morava no México e estava sem dinheiro para pagar, havia nove meses, o aluguel da casa em que ele morava com a Família. E muito menos para as despesas de correio para remeter o manuscrito de setecentas laudas à editora, de Buenos Aires, que publicaria a obra-prima de sua vida.
Precisou enviar os originais em duas partes, porque o dinheiro que trazia no momento, 45 pesos, só dava para enviar a metade do peso do original. Precisou fazer com que sua Companheira vendesse os últimos utensílios de que dispunham: aquecedor, secador de cabelos e o liquidificador.
Os 50 pesos obtidos com a venda desses pertences permitiram que ele enviasse o resto dos originais para a obra ser revista, analisada, editada e impressa por sua editora. De posse dos dois pesos de troco, a Companheira estava indignada ao cabo da façanha: disse ao escritor que só faltava que a obra "fosse má".
A Vida, generosa como o talento do escritor, reconheceu sua genialidade ao ser premiado pelo Nobel de Literatura, um ano depois.
Nosso conterrâneo Dias Gomes vivera até os 76 anos, mas não tivera oportunidade de vir ao coração do Pantanal e da América do Sul para passar uma temporada. Ah, se tivesse, ele teria conquistado para o Brasil um Nobel de Literatura também...
Por quê?
Renato Teixeira, o compositor de "Romaria" ["Sou caipira, Pirapora ..." eternizada na voz da eterna e terna Elis Regina em 1978], revela que o Pantanal lhe abriu os horizontes e fez seu talento amadurecer.
Porque lhe mostrou coisas que jamais teria conhecido sem vir e se impregnar disso tudo. Inclusive da esquisitice dos recalcados daqui, responsáveis pela emulação, procrastinação e atraso, que Teixeira prefere ignorar.
Ora, o que dizer, então, de um gênio como Dias Gomes? Como Campo Grande vive a se afirmar "capital do Pantanal", mesmo que ficasse só por lá, teria dado tempo para incrementar sua usina de imaginação. Em poucas semanas já teria captado a "essência do espírito separatista", que nada tem de pantaneiro.
Esquisitice, sim, mora ali, basta dizer que são os que vivem de emular a alma pantaneira. A querida e saudosa Helô, palestino-pantaneira, dizia isso com propriedade. Como sionistas, que usurpam tudo -- terras, cultura, história, culinária e até a alma palestina --, para ocupar o lugar e a vez deles, a quem negam acintosamente.
Como quem nasceu à beira de um córrego -- seja Prosa ou Segredo -- pode compreender ou conceber os horizontes (e a própria alma generosa) de quem tem um quase oceano, o Rio Paraguai, para se conectar à humanidade, ao firmamento e à essência da alma pantaneira?
Não queiram que a "crônica" do "batrício" não seja aguda. Que seja um afago aos que não se importam com a tragédia dos outros e das outras.
Sobretudo, àqueles que não manifestam qualquer empatia logo com os povos que acolheram generosa e irmãmente os seus ancestrais, uma, duas ou três gerações atrás.
Em vez de estender a mão para retribuir o acolhimento, querem estrangulá-los, do mesmo jeito que os colonizadores de triste memória fizeram com os seus ancestrais cinco ou quatro séculos atrás e seus descendentes continuaram a fazê-lo nos séculos e décadas seguintes.
Nem Macondo, nem Sucupira: é Burácom o que inspira.
Pena que não seja da lavra de um de nossos grandes, fosse García Márquez ou Dias Gomes!
É o que temos...
Ahmad Schabib Hany
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